Mathias Alencastro

Pesquisador do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento, ensina relações internacionais na UFABC

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Bolsonaro, o candidato de Pequim

Político deixou de ser candidato de nicho identitário para se tornar candidato do agronegócio

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Bolsonaro ri, com uma caixa de acrílico com um boneco de si próprio vestido com a faixa presidencial; ao fundo, um banner com o nome do candidato em letras brancas sob fundo azul
O deputado Jair Bolsonaro (PSL-RJ), pré-candidato à Presidência, segura um boneco de si próprio durante comício em Curitiba - Rodolfo Buhrer - 29.mar.18/Reuters

Recente sondagem da XP Investimentos indicou uma queda na desconfiança dos investidores em relação à eleição de Jair Bolsonaro para a presidência. Em novembro passado, 73% indicaram que a Bolsa cairia com uma vitória do candidato. Esse número passou para 41% em abril de 2018. Uma tendência paradoxal, considerando as dificuldades que os candidatos de extrema-direita costumam enfrentar para se tornarem palatáveis diante do mercado.

Marine Le Pen, por exemplo, lançou uma operação de charme junto ao empresariado com vista às presidenciais de 2017. Ela chegou até mesmo a renegar a sua promessa histórica de provocar a retirada imediata da França da União Europeia, prometendo ao invés disso um referendo semelhante ao realizado no Reino Unido. Ainda assim, às vésperas do segundo turno com Emmanuel Macron, Le Pen continuava sendo rejeitada pelo mercado, que previa um colapso da economia com a sua eleição.

Talvez a explicação para o crescimento da aceitação de Bolsonaro entre os investidores esteja na afirmação da indústria da soja como o motor da economia brasileira. É relativamente consensual que Bolsonaro, nos últimos dois anos, deixou de ser o candidato de um nicho identitário —os nostálgicos da ditadura— para se tornar o candidato de um setor econômico —o agronegócio.

Nesse sentido, a candidatura de Bolsonaro deve ser apreendida como o primeiro projeto político de um grupo de interesse em plena ascensão. Fortalecido pela produção de soja e milho, responsável por quase 4% do Produto Interno Bruto, a região do Centro-Oeste, e principalmente Mato Grosso do Sul e Goiás, parece ter desenvolvido a ambição de tornar-se a versão brasileira do Texas que, com a ajuda dos petrodólares, elegeu dois dos últimos cinco presidentes americanos.

No entanto, é essencial ter em conta que o fiador do mercado que apoia a candidatura de Jair Bolsonaro é o Partido Comunista chinês. A indústria da soja da China funciona como um cartel controlado por um punhado de estatais que consomem, juntas, mais de dois terços da produção de soja brasileira.

Ou seja, na prática, Bolsonaro é o homem de um grupo de investidores que depende das boas relações com Pequim.

As implicações para o Brasil da relação entre Bolsonaro e China através do agronegócio se tornarão, mais cedo ou mais tarde, um tema de campanha. Um governo Bolsonaro teria autonomia para se posicionar contra a China em questões comerciais e estratégicas? As instituições financeiras ocidentais levariam a sério as promessas de liberalismo econômico por parte de um governo fortemente exposto à influência da China?

A julgar pelas suas críticas aos investimentos chineses no Brasil, e pelo seu deslocamento a Taiwan, principal antagonista de Pequim, Bolsonaro parece indiferente à geopolítica que alavanca a sua candidatura. Isto posto, com o decorrer da campanha, é provável que o lobby do agronegócio comece a pesar no seu cálculo politico, e que a China se torne para Bolsonaro o equivalente da Rússia para Donald Trump. Um aliado inconveniente.

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