Marcos Sawaya Jank

É professor sênior de agronegócio global do Insper e titular da Cátedra Luiz de Queiroz da Esalq-USP em 2019.

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A epidemia chinesa de peste suína e o Brasil

Essa terrível epidemia vai gerar oportunidades de comércio e cooperação para o Brasil

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Família e fortuna são valores fundamentais da cultura chinesa. Na história milenar do país, um dos símbolos desses valores é o porco. O ideograma chinês para a palavra “lar” é um suíno embaixo de um teto, simbolizando que família, prosperidade e suínos vivem juntos, simbioticamente.

Estamos no ano zodiacal do porco na China. O país responde por metade da produção mundial de carne suína, ao consumir incríveis 54 milhões de toneladas.

Porém, desde agosto a China enfrenta uma terrível epidemia de peste suína africana, que já dizimou 17% do seu plantel de quase 700 milhões de cabeças, chegando a 20% no abate de matrizes. A epidemia avança no Vietnã e começa a chegar a outros países do sudeste da Ásia.

Desinfecção de veículos perto de fazenda na China em que foi detectado foco de peste suína africana
Desinfecção de veículos perto de fazenda na China em que foi detectado foco de peste suína africana - 9.mar.19/Reuters

Trata-se da doença suína mais temida no planeta, cuja contaminação se espalha por meio do trânsito de animais vivos (incluindo porcos selvagens), pessoas, carnes, rações e subprodutos da indústria. Não há risco para seres humanos, mas o vírus é letal e incurável no rebanho suíno.

Estima-se que a oferta doméstica chinesa deva cair 8,5 milhões de toneladas em 2019 (15% da produção), o equivalente ao volume mundial das exportações e a mais do que o dobro da produção total brasileira. No cenário alarmista do Rabobank, a produção chinesa pode cair de 25% a 35% até 2020.

Certamente veremos uma alta dos preços chineses no segundo semestre e em 2020, não apenas na carne suína mas também em aves, bovinos e pescados.

Essa alta só não aconteceu ainda porque os produtores estão abatendo seus rebanhos, com medo de serem atingidos pela doença. E ainda porque as empresas estatais chinesas saíram “varrendo” a América do Sul, a Oceania e a Europa para formar estoques estratégicos e evitar o desabastecimento.

A crise atingiu principalmente o rebanho suíno de “fundo de quintal” das pequenas propriedades (20% do total), segmento que tende a desaparecer em razão dos recorrentes problemas de controle sanitário e, agora, da falta de crédito que impedirá que pequenas e médias renovem o seu plantel. Mas ela já atinge também as grandes propriedades verticalizadas, que respondem por 60% da oferta chinesa.

África e Rússia também foram vítimas da peste suína na última década. A situação no Leste Europeu e na Bélgica é dramática. Portanto, a solução para a crise chinesa nas três proteínas está nas Américas, principalmente nos EUA e no Mercosul.

O Brasil é o país com maior potencial de expansão sustentável da oferta, graças aos excedentes de soja e milho. Para tanto, é preciso entender o contexto como um todo e jogar direito nesse tabuleiro. 

Precisamos mapear e acompanhar o que está acontecendo no campo, conversar com os envolvidos e analisar os impactos da crise na oferta, demanda e preços de principais commodities envolvidas na equação —soja, milho, rações, suínos, aves, bovinos, pescados, etc. 

É hora de fortalecer a parceria Brasil-China nas áreas técnica e comercial, apoiando nosso maior cliente e investidor neste momento difícil.

Além disso, é imprescindível reforçar os controles de fronteira, de forma a impedir a entrada desse terrível vírus no Brasil.

O Brasil vinha perdendo mercado em todas as carnes nos últimos anos e ainda corria o risco de ser impactado pelo acordo EUA-China, que sairá nas próximas semanas. Mas de repente essa crise pode virar o jogo em nosso favor, a exemplo do que aconteceu há alguns anos com a epidemia de gripe aviária, que poupou o Brasil.

Um momento crucial dessa partida será jogado em maio, quando a ministra Tereza Cristina e o vice-presidente Hamilton Mourão estarão em Pequim.

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