De 3 a 19 de janeiro coordenei um Curso Colaborativo de Saúde Pública em São Paulo, em parceria com a Faculdade de Medicina da USP, a Fundação Getúlio Vargas, e o Escritório no Brasil do Centro de Estudos da América Latina da Universidade de Harvard.
O curso reuniu docentes locais e de Harvard e 36 participantes (18 de Harvard, de várias nacionalidades, e 18 de diversos estados brasileiros). Em sua 16ª edição, esse curso já treinou cerca de 480 pessoas (metade do Brasil e metade de Harvard). A cidade sede se alterna. O curso já foi realizado em São Paulo (com atividades em Sorocaba, Espírito Santo do Pinhal e Diadema), Rio de Janeiro, Salvador (com atividades em Jiquiriçá) e Fortaleza (com atividades em Sobral).
A trajetória profissional e acadêmica dos participantes após o curso inclui doutorados em universidades nacionais e internacionais, intercâmbios no Brasil e no exterior, e projetos de colaboração, dentre outros.
Foi um enorme orgulho ver a Dra. Luciana Servo, aluna deste curso em 2016, ser nomeada presidente do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada).
O que faz deste curso algo especial? O formato.
Na primeira semana há aulas pela manhã —45 minutos de aula, 50 minutos de discussão. Refletimos sobre o SUS (Sistema Único de Saúde), a estratégia de saúde da família, a história da carga e controle de doenças no Brasil, o atual padrão de carga de doenças, e tópicos específicos que abordam desafios de saúde na cidade sede do curso. Este ano focamos em HIV/AIDS, tuberculose, desenvolvimento infantil, Covid-19 e sistema de saúde.
O restante do tempo é dedicado a visitas de campo e ao trabalho colaborativo para solução de problemas. Visitamos a Secretaria de Saúde e a rede do SUS, incluindo Unidade Básica de Saúde, serviço especializado, consultório de rua, Caps (Centro de Atenção Psicossocial), além de outros serviços e projetos sociais e de acolhimento voltados às populações vulneráveis.
O trabalho colaborativo se dá em grupos que abordam os tópicos selecionados. Cada grupo inclui três participantes de Harvard e três do Brasil, que trabalham com gestores, líderes comunitários e profissionais do SUS na busca por soluções para desafios locais.
A parceria entre a academia e o serviço de saúde é transformadora. Os participantes do curso aprendem que a maior qualidade para se trabalhar na saúde pública é saber ouvir (ouvir sem julgar) exercendo empatia e respeito à cultura e ao próximo, deixando de lado "fórmulas" e certezas sobre como resolver problemas. Não se tem a solução sem entender o contexto. E só se entende o contexto ouvindo.
Durante a apresentação dos projetos finais, o poder transformador desse curso colaborativo se ilumina. Participantes de Harvard ressaltam a importância do SUS e seu formato, algo totalmente diferente do que conheciam. Participantes do Brasil, muitas vezes, descobrem uma realidade e história que ignoravam, apesar de serem brasileiros. Os profissionais e a comunidade se sentem valorizados em ter tido um espaço de diálogo sincero e respeitoso. Todos aprendemos lições de vida.
Essa é a essência do curso. A academia, andando de braços dados com o serviço e a comunidade, ensinando e aprendendo, compartilhando experiências, buscando soluções de forma colaborativa, ouvindo, entendendo, sem julgamentos.
Nem todos que estudam saúde pública no Brasil e nos Estados Unidos têm a chance de vivenciar uma experiência como essa. Em um momento em que empatia e senso de coletividade andam em falta na sociedade, é importante repensar como treinamos as futuras gerações.
A academia tem um papel crucial na caminhada de "união e reconstrução". A hora é agora.
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