Marco Aurelio Ruediger

É chefe da Diretoria de Análise de Políticas Públicas da Fundação Getulio Vargas (FGV-DAPP)

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Marco Aurelio Ruediger
Descrição de chapéu Eleições 2018

Quando menos é mais na política

Tempo de televisão terá impacto considerável na eleição de 2018, mas não absoluto

A maioria dos analistas aguarda o impacto político do tempo de mídia tradicional (conforme abordei na coluna da última semana), assimetricamente ajustado pelo centro político em cumplicidade pouco envergonhada com PSDB e PT, seus maiores beneficiados. Às favas, portanto, que numa eleição majoritária houvesse uma partição mais justa do tempo. Como escreveu Lampedusa: há de se mudar, para que tudo fique como está.

Lidamos, no entanto, com expectativas, e elas estão aí gritando, esperançosas, que tudo será diferente por causa da TV, a partir de 31 de agosto.

Porém, há dois problemas. O primeiro, mais grave, é a falta de confiança recorde em instituições e nos operadores políticos no Brasil. O segundo, a aposta de que as redes terão impacto suplantado nesse processo.

Tempo de TV terá impacto considerável nas eleições deste ano, mas não absoluto
Tempo de TV terá impacto considerável nas eleições deste ano, mas não absoluto - Karime Xavier - 26.nov.2014/Folhapress

O Brasil hoje é o terceiro país com maior queda no índice de confiança medido pelo Edelman Trust Barometer. Fica atrás dos Estados Unidos e da Itália, países em que reviravoltas inesperadas nas eleições se deram, nas quais as redes sociais foram vitais. Nos dois casos, segmentos políticos radicalizados e com discursos simples, mas objetivos, somados a lideranças carismáticas, operaram a vocalização de ressentimentos represados. Adicionalmente, pesquisa da FGV DAPP verificou que no Brasil parte dessa desconfiança não é debitável somente às instituições, mas ao descrédito de seus operadores e da conjuntura legada.

Sobre a conjuntura, à frente de outros temas importantes, dois metatemas pulsam em aberto: mercado de trabalho, para o qual tornaram-se descartados contingentes de milhões já socialmente hipossuficientes, e a violência. Todos os candidatos têm sérias dificuldades propositivas com pelo menos um desses metatemas. Natural, portanto, não confiar.

Creio que o tempo de TV terá impacto considerável, tanto quanto as estruturas partidárias, mas não absoluto.

Hoje, segundo pesquisas de diversas fontes, um brasileiro consulta o celular 78 vezes em média por dia, 96% dos internautas acessam a web via celular, 77% dos brasileiros entre 18 e 49 anos usam extensivamente as redes para se informar. Evidente causar impacto.

Fatos midiáticos alimentam e são potencializados e capilarizados pelas redes. O episódio, revelado no fim de semana, sobre a suposta compra de apoios de "influenciadores digitais" no Twitter para candidatos do PT, é prova do revés que uma ação equivocada pode provocar. Não obstante, aponta para as redes como campo sério de disputa.

Falamos, portanto, de vários componentes que se entrelaçam, potencializam-se e se retroalimentam, dependendo de fatores-chave.

As imagens de Geraldo Alckmin (PSDB), esta semana, filmado com chapéu nordestino, ficaram tão fakes que viraram meme nas redes. Manuela D'Ávila (PC do B) praticamente desapareceu das plataformas, dado o constrangimento da chapa tríplex do PT.

Ciro Gomes (PDT) se sai bem com a proposta do SPC, mas ao não a explicar direito, abre o flanco para críticas.

Observando a taxa de engajamento orgânico dos candidatos no mês, e ajustando as dispersões, sobressai um dado interessante. Enquanto Bolsonaro (PSL) segue firme, mas numa curva menos acentuada, Geraldo Alckmin permanece mal colocado. Fernando Haddad (PT) e Ciro crescem, sendo que o primeiro mais significativamente. Ou seja, isso traduz a identificação de campos com engajamentos, propostas e posturas.

Há vezes em que menos é mais, e a maior exposição na televisão, sem confiabilidade, pode gerar efeito contrário, bem como o mau uso das redes. Confiança é chave, não só o tempo, e repercute muito nas redes.

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