Mathias Alencastro

Pesquisador do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento, ensina relações internacionais na UFABC

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Eleição leva Portugal mais à esquerda e expõe crise da direita democrática

Resultado do pleito reforça impressões gerais sobre dinâmica da política na era pós-pandemia

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Muitos portugueses foram votar neste domingo atravessados pela mesma pergunta que tira o sono de muitos brasileiros: como assegurar a aliança das forças democráticas contra a extrema direita?

A tão esperada ascensão do Chega seria suficiente para colocar o PSD, tradicional partido da centro-direita, face ao dilema que tem devorado a alma dos conservadores ao redor do mundo? Isto é: aliar-se à nova direita, xenófoba, negacionista e antirrepublicana, ou buscar a preservação do pacto democrático por meio de uma aliança com a centro-esquerda? A angústia dos conservadores era hoje visível no rosto de Rui Rio, o apático líder do PSD, que passou a campanha prometendo tudo e o seu contrário.

Do outro lado, o socialista António Costa parecia não ter vontade nem condições de reeditar a geringonça, como é conhecida a aliança das esquerdas que governou Portugal aliando disciplina fiscal e inserção internacional entre 2015 e 2019.

Apesar do sucesso da empreitada, o Partido Comunista e o Bloco de Esquerda romperam com o Partido Socialista em 2019 e, no final do ano passado, ajudaram a derrubar o seu governo minoritário. Durante a campanha, Costa pareceu cansado e sem ideias, pressionado por novos líderes do seu partido e fragilizado pelo desmonte de um projeto de poder que ele havia desenhado de cabo a rabo.

Nesse contexto moroso, ninguém esperava a vitória triunfal dos socialistas deste domingo e o melhor resultado de Costa em três eleições. Mesmo se os socialistas não conquistassem a maioria absoluta na Assembleia da República, Costa só precisa, em principio, de acordos pontuais com aliados para seguir no comando de Portugal num momento decisivo da sua história: caberá ao próximo governo administrar a chamada "Bazuca", os volumosos fundos europeus destinados à retomada da economia.

O resultado em Portugal também reforça algumas impressões gerais sobre a dinâmica da política na era pós-pandemia. Primeiro, experiência da crise sanitária e a tomada de consciência da crise climática estão reaproximando os eleitores dos partidos comprometidos com o Estado social.

Segundo, o que todos se acostumaram a chamar de crise da democracia pode ser, na realidade, uma crise da direita. Com a confirmação do Chega como terceira força política, fica impossível para a direita democrática portuguesa competir eleitoralmente contra a centro-esquerda. Uma situação subjacente nos Estados Unidos no meio do Partido Republicano, escancarada na França, onde o racha das direitas é ainda mais profundo e, em certa medida, no Brasil, onde o surgimento de Sergio Moro e Jair Bolsonaro colocou a direita democrática em minoria dentro do campo conservador.

Por último, é impossível não destacar a atuação de Rui Tavares, candidato a deputado pelo Livre. Conhecido no Brasil pelo seu podcast "Agora, agora e mais agora", ele mostrou que a melhor forma de combater a baixaria verbal de candidatos mais acostumados às redes sociais do que aos debates eleitorais é a retidão republicana, as propostas inovadoras e o otimismo com o futuro. Uma inspiração para todos os progressistas brasileiros.

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