Martin Wolf

Comentarista-chefe de economia no Financial Times, doutor em economia pela London School of Economics.

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Martin Wolf
Descrição de chapéu Financial Times

Por que os republicanos não conseguem ser populistas?

O establishment foi derrotado, mas sua ortodoxia econômica reina

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Financial Times

O Plano de Resgate Americano do presidente Joe Biden é incrivelmente popular, mesmo entre eleitores republicanos. Ainda não temos detalhes sobre a próxima grande iniciativa democrata, mas podemos esperar que tenha boa aprovação, porque sabemos que vai combinar grandes gastos em infraestrutura com aumentos de impostos para as empresas e os ricos —que são coisas populares.

Mas, assim como o plano de resgate, o próximo plano provavelmente não terá um único voto republicano no Congresso. Por que todos os republicanos eleitos continuam tão comprometidos com as políticas econômicas de direita que ajudam os ricos, enquanto trapaceiam a classe trabalhadora?

Uma franca advertência: não darei uma boa resposta para essa pergunta. A intenção do artigo de hoje é, na verdade, defender a importância da pergunta.

Republicanos e democratas na Câmara dos Representantes para continuar o processo de certificação dos resultados do Colégio Eleitoral de 2020, em Washington - Erin Schaff - 6.jan.2021/File Photo/Reuters

Eu indago por que os republicanos "continuam" comprometidos com a política econômica de direita porque no passado não havia qualquer mistério sobre a posição deles.

Como muitos observadores, eu costumava ter um modelo "Qual é o problema do Kansas?" do Grande e Velho Partido. Isto é, como Thomas Frank, autor do livro de 2004 com esse título, eu via os republicanos essencialmente como uma empresa dirigida por e para plutocratas que conseguiam ganhar eleições jogando com as queixas culturais e a hostilidade racial da classe trabalhadora branca. O preconceito, porém, era principalmente um show apresentado aos caipiras; o partido retomava suas prioridades pró-ricos assim que cada eleição terminava.

O exemplo clássico foi quando George W. Bush venceu a reeleição posando como o defensor da América contra terroristas gays casados, e depois da vitória anunciou que tinha a incumbência de privatizar a Seguridade Social. (Não o fez.)

Mas isso parece muito tempo atrás.

Os bilionários podem ter instigado a marcha do Partido Republicano para o extremismo, mas eles claramente perderam o controle das forças que invocaram. O partido não pode mais colocar a intolerância de volta no armário depois de cada eleição, para enfocar o negócio real de cortes de impostos e desregulamentação. Pelo contrário, os extremistas estão no comando. Apesar de uma eleição perdida e uma insurreição violenta, o que restou do velho establishment republicano se degradou no altar do trumpismo.

Mas enquanto o poder no Partido Republicano se afastou quase completamente do establishment conservador o partido continua comprometido com uma ideologia econômica de cortes de impostos e gastos. E o motivo não é evidente.

Quando Donald Trump atropelou os candidatos do establishment em 2016, parecia possível que ele conduziria o partido para o que alguns cientistas políticos chamam de "democracia de Herrenvolk" —políticas que são genuinamente populistas e até igualitárias, mas só para membros dos grupos raciais e étnicos certos.

A África do Sul sob o apartheid funcionava assim. Havia gestos limitados em direção ao populismo só para brancos no sul dos Estados Unidos na época do racismo oficial (leis de Jim Crow). Na Europa, a Frente Nacional da França combina hostilidade aos imigrantes com pedidos de expansão do Estado do bem-estar social, já generoso.

Como candidato, Trump muitas vezes soava como se quisesse seguir nessa direção, prometendo não cortar os benefícios sociais e começar um grande programa de infraestrutura. Se ele tivesse honrado essas promessas, se tivesse mostrado um laivo de verdadeiro populismo, talvez ainda fosse presidente.

Na prática, porém, seu corte de impostos e sua tentativa fracassada de repelir o Obamacare saíram diretamente do manual conservador padrão.

A exceção que prova a regra foi a política agrícola de Trump, que envolveu enormes subsídios a agricultores prejudicados pela guerra comercial do governo, mas conseguiu dar quase todos esses subsídios aos brancos. A questão é que não havia nada parecido em um nível mais amplo.

A continuidade das políticas econômicas impopulares de Trump foi apenas um reflexo de sua ignorância pessoal e desinteresse substancial? Acontecimentos desde a eleição sugerem que não.

Eu já mencionei a oposição republicana travada ao pacote de alívio de Biden. A rejeição ao populismo econômico também é aparente no nível estadual. Veja o Missouri. Um de seus senadores, Josh Hawley, declarou que os republicanos precisam ser "um partido da classe trabalhadora, não um partido de Wall Street". Mas os republicanos na legislatura do estado acabam de bloquear o financiamento para uma expansão do Medicaid que custaria muito pouco ao estado e já foi aprovado pela maioria dos eleitores.

Ou considere a Virgínia Ocidental, onde outra promessa não cumprida de Trump, a de reviver a indústria do carvão, teve apoio dos eleitores. O carvão não vai voltar; por isso o governador republicano está propondo reforçar a economia... eliminando impostos de renda. Isso faz eco ao fracassado experimento de corte de impostos no Kansas alguns anos atrás. Por que imaginar que funcionaria melhor nos Apalaches?

Então o que está acontecendo? Desconfio que a falta de verdadeiro populismo na direita tenha muito a ver com o fechamento da mentalidade de direita: o establishment conservador pode ter perdido força, mas seus seguidores fiéis ainda são as únicas pessoas no partido que sabem alguma coisa sobre políticas. E o grande dinheiro ainda pode comprar influência, mesmo em um partido cuja energia vem principalmente da intolerância e do ódio.

Em todo caso, por enquanto os políticos republicanos estão fazendo um grande favor aos democratas, agarrando-se a ideias econômicas desacreditadas que até mesmo seus apoiadores rejeitam.

Traduzido originalmente do inglês por Luiz Roberto M. Gonçalves

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