Marcelo Viana

Diretor-geral do Instituto de Matemática Pura e Aplicada, ganhador do Prêmio Louis D., do Institut de France.

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Marcelo Viana

Nossas escolas ensinam matemática do século 19

Atraso do ensino cria descompasso entre a formação dos jovens e o que é necessário para compreender o complexo mundo que nos cerca

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A pandemia forçou uma mudança radical no modo como escolas estão funcionando em todo o mundo e acredito que essa mudança será, em grande medida, irreversível. Não creio que voltaremos a ensinar nenhuma disciplina, particularmente a matemática, do modo tradicional. Aliás, não é desejável que o façamos: com a crise, vêm oportunidades de progresso que urge explorar.

Por outro lado, compreender qual é o papel que as tecnologias virtuais podem e devem ter no ambiente de ensino é um desafio que ainda estamos longe de ter resolvido. A interação humana tem um papel fundamental no processo pedagógico e não é razoável pensar que a presença do professor na sala de aula poderá ser substituída no futuro previsível. No caso da matemática, a questão é particularmente crítica, porque a aprendizagem da disciplina é um processo inerentemente interativo entre a criança e o professor.

Para além da questão do "como", importa também questionar "o quê" vamos ensinar na matemática daqui a 10 ou 20 anos. Para projetar o futuro, é útil analisar o passado.

Professor em frente a uma lousa; em primeiro plano, desfocado, uma câmera
Professor olha para câmera que filma sua aula - John Thys/AFP

No início do século 20, o alemão Felix Klein (1849-1925), excelente matemático que também se interessava de maneira muito concreta pela formação de professores, compreendeu que os currículos escolares da Alemanha e outros países tinham parado de evoluir. Na sua visão, as escolas da época continuavam ensinando a matemática do século 18 ou anterior, ignorando todo o corpo de conhecimento que fora desenvolvido no século seguinte.

Isso levou Klein a lançar uma iniciativa internacional visando trazer para a sala de aula a matemática descoberta ao longo do século 19, além de contribuir para adequar a formação dos docentes aos novos tempos. A revolução que ele iniciou influenciou profundamente diversos países, sobretudo os mais avançados. O Brasil, com um sistema educativo ainda precário, infelizmente, ficou fora desse processo inovador e teve que correr atrás bem mais tarde. Na verdade, continua correndo.

O que Klein disse há mais de 100 anos atrás continua valendo hoje. Nas nossas escolas estamos ensinando, na melhor das hipóteses, matemática do século 19. E isso cria um descompasso entre a formação que damos aos nossos jovens e as reais necessidades para o exercício das profissões do século 21 e para a compreensão do complexo mundo que nos cerca, que é o objetivo maior da matemática.

Continuarei com esse tema em breve.

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