Marcos Lisboa

Economista, ex-presidente do Insper e ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda (2003-2005, governo Lula)

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Marcos Lisboa

Dualidade brasileira

Efeitos da pandemia podem agravar as nossas desigualdades

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Os dados da economia andam a surpreender em muitos países. A produção sofreu menos durante a segunda onda da pandemia do que na primeira. Além das imensas políticas de estímulo, aparentemente o setor privado aprendeu a lidar com o distanciamento social. O resultado tem sido uma forte recuperação da atividade e do comércio exterior.

A tragédia, indicam os dados, teve um surpreendente efeito colateral: o aumento de produtividade decorrente de um experimento natural em que firmas e trabalhadores foram forçados a utilizar e a aperfeiçoar tecnologias de comunicação.

Algumas das evidências estão sistematizadas em um trabalho de Jose Maria Barrero, Nicholas Bloom e Steven J. Davis. A partir de maio de 2020, eles realizaram pesquisas mensais com americanos em idade de trabalhar, coletando cerca de 30 mil respostas.

A maioria reporta que a experiência remota foi melhor do que o esperado. O estudo estima um ganho de 4,6% na produtividade após a pandemia, principalmente em razão da redução do tempo de deslocamento. Isso, no entanto, não é capturado pelos indicadores usuais, que, mesmo assim, devem registrar um aumento de 1%.

A parcela de novas patentes nos EUA para melhorar o trabalho em casa mais do que dobrou entre janeiro e setembro de 2020. O setor de saúde desenvolveu técnicas de consultas a distância.

Pelos resultados, o trabalho em casa no futuro será quatro vezes maior do que antes da pandemia. Na média, as pessoas aceitariam uma queda de 7% no salário para ter essa opção dois ou três dias por semana.

Apenas 28% afirmam que retornarão integralmente à vida presencial após a pandemia. Os demais relatam receio de elevadores cheios, metrô ou restaurantes fechados. A se confirmar a tendência, deve cair a demanda por serviços nos grandes centros urbanos com impacto no mercado de trabalho.

O trabalho remoto beneficia desproporcionalmente as pessoas com maior educação e renda em comparação com a base da pirâmide. O resultado pode ser um aumento da desigualdade.

Esses dados são preocupantes para o Brasil. Grandes empresas e trabalhadores formais aprendem a conviver com uma vida mais remota e mostram boa recuperação. Os menos educados e informais, no entanto, aparecem nas estatísticas de desemprego e desalento.

Para piorar, estudos estimam o prejuízo que as escolas fechadas causam na nova geração. O aprendizado de português e matemática no ensino médio estadual pode ter retrocedido ao nível de mais de uma década atrás.

A pandemia pode agravar a dualidade brasileira, consequência da nossa dificuldade em garantir igualdade de oportunidades e cuidar da saúde pública.

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