Maria Hermínia Tavares

Professora titular aposentada de ciência política da USP e pesquisadora do Cebrap.

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Maria Hermínia Tavares

Para além do Bolsa Família

Debate sobre o que substituirá o auxílio emergencial não pode se limitar ao destino do Bolsa Família

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Impiedosa lente de aumento, a pandemia escancarou, agravada, a tragédia social do país. Segundo o Centro de Políticas Sociais da FGV (Fundação Getúlio Vargas), a atual renda média dos brasileiros caiu 9,4% a contar do final de 2019 —quando era já significativamente menor do que em 2014. Claro que nem todos perderam por igual: o tombo na metade mais pobre da população bateu em 21,5%, o triplo do que no décimo mais rico. Com isso, disparou o desnível de renda medido pelo índice de Gini --que varia de 0 (igualdade absoluta) a 1 (total desigualdade).

Estatísticas são uma forma fria de tratar do desastre humano revelado na feiúra das nossas cidades e na degradação de suas áreas centrais onde circula e vive —em número crescente— o povo da base da escada. O horror embrutece a todos: os que ele engolfa e os que dele podem se proteger ou até se beneficiar. Sem falar que a catástrofe torna irremediavelmente frágeis os alicerces sociais da democracia.

Eis por que o debate sobre o que substituirá o auxílio emergencial criado pelo Congresso não pode se limitar ao destino do Bolsa Família --além de mudar o seu nome, como quer o governo--, dadas as inescapáveis restrições fiscais. O porte do problema requer definição mais ampla do modelo de proteção social desejável: ou seja, as condições mínimas de existência que se quer garantir a todos os que aqui habitam, bem como os programas e as fontes estáveis de recursos que o materializem.

No Brasil, além da vexaminosa pobreza, é demasiado grande o contingente daqueles que, por estarem já com a água pelo pescoço, podem nela submergir de vez ao menor solavanco da economia. Nessa situação-limite, programas de transferência de renda serão sempre uma base extensa e indispensável de qualquer sistema de proteção social que valha o nome. Seu tamanho não pode flutuar ao sabor das restrições fiscais: exige fontes definidas de financiamento, portas de saída e ainda flexibilidade para crescer quando as crises ou as mutações do mercado de trabalho tirarem das pessoas os meios de subsistir com o seu labor.

Está em curso um importante debate sobre diferentes modelos de programas de transferência de renda. Dele participam defensores da renda mínima universal, bem assim adeptos de engenhosa combinação de transferências focalizadas com seguro. Esses modelos inevitavelmente alimentarão as agendas das oposições. Sua força será tanto maior quanto mais seu enfoque estiver à altura de enfrentar o megadesafio de imaginá-los como base mínima de políticas capazes engendrar uma sociedade algo menos indecente do que a de hoje.

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