Marcelo Leite

Jornalista de ciência e ambiente, autor de “Psiconautas - Viagens com a Ciência Psicodélica Brasileira” (ed. Fósforo)

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Vai pra Suécia, pô

Evidências desdizem tudo que sai da cloaca presidencial sobre a pandemia

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Vida de repórter de política não anda fácil. Xingamentos e ameaças ouvidos há mais de ano nas redes antissociais escalam para concretizar-se em agressões físicas, nas ruas, sob estímulo do presidente Jair Bolsonaro.

Jornalistas de ciência, em contraste, nadam de braçada. Fora uma ou outra exceção entre pesquisadores, não há que lidar todos os dias com canalhas. Quase tudo se resolve com leituras, videochamadas, telefonemas e correio eletrônico.

A frustração, contudo, é a mesma. Nenhum de nós jornalistas está cumprindo seu papel social. Pregamos para convertidos; no mínimo, aumenta a conta-gotas a taxa de arrependimento de eleitores de Bolsonaro que nossas revelações deveriam ocasionar.


Empilham-se os crimes de responsabilidade relatados nos jornais, revistas e TVs. Nada acontece.

Fatos, dados e evidências desdizem tudo que brota da cloaca presidencial em relação à pandemia. Nem por isso cessa o jorro de chorume, sob aplausos e améns de extremistas que já se armam em milícias.

Impera a impotência quando um presidente da República diz asneiras, é pego no pulo e não se vê constrangido a corrigir-se. Um exemplo cabal do despreparo alçado ao Planalto se deu na quinta-feira (14).

Bolsonaro desafiou repórteres, argumentando que havia menos infectados na Argentina porque a população era menor. “É só fazer a conta por milhão de habitantes.” Rosnou em seguida que considerassem o exemplo da Suécia, onde não se decretou distanciamento social.

Naquela altura, o Brasil tinha 66 cadáveres da Covid-19 por milhão de habitantes, e subindo (para não falar das mortes em excesso que revelarão um dia o saldo de óbitos do coronavírus na conta de Bolsonaro, hoje impossível de calcular pelo péssimo serviço prestado por cartórios). Na Argentina eram 8/milhão; na Suécia, 349/milhão.

A TV Folha montou um vídeo mostrando que bastavam uns cliques em página de busca e outros poucos numa calculadora para desmontar a falácia presidencial. Um minion se abespinhou nos comentários alegando que os dados eram de 2018 (errado, claro: as mortes por Covid-19 são de 2020; de 2018 era cifra de população).

Até o titubeante Nelson Teich fez a escolha certa e arrepiou desse governo infame (mas jamais conseguirá apagar a mancha na biografia por entrar na pocilga). Um bolsonarista foi às redes para dizer que ele se fiava demais na ciência, quando não fora nomeado para isso.

Alguma dúvida a respeito? #nãotemcura

Mesmo com três exames negativos de coronavírus em mãos, o presidente se recusou por semanas a divulgá-los. A alma de seu negócio é espalhar confusão. Quanto mais absurdo, melhor, porque só assim manterá acesos o ódio e a adesão cega dos seguidores.

Em paralelo, enche o governo de milicos, como prefere qualificá-los Victor Nussenzweig (e eu também). Um Cavalão apeado do Exército por indisciplina, um capitão que planejava pôr bombas em quartéis agora os arrasta, em marcha batida, para uma batalha suicida contra as instituições.

São óbvios os paralelos com a Venezuela de Nicolás Maduro e Hugo Chávez, que Bolsonaro tanto elogiou. Hamilton Mourão é seu Diosdado Cabello. Maduro e Bolsonaro se irmanam como últimos mandões a professar a salvação pela hidroxicloroquina.

Estamos todos diante de uma escolha, jornalistas e outros defensores do razoável (mais que da Razão) e das evidências (mais que da Verdade ou da Ciência): seguir ajoelhados, cuidando do jardim, ou levantar-se do chão e, mesmo em meio à pandemia, agir para expulsar do Planalto o pior presidente que o Brasil já teve.

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