Marcelo Viana

Diretor-geral do Instituto de Matemática Pura e Aplicada, ganhador do Prêmio Louis D., do Institut de France.

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Marcelo Viana

Brasil sobe da 5ª divisão à elite da pesquisa matemática

País passa a ter mais influência nos rumos internacionais da área

Por decisão da União Matemática Internacional (IMU, na sigla em inglês), a partir de ontem o nosso país integra o grupo das nações mais avançadas na pesquisa matemática: Alemanha, Canadá, China, Estados Unidos, França, Israel, Itália, Japão, Reino Unido, Rússia e agora também o Brasil.

Sucesso de um projeto acalentado há algum tempo pelo Impa e pela Sociedade Brasileira de Matemática (SBM), esta promoção é também o culminar da trajetória única de nosso país no cenário mundial da matemática.

Vista aérea do Impa (Instituto de Matemática Pura e Aplicada), na Floresta da Tijuca, no Rio
Vista aérea do Impa (Instituto de Matemática Pura e Aplicada), na Floresta da Tijuca, no Rio - Leonardo Pessanha/Impa

O Brasil aderiu à IMU em 1954. O começo foi modesto: os países membros da IMU estão organizados em cinco grupos, segundo o grau de desenvolvimento de sua matemática, e o Brasil começou no grupo 1, o menos importante.

Diz muito do despreparo de nossa comunidade na época o fato de que não temos nenhum registro escrito da adesão: não sabemos como aconteceu, nem sequer quem tomou a iniciativa (perguntei aos arquivos da IMU, em Berlim, mas ainda não obtive resposta).

De lá para cá tudo mudou.

Grupos de pesquisa em diferentes temas da matemática foram criados e prosperam em todas as regiões do país, em universidades e institutos que também oferecem programas de pós-graduação mestrado e doutorado de padrão internacional: ninguém mais precisa sair do Brasil para alcançar formação matemática de alto nível.

Esta mudança está evidenciada de modo contundente nos dados sobre a produção científica realizada no país. O número de trabalhos de pesquisa de matemáticos brasileiros dobrou de 2006 para 2016, e quase decuplicou na comparação com 1986. Os números ficam ainda mais impressionantes quando comparamos com os totais mundiais: enquanto que em 2006 produzíamos 1,53% de toda a matemática mundial, em 2016 esse percentual já era 2,35% e com tendência claramente ascendente. Em 1986 éramos apenas 0,7% do mundo.

Outro belo indicador do avanço de nossa matemática é a lista de brasileiros convidados para dar palestra no Congresso Internacional de Matemáticos (ICM, na sigla em inglês), o que constitui grande distinção na carreira de qualquer matemático.

O primeiro convite só ocorreu em 1962, quando o ICM já tinha 65 anos de existência. Em 2018, no ICM do Rio de Janeiro, serão 13 palestrantes brasileiros incluindo quatro mulheres , constituindo a quinta maior delegação do Congresso. Uma façanha notável.

Estes êxitos levaram o país a subir posições na hierarquia da IMU ao longo dos anos. A promoção ao grupo máximo que acaba de ser aprovada também se beneficiou muito da proeminência mundial que o Brasil adquiriu com a medalha Fields concedida em 2014 ao brasileiro Artur Avila e com a realização do ICM no Rio de Janeiro de 1 a 9 de agosto próximo.

O que muda a partir daqui?

O Brasil adquire novo respeito no cenário global da área e passa a ter mais influência nos rumos internacionais da disciplina. Ele se torna ainda mais atraente para que pesquisadores talentosos de todo o mundo venham trabalhar no nosso país e contribuir para o seu desenvolvimento.

Também fica comprovado que o Brasil é capaz de gerar matemáticos do mais alto gabarito e de se dotar com uma comunidade acadêmica de excelência. E que, havendo vontade, temos a capacidade para traduzir essa excelência na pesquisa em melhora na educação e em disseminação do conhecimento matemático em toda a sociedade.

Vamos encarar mais esse desafio?

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