Marcus André Melo

Professor da Universidade Federal de Pernambuco e ex-professor visitante do MIT e da Universidade Yale (EUA).

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Marcus André Melo

A bandeira anticorrupção

Denúncia federal de corrupção nos níveis subnacionais não tem mais credibilidade, e só um outsider poderá brandir esse estandarte nas eleições

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A corrupção é entendida equivocadamente no debate público como uma área temática como outra qualquer, saúde, segurança pública ou educação. Assume-se que sua importância como bandeira eleitoral estaria sujeita às vicissitudes do eleitorado e capacidade de mobilização em torno do tema. Mas há algo permanente em relação à corrupção: trata-se de um tema mobilizado pela oposição, contra o incumbente.

Como mostrou Shefter, em trabalho clássico, no próprio processo histórico de formação dos partidos, a bandeira contra a corrupção e a patronagem se converteu no mecanismo crucial dos grupos que estavam “fora” do aparelho de estado no momento em que os partidos foram criados. Os grupos que estavam “dentro” mobilizaram o eleitorado e forjaram lealdades com a oferta de bens privados, como cargos públicos e contratos governamentais. Quem está fora do estado mobiliza o eleitorado com base em bens públicos, de apelo universalista.

Em princípio, quem não tem a caneta para contratar e nomear não pode ser acusado de corrupção. Há, porém, uma dimensão temporal que não pode ser esquecida: a alternância de poder nubla esta dinâmica; quanto mais tempo um incumbente passa no cargo, maiores os incentivos para a mobilização do tema da corrupção. Partidos ou grupos recém alçados ao poder ainda podem mobilizar o eleitorado contra governos que perderam a eleição, mas os retornos diminuem rapidamente. É certo que grandes escândalos de corrupção onde sua exposição assume proporções ciclópicas obviamente têm resiliência e não evanescem da memória coletiva.

A corrupção se tornou uma das clivagens fundamentais da disputa eleitoral em 2018 e foi elemento vertebrador da polarização e rejeição ao PT no pleito. Mas o tema não se confunde com polarização política: é uma dimensão ortogonal à ideologia.

O presidente perdeu celeremente a bandeira do combate à corrupção, mas quem a mobilizará? Moro deixou o governo levando consigo importante o eleitorado que apoiava a Lava Jato; Bolsonaro abraçou a velha política aliando-se com o Centrão no combate à Lava Jato, no que contou com o apoio sinistro dos antigos adversários; e enfrenta escândalo no clã presidencial, que foi o deflagrador dos eventos críticos anteriores.

Denúncia federal de corrupção nos níveis subnacionais não tem mais credibilidade. Denúncias contra a corrupção federal por atores que a protagonizaram recentemente, idem. Apenas um outsider poderá brandir aquela bandeira novamente. Mas provavelmente a centralidade do tema terá arrefecido pelo senso de urgência da crise. Mas, sim, poderá ter um efeito multiplicador sobre a crise econômica e social que poderá se instalar.

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