Marcus André Melo

Professor da Universidade Federal de Pernambuco e ex-professor visitante do MIT e da Universidade Yale (EUA).

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Marcus André Melo

Campanha perpétua

Palanque permanente e moedas de troca são substitutos, não complementos

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Por que alguns presidentes não saem do palanque e permanecem em “campanha perpétua”? Esta questão tem atraído o interesse dos analistas do governo Bolsonaro, mas há um rico debate na ciência política sobre Trump, no poder há dois anos sem sair  do palanque (ou do Twitter!).

Há dois argumentos rivais nesse debate. O primeiro é que a campanha permanente reflete a crescente mudança de valores, cujo subproduto é a polarização política, que as novas mídias magnificam. O segundo é que ela decorre de fatores institucionais, e não de mudança de valores.

A polarização seria epifenômeno: ocorreria apenas nos partidos, não no eleitorado, que continua moderado, em que pese o forte alargamento da distância ideológica interpartido. Os partidos tornam-se mais polarizados porque seus simpatizantes moderados abandonam-nos.

Em “Insecure Majorities: Congress and the Perpetual Campaign” ("Maiorias Inseguras: o Congresso e a Campanha Perpétua", University of Chicago Press, 2016), Francis Lee argumenta que a campanha perpétua é produto do desaparecimento de maiorias estáveis —os democratas controlaram a Câmara dos Representantes por 40 anos, entre 1955 e 1995, e a Presidência por 30. 

A incerteza resultante leva os agentes políticos a mobilizar temas controversos que podem trazer vantagens eleitorais na margem.

Em relação à presidência Bolsonaro, a questão se coloca nas pautas comportamental —onde concentra-se a “campanha perpétua”— e econômica. Bolsonaro manterá um pé em cada canoa? Há dois fatores em jogo.

O primeiro diz respeito à dimensão em que o jogo é disputado. Bolsonaro mobilizou com êxito questões identitárias em uma disputa que, no passado, tinha as questões redistributivas como eixo. Assim, acompanhou um movimento similar deflagrado  pelo PT em resposta à Lava Jato e à recessão.

Há similaridades e contrastes com Trump. Lá, os democratas se aprisionaram em disputas identitárias, e Trump mobilizou “perdedores da globalização”, tema com forte apelo redistributivo, o que não ocorreu aqui. Ele mantém a militância devido à disputa acirrada e por estar cada vez mais acuado.

O segundo fator é, como nos EUA, de ordem institucional. 

Ao rejeitar as práticas de distribuir gabinetes partidariamente e adotar a bandeira da anticorrupção, Bolsonaro reduziu os instrumentos de que dispõe para construir maiorias; a mobilização identitária pode compensar essas perdas. Pautas comportamentais e moedas de troca, como cargos e pastas ministeriais, são substitutos, não complementos.

Tudo conspira para que a campanha seja perpétua.

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