Mathias Alencastro

Pesquisador do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento, ensina relações internacionais na UFABC

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Mathias Alencastro
Descrição de chapéu Diplomacia Brasileira

Brasil é gol fácil da diplomacia Biden

Ironicamente, olavismo anti-China funcionará como garantia aos americanos

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A velocidade com que Joe Biden se debruçará sobre a situação internacional depende da evolução da batalha eleitoral. Um governo que comanda o Senado e a Câmara tenta passar o máximo de medidas domésticas até as eleições de meio de mandato. Um Executivo isolado é tentado a acelerar a política externa para compensar a fragilidade interna.

Para uma futura administração Biden, que tem como principal objetivo construir novos consensos, a ação internacional também tem a vantagem de ser um dos raros pontos de convergência entre democratas e republicanos.

A agenda ambiental, muito polarizada durante a campanha, poderia ser uma das raras exceções à regra.
Donald Trump chegou a retirar os EUA do Acordo de Paris, num exemplo raro de intervenção política contra os compromissos internacionais do Estado. Felizmente para os democratas, Jair Bolsonaro encontra-se à disposição para mobilizar 
todos em torno de uma das bandeiras do novo presidente.

Sabemos que as chances de sucesso de agendas ambientais aumentam exponencialmente quando elas suscitam a adesão de interesses antagônicos.

Feito raríssimo, uma postura agressiva contra o Brasil na questão ambiental encontraria apoio entre os produtores de grãos e proteínas do Meio-Oeste, rivais geopolíticos dos agricultores brasileiros, e a ala esquerdista dos democratas, que há muito designou Bolsonaro como um dos principais vilões globais.

Um acirramento das relações com o Brasil também carregaria poucos riscos estratégicos. Largado na arena internacional desde o longínquo mandato de Dilma Rousseff, o Brasil talvez nunca tenha importado tão pouco para os Estados Unidos, de olhos virados para a Ásia.

O fato de Bolsonaro ter se algemado a Trump diminui o risco de Brasília ensaiar um alinhamento político com Pequim. Ironicamente, o ativismo olavista anti-China vai funcionar como um seguro-garantia para os diplomatas americanos. Todos esse fatores fazem da agenda ambiental contra o Brasil uma forma simples e barata de Biden mostrar a que veio para o mundo.

Na mira de Washington, os atores econômicos nacionais parecem conscientes de que será quase impossível impedir uma catástrofe. Afinal, na questão ambiental, o governo sempre se moveu pelos sentimentos. A soberania na Amazônia é uma ideologia fundadora do aparato militar. Para Bolsonaro, o direito do brasileiro de devastar a mata e ameaçar os povos indígenas é uma questão de princípio.

A resistência de Brasília vai legitimar ações mais duras por parte dos EUA e de seus aliados. Como prato de entrada, empresas brasileiras poderiam ser obrigadas pelo Departamento do Tesouro americano a comprovar que não 
participam de desmatamento para continuar exportando.

Nos anos 1980, enquanto senador, Biden participou da construção de uma aliança global contra o último bastião do colonialismo, o regime do apartheid da África do Sul. Se o governo Bolsonaro não mudar radicalmente, existem chances reais de o democrata repetir o feito e unir o mundo contra o Brasil, último bastião do negacionismo climático.

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