Marco Aurelio Ruediger

É chefe da Diretoria de Análise de Políticas Públicas da Fundação Getulio Vargas (FGV-DAPP)

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Marco Aurelio Ruediger
Descrição de chapéu Eleições 2018

Redes são o novo normal na política

Novas mídias afetaram e afetarão a política, mesmo após as eleições de 2018

Desde a semana passada, o eixo da discussão política transitou das propostas temáticas dos candidatos para a questão do impacto das fake news nas redes sociais. Era evidente que as redes afetariam fortemente a política e as eleições. Mas, certamente, o volume e a virulência não eram esperados pela maioria, incluindo o próprio TSE. 

As redes têm impacto não somente como meio, mas porque catalisam, e muitas vezes distorcem, em tempo real, elementos significantes como propostas, histórico, comportamento e narrativas. 

O uso eficaz ou ineficaz do composto: meio, conteúdo e mensagem, é que faz diferença na competição política, constituindo um novo paradigma em processos eleitorais e decisórios, para o bem ou para o mal. 
Ambos os campos neste segundo turno usam maciçamente as redes, não apenas para divulgar propostas, mas também para ataque a adversários. Até atores não nacionais operam para desinformar e fragmentar o ambiente político nacional. Nossas análises na FGV DAPP mostram e alertam que, desde 2014, isso é recorrente na política brasileira, e agora muito mais. 

Não há, portanto, razão para espanto com o fato ou contrariedade com as reações. Não faz sentido impugnar um pleito nem ameaçar um tribunal, dado que todos os concorrentes têm, por assim dizer, no que toca o uso das redes, seu lugar no esquema de Dante, ainda que em níveis distintos. 

Rosa Weber, presidente do TSE - AFP


Há, claro, razões de sobra para se indignar e buscar entender melhor o que ocorre. Trata-se, ressalto, de algo não episódico e que precisa de muito mais sofisticação do nosso establishment para entender seus efeitos, evitando que não sejam tão danosos à democracia futuramente. 

Nesse sentido, o TSE desde o final de 2017 vem corretamente se debruçando sobre essa problemática. Para isso, promoveu seminários e debates, tendo ainda composto um conselho permanente em auxilio à sua direção superior.

No entanto, as sugestões mais assertivas que ali foram levadas deveriam ter sido objeto de maior reflexão pelo regulador. Infelizmente, privilegiou-se um entendimento do tipo "laissez-faire, laissez-passer" para as redes sociais. Uma articulação e ação mais incisiva sobre as plataformas não ocorreu, nem se obrigou a transparência em tempo real de uso dos recursos públicos, incluindo as contratações para impulsionar conteúdos e de propaganda virtual. 

Não se articulou uma rede de centros de pesquisa com fins de monitoramento de bots, fake news e desinformação, em apoio ao tribunal. Por fim, a legislação nesse tocante permaneceu insuficiente. Deu no que deu.

Por outro lado, não se pode culpabilizar somente o TSE. Na questão do debate virtual, outros falharam. Centros de pesquisa deveriam ter buscado melhor articulação. Os partidos políticos, a exemplo da França, poderiam ter monitorado o ambiente virtual também. Equivocaram-se e contrataram ao marketing essa responsabilidade. Erraram feio ao não entender do que se trata esse novo fato. 


A cinco dias do Brasil decidir seus próximos quatro anos --talvez mais do que isso-- com prováveis e profundas mudanças na estrutura política e nas políticas publicas dela decorrentes, percebe-se que o país tem muito para amadurecer nesse tocante. 

De imediato, duas reflexões se impõem. A primeira, de que vivemos um novo normal; as redes afetaram e afetarão a política profundamente, mesmo após as eleições. A segunda, que há de se buscar o monitoramento constante de redes, tanto pela sociedade quanto pelo mercado e pela estrutura estatal, que deveriam incorporar em sua dinâmica decisória e de gestão a compreensão estratégica do impacto desses novos meios. Inescapável.

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