Sistemas políticos têm um dilema entre governabilidade e representatividade.
Quando as regras eleitorais e de processo decisório favorecem o acesso de grande número de partidos ao Congresso, diferentes interesses passam a ter representatividade política. O custo dessa pluralidade representativa é a maior dificuldade do Executivo para formar maioria parlamentar estável e aprovar seus projetos.
De forma simétrica, sistemas eleitorais que induzem a existência de poucos partidos facilitam a formação de maiorias e a aprovação de leis e reformas de iniciativa do Executivo, mas diminuem o espaço de representatividade dos diferentes interesses.
O sistema brasileiro está no extremo disfuncional da representatividade, com quase 30 partidos no Congresso. Isso decorre da facilidade para criar partidos, da inexistência de cláusula de barreira e da possibilidade (que existia até a eleição passada) de coligação em eleições proporcionais.
A excessiva fragmentação partidária facilita o trâmite de propostas de proteção a setores econômicos ou benefícios a grupos específicos, aumentando gastos e deteriorando a regulação econômica.
Para equilibrar essa super-representatividade no âmbito do Legislativo, foram dados alguns instrumentos ao Executivo: o veto presidencial a leis aprovadas no Congresso e as medidas provisórias.
Como em toda democracia, também há a possibilidade de formar maioria parlamentar, compartilhando o poder com partidos aliados, apesar da dificuldade inerente a administrar coalizões com uma dezena de legendas.
Além disso, a possibilidade de contingenciar o Orçamento evitou a perda total de controle fiscal. E o controle do pagamento de emendas parlamentares passou a ser instrumento adicional de formação de maiorias.
Nos últimos anos, essas ferramentas estão perdendo força. O Congresso tornou o Orçamento impositivo. As emendas parlamentares passaram a ser de execução obrigatória. O uso abusivo das MPs levou Justiça e Congresso a impor limites ao seu uso. O Congresso tem derrubado vetos presidenciais com frequência. A crescente constitucionalização dos temas também reduziu o poder de veto, pois PEC não é sujeita a veto.
Ademais, o governo atual, confundindo governo de coalizão com corrupção, rejeitou o método de partilha de poder usado em todas as democracias desenvolvidas, nada colocando no lugar.
Por isso, a capacidade do Executivo para formar maioria no Congresso ficou reduzida.
Por enquanto, não se percebe o efeito porque, dada a crise econômica, há um senso de urgência que facilita o ajuste da economia. Os partidos de esquerda estão fragilizados, o que tira força de um dos polos ativos de pressão por pautas corporativas e resistência a reformas. Há alguma concordância, entre a equipe econômica e as lideranças do Congresso, acerca dos problemas a serem resolvidos. Os presidentes da Câmara e Senado têm usando seus poderes regimentais para pautar uma agenda positiva.
No futuro próximo, a complacência em relação à necessidade de reformas, ou a ascensão de lideranças parlamentares menos alinhadas a essa pauta, pode levar à predominância de projetos nocivos à estabilidade da economia. E o Executivo não terá instrumentos para mitigar o estrago.
A esperança é que as regras aprovadas pela emenda constitucional 97, de restrição a coligações, podem reduzir bastante o número de partidos na próxima legislatura. Ficaria mais fácil, para o governo eleito ou reeleito em 2022, montar uma coalizão majoritária com poucos partidos e recolocar as reformas nos trilhos.
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