Marcelo Leite

Jornalista de ciência e ambiente, autor de “Psiconautas - Viagens com a Ciência Psicodélica Brasileira” (ed. Fósforo)

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Marcelo Leite

Marcos Pontes pega carona espacial ao Ministério da Ciência e Tecnologia

Futuro ministro é especialista em lucrar com a fama adquirida em carona espacial paga pelo contribuinte

Faz 12 anos. Ao custo estimado de US$ 10 milhões, o que hoje corresponderia a cerca de R$ 37 milhões, o tenente-coronel aviador Marcos Pontes pegou carona numa nave Soyuz e se tornou o primeiro brasileiro a entrar em órbita.
 
Agora é o país todo que se prepara para ir para o espaço. Se nada mais der errado, Pontes será ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação.

O astronauta Marcos Pontes durante encontro com eleitores de Jair Bolsonaro (PSL) em Taubaté (SP)
O astronauta Marcos Pontes durante encontro com eleitores de Jair Bolsonaro (PSL) em Taubaté (SP) - Bruno Castilho/Futura Press/Folhapress)


Isso se a pasta não for engolida no buraco negro da voragem neoliberal-populista que paira sobre o Planalto. Mais provável parece que a repartição perca o setor de Comunicações que a engolfava, reservado aos militares que vão de fato mandar no governo Bolsonaro.
 
Tudo que cerca a aventura de Pontes parece postiço (para não dizer “fake”).
 
Boa parte da carreira na Aeronáutica ele passou na Nasa, a agência americana para o espaço, treinando para voar num ônibus espacial. Por conveniência político-eleitoral do então presidente Lula (PT), seu voo pago foi antecipado e, ele, embarcado numa geringonça dos tempos da União Soviética.
 
Tendo orbitado uma única vez a bordo de nave russa, mais correto seria designá-lo como cosmonauta, e não astronauta (termo restrito a espaçonautas americanos ou aos que viajam em seus foguetes).
 
Nave russa, Lula, propaganda petista... Seria Pontes um criptocomunista, como se dizia nos tempos da ditadura militar (1964-1985) que Bolsonaro reverencia e hoje oferece como salvação da pátria? Não, o astronauta candidato a ministro pertence à mais pura estirpe capitalista.
 
Basta considerar o que o tenente-coronel da reserva tem realizado nessa dúzia de anos após seu passeio espacial. Uma das faces mais conhecidas do homem de negócios é a que vende os tais travesseiros da Nasa (não pegaria bem a patriotas desabar suas consciências sobre a espuma vermelha de uma Roskosmos).
 
O artefato, embora inútil em órbita sob o efeito de ausência de peso, pode ser encontrado aqui mesmo na Terra, nas lojas Havan, em dez prestações de R$ 6,99. Quem estiver curto de grana por causa da roubalheira do PT pode tentar a versão Basic (10 x R$ 4,99).
 
Na loja virtual Conexão Espacial, estão em oferta modelos de camiseta Marcos Pontes, por R$ 30,00, e blusas polo da Nasa (R$ 95,00). Há também livros do astronauta, bonés, chaveiros, pins, adesivos e até um boneco Marquinhos.
 
A perspicácia empresarial de Pontes vai muito além dos travesseiros e bugigangas. Na Agência Marcos Pontes (“Aventuras para a vida”), as retinas cansadas de memes poderão aliviar-se diante de paisagens nunca vistas em voos num balão estratosférico, numa espaçonave da Virgin Galactic ou num caça Mig-29 russo (opa).
 
Na Marcos Pontes Treinamento Corporativo podem-se contratar palestras do astronauta, assim como participação do militar em eventos e campanhas publicitárias. E há ainda a Fundação Astronauta Marcos Pontes, que organiza o Arraiá Aéreo, “um grande evento com o objetivo nobre de usar ciência e tecnologia para motivar jovens para a educação”.
 
Com a eleição, beiramos a fronteira final da aventura pós-ditadura, aonde nenhum democrata jamais chegou. Esta coluna deseja a todos uma boa aterrissagem no verdadeiro Brasil.

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