Mariana Lajolo

Foi repórter e editora-adjunta de "Esporte". Cobriu a Olimpíada de Pequim-2008 e de Londres-2012, os Jogos Pan-Americanos do Rio-2007 e Guadalajara-2011.

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O país que sonha ser potência olímpica se alimenta dos heróis improváveis

Na reta final da Olimpíada, o Brasil ganhou um herói improvável. Maicon Siqueira, aos 18 anos, trabalhava como pedreiro e garçom para ajudar nas contas da família. Aos 23, tornou-se medalhista olímpico no taekwondo.

Uma olhada rápida em nossa lista de medalhistas nos Jogos do Rio, no entanto, mostra que sua trajetória não é exceção.

Rafaela Silva, a menina encrenqueira da Cidade de Deus superou as adversidades e o preconceito para se tornar a primeira campeã do Brasil na Olimpíada em casa. Negra, favelada e mulher, a cara do país, a cara daqueles que, em geral, são apartados do esporte. Foi medalha de ouro no judô.

Robson Conceição, o garoto baiano que procurou o esporte para brigar melhor na rua. Se não tivesse calçado as luvas, provavelmente jamais teríamos ouvido falar da breve história de vida que iria protagonizar. Ganhou o ouro no boxe.

O jovem Isaquias Queiroz que brincava no rio que corta a pequena e pobre cidade baiana de Ubaitaba. Que encontrou na canoa a chance de remar para um novo destino. É o único brasileiro com três pódios em uma só edição dos Jogos.

São histórias lindas, exceção na sociedade.

O país que sonha ser potência olímpica ainda se alimenta desses heróis improváveis. Não são exceção.

Mas para crescer como potência, para transformar o esporte de fato em algo de impacto na sociedade, é preciso trabalhar para mudar essa realidade.

A Grã-Bretanha se tornou, no Rio, o primeiro país a melhorar seu desempenho na Olimpíada seguinte à que recebeu em casa. Feito gigantesco, atingido com metade do investimento que o Brasil fez para tentar chegar ao top 10 neste ciclo.

Como? Uma das explicações está nas condições de vida. Os atletas, em sua maioria, não precisam se preocupar se terão onde treinar, se os pais conseguirão comprar carne no fim do mês, se receberão um tiro enquanto vão para escola à noite.

A discussão por lá é se vale a pena investir tanto dinheiro para ganhar medalhas se a maioria da população flerta com o sedentarismo e os novos ídolos não incentivam as crianças a largarem o tablet e o celular para irem praticar esporte.

É um outro nível de debate, que o Brasil deveria começar a fazer, mas não faz. Exibir medalhas é mais fácil e dá mais ibope do que discutir essa estrutura. E para muitos, dá mais dinheiro.

A delegação brasileira não atingiu a meta de medalhas. Ganhar apenas duas a mais do que Londres é um resultado ruim. Mas mesmo que o cenário fosse de festa e o Brasil aparecesse entre os dez melhores do mundo ainda haveria muito o que transformar.

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