Martin Wolf

Comentarista-chefe de economia no Financial Times, doutor em economia pela London School of Economics.

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Martin Wolf
Descrição de chapéu Financial Times

Promessas eleitorais irresponsáveis se chocarão com a realidade econômica brutal

Emprego está dinâmico, mas investimento lento impede o progresso da Grã-Bretanha

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A eleição no Reino Unido é uma competição de irresponsabilidade. Os conservadores prometem tirar o país da mais profunda área de livre comércio do mundo, embora ninguém saiba exatamente como e quando. Os trabalhistas são ainda mais obscuros sobre o Brexit e superam os conservadores em promessas caras, radicais e incríveis, de modo geral.

No entanto, as realidades econômicas não responderão aos encantos de Boris Johnson ou Jeremy Corbyn, como poderão reagir os eleitores. Quais são essas realidades?

Quatro delas exigem atenção especial: produtividade, emprego, investimento e o saldo externo. Essas realidades são interligadas e impõem restrições rígidas às opções reais, em oposição às fantasiosas, que o Reino Unido enfrenta hoje.

Como observa o Instituto de Estudos Físicos, "nos últimos 11 anos a produtividade --medida pela produção por hora trabalhada-- cresceu apenas 2,9%. É mais ou menos o mesmo que cresceu em média a cada 15 meses nos 40 anos anteriores".

Em consequência desse péssimo desempenho da produtividade, os salários reais médios não foram maiores em abril de 2019 do que haviam sido 11 anos antes. Para colocar isso em contexto, um estudo do Resolution Trust afirma que "a década passada foi a pior para o crescimento dos ganhos desde as guerras napoleônicas". Ai!

O líder do Partido Trabalhista do Reino Unido, Jeremy Corbyn - Jonathan Hordle/AFP

O emprego, ao contrário, parece bastante bem. A proporção da população entre 15 e 64 anos que está empregada saltou de 73% em 2008 para 75% em 2018. Para os homens, o aumento foi de apenas 79% a 80%. Mas para as mulheres foi de 67% a 71%.

O Japão e a Alemanha se saíram melhor que o Reino Unido no aumento do emprego feminino. No entanto, o Reino Unido ainda teve um aumento impressionante. O emprego feminino nos EUA, em contraste, ficou 5 pontos percentuais abaixo dos níveis do Reino Unido em 2018 e quase não mudou desde 2008.

​O Resolution Trust observa que os maiores aumentos de emprego entre as mulheres "ocorreram em famílias com filhos e entre as de renda mais baixa".

Por trás disso, parece ter havido um aumento na oferta de mão de obra feminina, em resposta a ganhos mais baixos e mais incertos dos parceiros masculinos e cortes nos benefícios. O fato de o aumento do trabalho coincidir com salários reais mais baixos confirma a ideia de que essa foi uma história de estímulo à oferta, e não de recuo da demanda, embora em um mercado de trabalho flexível.

Portanto, o aumento do emprego parece mais uma resposta ao mau desempenho do que um sucesso. Por trás disso está o colapso do crescimento da produtividade e dos ganhos reais. O que causou o primeiro?

O aumento do emprego é muito pequeno para explicar mais que uma pequena proporção do enorme colapso no crescimento da produtividade. A fraqueza do investimento deve ser uma causa mais importante. O progresso técnico não é desincorporado. Grande parte dele está embutido no investimento fixo.

Infelizmente, o investimento fixo bruto no Reino Unido foi em média de pouco mais de 16% do Produto Interno Bruto entre 2008 e 2017. A única economia moderadamente avançada com uma porcentagem ainda mais baixa foi a Grécia atingida pela crise. O investimento fixo alemão e norte-americano foi próximo de 20% do PIB.

Embora o investimento público do Reino Unido tenha sido baixo pelos padrões internacionais, em 2,8% do PIB, ainda ficou à frente dos da Itália e da Alemanha. Mas o investimento fixo no setor privado do Reino Unido foi menor, em relação ao PIB, que em todos os outros países avançados, exceto a Grécia.

Sem um salto no investimento privado, é difícil imaginar uma grande melhora no crescimento da produtividade. No entanto, a profunda incerteza criada pelo Brexit, bem como os impostos e outras políticas propostas pelos trabalhistas, faz com que esse salto pareça altamente improvável.

É possível imaginar um aumento do investimento público. Mas a experiência com o Crossrail e a linha ferroviária High Speed 2 mostra como é difícil criar e implementar grandes projetos de infraestrutura em tempo razoável.

No entanto, aumentar o investimento não é o único obstáculo. As restrições de recursos também podem ser importantes. O mais relevante é o deficit de pagamentos. Sem uma política para aumentar a poupança na economia, um grande aumento de investimentos certamente aumentará um deficit em conta corrente já muito grande. Ele ficou próximo de 4% do PIB em 2018, o maior das economias do G7.

Um aumento nos gastos de investimento para os níveis dos EUA poderia, se tudo o mais permanecer igual, elevar esse déficit para mais de 7% do PIB.

Em um mundo cheio de poupança, isso pode ser financiado em condições razoáveis, por algum tempo. Mas uma condição necessária seria a confiança dos poupadores e investidores do mundo no bom senso, autodisciplina e realismo dos formuladores de políticas britânicos. Espero que essas pessoas sintam exatamente isso ao observar a política britânica hoje. Mas dificilmente será provável.

Um colapso da moeda, um grande salto no nível de preços e mais uma compressão dos salários reais parecem muito mais plausíveis.

O Reino Unido é uma ilha. Mas um vasto mundo de investidores observa e se questiona.

Tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves

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