Marcos Lisboa

Economista, ex-presidente do Insper e ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda (2003-2005, governo Lula)

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Marcos Lisboa
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Não é por aí

Cumprir a emenda do teto e a regra de ouro poderão ser os menores dos problemas

Alguns economistas têm manifestado preocupação com as implicações da emenda do teto na ausência de reformas como a da Previdência. Outros alertam para o risco de descumprimento da regra de ouro. Ambos os receios parecem exagerados.

Caso o país não consiga avançar nas reformas, certamente teremos muitos problemas. Mas cumprir a emenda do teto e a regra de ouro serão os menores deles.

O teto limita o crescimento do gasto público à inflação do período anterior. O problema é que os gastos com assistência e Previdência Social aumentam todo ano pelo envelhecimento da população, o que resulta no rápido crescimento dos benefícios concedidos.

Assistência e Previdência, entretanto, já representam 60% do gasto corrente. Por essa razão, na ausência de reformas para moderar o crescimento desses benefícios, uma das consequências poderia ser a necessidade de comprimir demasiadamente os demais gastos, como apontou recentemente o TCU, levando à paralisação de atividades essenciais de custeio e de investimento nos próximos anos.

A regra de ouro estabelecida na Constituição impede que o governo se endivide para pagar gastos correntes. Nos últimos tempos, esses gastos têm sido maiores do que as receitas correntes e a regra tem sido atendida por meio de expedientes como a venda de ativos ou o pagamento da dívida do BNDES com o Tesouro.

Esses expedientes, entretanto, estão se esgotando, o que significa que, em condições normais, já no ano que vem o país não cumpriria a regra.

As reformas teriam como objetivo combinar redução do crescimento do gasto com aumento da arrecadação para garantir que a dívida pública não saia de controle. Por tabela, permitiriam cumprir tanto a emenda do teto quanto a regra de ouro.

Existe outro caminho, porém nada atraente. Caso as reformas não sejam realizadas, o resultado será a piora da trajetória do desequilíbrio fiscal e, portanto, das perspectivas da economia. As últimas semanas ilustram as consequências.

O câmbio se desvaloriza e a inflação aumenta. Como o Banco Central possui reservas em dólar, cerca de US$ 380 bilhões, isso resulta em um lucro contábil que deve ser transferido ao Tesouro, facilitando cumprir a regra de ouro (existe proposta no Congresso para alterar esse mecanismo). A inflação crescente melhora as contas públicas e reduz os gastos reais, o que também facilita cumprir a emenda do teto.

Caso não retomemos a agenda de reformas, teremos a volta da recessão com inflação e muitos outros problemas, bem maiores do que cumprir a emenda do teto e a regra de ouro. Discutimos demasiadamente temas que se tornarão pouco relevantes, para o bem ou para o mal.

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