Mathias Alencastro

Pesquisador do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento, ensina relações internacionais na UFABC

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Descrição de chapéu Governo Bolsonaro

A um ano da eleição, chegou a hora de dar nome ao boi

Hesitação em designar Bolsonaro como líder da extrema direita talvez ajude a explicar dificuldade da formação de oposição coesa

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Líderes de extrema direita costumam contestar tal rótulo a todo custo, por medo de serem catalogados como um político pária. Na França, a presidenciável francesa Marine Le Pen tenta se distanciar do passado antissemita de seu pai, Jean-Marie.

Estrela ascendente da política portuguesa, André Ventura, líder do partido Chega!, tem contestado publicamente a sua designação como líder de extrema direita. Todo o contrário de Bolsonaro, que tem o sinistro mérito de nunca ter renegado a sua radicalidade.

Jair Bolsonaro durante cerimônia no Palácio do Planalto, em Brasília
Jair Bolsonaro durante cerimônia no Palácio do Planalto, em Brasília - Adriano Machado - 2.set.21/Reuters

Desde o começo de sua carreira política, Bolsonaro sempre vinculou o seu destino ao de Carlos Brilhante Ustra, referência do fascismo brasileiro pós-anos 1940. Apesar disso, a identidade do seu governo, produto de uma campanha caótica, era dada como incerta.

A presença de Paulo Guedes, o apóstolo dos mercados, deixava em aberto a possibilidade de uma evolução para um projeto liberal-conservador. A adesão incondicional de quadros de centro-direita criava as condições para uma reorganização do campo conservador em torno da figura do presidente.

Só que nada disso aconteceu. Passaram-se três anos, e Bolsonaro já deu inúmeras provas do seu compromisso com as agendas mais radicais dentro da própria extrema direita: a defesa incendiária da teocracia, da insurreição contra o regime democrático, da presença de um Estado autoritário e do alinhamento a regimes ditatoriais ao redor do mundo.

O 7 de Setembro ajudou a consolidar a sua identidade política em três atos. Os dois primeiros, a exaltação do golpe de Estado e o apelo à violência contra instituições da República, como o STF, foram amplamente denunciados. Um terceiro precisa ser mais aprofundado. A homofobia, onipresente no discurso bolsonarista desde a sua incipiência, foi definitivamente elevada a bandeira do governo.

O presidente vem recorrendo a instrumentos retóricos que se assemelham ao dos antissemitas para agredir adversários com insinuações sobre as suas orientações sexuais. Ao tentar criar uma divisão fictícia da sociedade entre “machos e homossexuais", Bolsonaro está colocando um alvo nas costas de toda a comunidade LGBT. A linha da violência política foi definitivamente cruzada.

E, no entanto, muitos continuam hesitando em utilizar o termo adequado para designar o campo de seu chefe de Estado. Após um amplo debate sobre a terminologia exata para caracterizar o governo Bolsonaro no começo do mandato, o que também ocorreu nesta Folha, quase todos optaram pelo conforto da ambiguidade.

O termo populista foi usado para facilitar as falsas equivalências entre Bolsonaro e outros governantes de esquerda, sobretudo Lula. Jargões como conservador ou autoritário ajudaram a diluir o radicalismo de Bolsonaro em convicções culturais e comportamentos descontrolados.

Terminologias contam, e a hesitação em designar Bolsonaro como líder da extrema direita talvez ajude a explicar a dificuldade da formação de uma oposição coesa e irredutível ao seu governo. A um ano da eleição, chegou a hora de dar nome ao boi.

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