A maioria dos analistas aguarda o impacto político do tempo de mídia tradicional (conforme abordei na coluna da última semana), assimetricamente ajustado pelo centro político em cumplicidade pouco envergonhada com PSDB e PT, seus maiores beneficiados. Às favas, portanto, que numa eleição majoritária houvesse uma partição mais justa do tempo. Como escreveu Lampedusa: há de se mudar, para que tudo fique como está.
Lidamos, no entanto, com expectativas, e elas estão aí gritando, esperançosas, que tudo será diferente por causa da TV, a partir de 31 de agosto.
Porém, há dois problemas. O primeiro, mais grave, é a falta de confiança recorde em instituições e nos operadores políticos no Brasil. O segundo, a aposta de que as redes terão impacto suplantado nesse processo.
O Brasil hoje é o terceiro país com maior queda no índice de confiança medido pelo Edelman Trust Barometer. Fica atrás dos Estados Unidos e da Itália, países em que reviravoltas inesperadas nas eleições se deram, nas quais as redes sociais foram vitais. Nos dois casos, segmentos políticos radicalizados e com discursos simples, mas objetivos, somados a lideranças carismáticas, operaram a vocalização de ressentimentos represados. Adicionalmente, pesquisa da FGV DAPP verificou que no Brasil parte dessa desconfiança não é debitável somente às instituições, mas ao descrédito de seus operadores e da conjuntura legada.
Sobre a conjuntura, à frente de outros temas importantes, dois metatemas pulsam em aberto: mercado de trabalho, para o qual tornaram-se descartados contingentes de milhões já socialmente hipossuficientes, e a violência. Todos os candidatos têm sérias dificuldades propositivas com pelo menos um desses metatemas. Natural, portanto, não confiar.
Creio que o tempo de TV terá impacto considerável, tanto quanto as estruturas partidárias, mas não absoluto.
Hoje, segundo pesquisas de diversas fontes, um brasileiro consulta o celular 78 vezes em média por dia, 96% dos internautas acessam a web via celular, 77% dos brasileiros entre 18 e 49 anos usam extensivamente as redes para se informar. Evidente causar impacto.
Fatos midiáticos alimentam e são potencializados e capilarizados pelas redes. O episódio, revelado no fim de semana, sobre a suposta compra de apoios de "influenciadores digitais" no Twitter para candidatos do PT, é prova do revés que uma ação equivocada pode provocar. Não obstante, aponta para as redes como campo sério de disputa.
Falamos, portanto, de vários componentes que se entrelaçam, potencializam-se e se retroalimentam, dependendo de fatores-chave.
As imagens de Geraldo Alckmin (PSDB), esta semana, filmado com chapéu nordestino, ficaram tão fakes que viraram meme nas redes. Manuela D'Ávila (PC do B) praticamente desapareceu das plataformas, dado o constrangimento da chapa tríplex do PT.
Ciro Gomes (PDT) se sai bem com a proposta do SPC, mas ao não a explicar direito, abre o flanco para críticas.
Observando a taxa de engajamento orgânico dos candidatos no mês, e ajustando as dispersões, sobressai um dado interessante. Enquanto Bolsonaro (PSL) segue firme, mas numa curva menos acentuada, Geraldo Alckmin permanece mal colocado. Fernando Haddad (PT) e Ciro crescem, sendo que o primeiro mais significativamente. Ou seja, isso traduz a identificação de campos com engajamentos, propostas e posturas.
Há vezes em que menos é mais, e a maior exposição na televisão, sem confiabilidade, pode gerar efeito contrário, bem como o mau uso das redes. Confiança é chave, não só o tempo, e repercute muito nas redes.
Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.