Mariliz Pereira Jorge

Jornalista e roteirista de TV.

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Mariliz Pereira Jorge

O apagão das mulheres afegãs

Quando os homens se cansam da guerra, às mulheres não sobra nem o direito de fugir

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Onde estão as mulheres? Eu me perguntava ao ver as imagens de cidadãos afegãos invadirem o aeroporto de Cabul, no Afeganistão. No interior de um avião da Força Aérea americana, um mar de rostos aflitos, mas uma minoria feminina no meio de mais de 600 pessoas.

Mais uma guerra decidida por homens. Mais uma guerra feita por homens. Quando estes se cansam de brincar, viram as costas e às mulheres não sobra nem o direito de fugir, quanto mais os outros. A situação no Afeganistão mostra como Simone de Beauvoir continua atual: “Nunca se esqueça que basta uma crise política, econômica ou religiosa para que os direitos das mulheres sejam questionados. Esses direitos não são permanentes. Você terá que manter-se vigilante durante toda a sua vida.”

O país não tinha se tornado um paraíso para as mulheres, ainda vítimas de extremistas, incluindo pais e maridos, mas os avanços tinham sido muitos. Da noite para o dia, a expectativa é que elas voltem a ser tratadas como não-indivíduos e o que se vê são governos normalizando o retrocesso das perdas de liberdades e da violência.

As pautas feministas estão na agenda do dia em qualquer lugar do mundo, mas pouca gente está vigilante. Toda a sociedade deveria estar atenta. Mas depois de um boom de atenção à nova onda do feminismo, muitos se dizem cansados de que “tudo é machismo”, não querem se envolver em discussões ou se responsabilizar pelo papel que têm nas mudanças necessárias.

O jornalista James Cimino, mestrando em relações internacionais no King’s College London, contou que em um módulo sobre segurança a discussão teria o viés feminista. A análise é de que as decisões da esfera política são tomadas por homens brancos da elite, enquanto as mulheres, maiores vítimas dos conflitos, estão fora das mesas de debate sobre os acordos de paz. Constatação importante, embora sem novidade.

Mas neste dia, apenas Cimino e o professor estavam na aula. “Ninguém quis discutir no grupo de Whatsapp”. Um dos argumentos foi “não vamos discutir mais sobre homens e mulheres, mas sobre humanos”. “Se no mundo acadêmico onde estão formando profissionais para lidar com esse tipo de conflito há essa apatia, imagine o que vai acontecer com as mulheres que não conseguiram escapar?”

Nos próximos dias veremos o mundo consternado com a situação das afegãs, até que o assunto desapareça como aconteceu com as imagens de mulheres desenhadas nas paredes de Cabul, cobertas de tinta no dia da tomada pelo Talibã.

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