Mariliz Pereira Jorge

Jornalista e roteirista de TV.

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Mariliz Pereira Jorge

O que os moradores da favela acham da intervenção?

Ser a favor ou contra aqui do alto dos prédios da Zona Sul não interessa

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Rio de Janeiro

Alguém perguntou aos moradores das favelas do Rio o que eles pensam sobre a intervenção federal?

Gostaria de saber o que eles pensam, ver uma pesquisa abrangente, que fizesse um raio-X no sentimento das pessoas que serão as mais afetadas com a medida. Não teremos isso, a não ser impressões isoladas, depoimentos colhidos em reportagens ou relatos individuais que não representam o todo. 

Ser a favor ou contra aqui do alto dos prédios da Zona Sul, onde estamos a uma distância um tanto segura de onde o circo vai pegar fogo, não interessa. É impossível que qualquer pessoa que não viva a realidade das favelas tenha tantas certezas (positivas ou negativas) sobre a decisão do governo sem vestir alguma carapuça ideológica. 

Muita gente vai faturar politicamente com o assunto, mas não apenas o presidente “vampirão”, se a medida der resultados, o que duvido muito. A oposição, que deveria estar apenas celebrando que a reforma da previdência não mais será votada, acusa o governo de manobra política por usar a intervenção como bandeira para uma possível reeleição.

Deixa ver se eu entendi: a oposição está com medo de que a operação dê certo e que isso seja usado como plataforma de campanha? Então, quer dizer que a presença das Forças Armadas pode, de fato, diminuir a criminalidade que reina absoluta no Estado do Rio, trazer paz à população? Repito: duvido que aconteça. Há chances enormes de que a violência e a sensação de insegurança melhorem durante a passagem das forças federais pelo estado e tudo volte à ordem do caos no dia seguinte.

Por outro lado, sim, o Rio está entregue aos bandidos, assim como outros Estados da federação também e alguma coisa precisava ser feito. Mas nessa discussão rasa e partidária, percebe-se que a última coisa que importa são os moradores da favela.

Temos que prestar atenção no que as pessoas mais afetadas têm a dizer. Algumas reportagens trazem depoimentos de moradores apreensivos, e eles têm todos os motivos para estar. Assim como há relatos de pessoas que estão aliviadas com a vinda do Exército. 

A minha diarista mora em Caxias, nos arredores da favela do Dique, na Baixada Fluminense. Em cinco minutos de conversa ela foi mais assertiva do que muita gente diplomada, autora de vários textões que li nos últimos dias sobre o assunto.

Para ela, o grande problema durante essas ações é que os bandidos das favelas que recebem mais atenção acabam se refugiando nas menores. Ela diz que tem mais medo das ações do Bope que, em geral, chega atirando ou é recebido a tiros, do que da presença do Exército. Mas o fundamental é o que será feito em paralelo ao combate à bandidagem. “Sem programas sociais não muda nada. A gente vê a juventude se perdendo para o crime porque não tem amparo e alternativas.” Bingo. 

Um amigo contou que a diarista que trabalha com ele, moradora da Rocinha há 20 anos, diz que está com medo. Do Exército? Não, de que os bandidos que sumiram voltem, se o exército não passar as noites na favela. E para onde os bandidos vão? Parte da resposta pode estar no que a minha diarista falou, mas sabemos que muitos acabam fugindo para outros Estados, na espera de que a poeira se aquiete e eles possam se restabelecer. 

A presença do Exército, claro, inibe a bandidagem. O Rio de Janeiro viveu dias de glória durante a Olimpíada. Uma calmaria não sentida há anos. Mas também não é novidade o que acontece quando a festa termina. O que é uma completa incógnita é o que será feito durante essa intervenção. 

O anúncio tinha que ter vindo com o manual de como a operação vai funcionar. O governo não teve nem vergonha de admitir que não tinha um plano a ser seguido. Não sabemos como será feito, com que dinheiro e quais são, afinal, os objetivos. 

Não é pouco o que precisa ser feito. Além de combater o crime organizado que atua nas favelas, é preciso desmontar as facções que estão nos presídios, recuperar os territórios dominados pela bandidagem, atacar os roubos de carga, mas antes de qualquer coisa, varrer das estruturas de segurança policiais corruptos e ineficientes. 

No final de outubro, quando o ministro da Justiça, Torquato Jardim, disse que os comandantes de batalhões da PM são sócios do crime organizado no Rio de Janeiro e que o governo estadual não controla a polícia, todo mundo concordou e questionou por que não se fazia nada. Resolveram fazer. Mas o que? Revistar crianças em idade pré-escolar, armados de fuzis, não pode ser estratégia do Exército para combater corrupção, tráfico e violência.

Dizer que crianças podem carregar armas nas bolsas não é desculpa para que ações como essa se repitam, quando jamais deveriam ter acontecido. Se esse tipo de procedimento fizer parte do plano que ainda nem existe oficialmente é melhor entregar as chaves do estado aos bandidos porque não tem jeito mesmo.

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.