Mathias Alencastro

Pesquisador do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento, ensina relações internacionais na UFABC

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Mathias Alencastro
Descrição de chapéu Europa União Europeia

Força do euro aos 20 anos faz com que ele deixe de ser tema de campanha

No ápice, moeda completa duas décadas e obriga populistas a dar revolta por encerrada

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O euro celebra duas décadas no ápice da sua força. Ator central do funcionamento da União Europeia, o Banco Central Europeu se prepara para lançar um programa de financiamento dos países-membros, numa modalidade híbrida de empréstimos e doações. Países como a Grécia vão receber o equivalente a 9% do seu PIB.

Segundo a última sondagem do Eurobarômetro, o medidor da opinião pública da União Europeia, 80% dos cidadãos das nações que integram o bloco apoiam o euro.

Notas de 20 euros sobre bandeira da União Europeia; moeda completou 20 anos de circulação em 1º.jan - Zheng Huansong/Xinhua

O entusiasmo não deixa de surpreender, tamanha foi a demonização da moeda durante quase toda a sua breve existência. No começo do século, os movimentos antissistema exploraram o aumento do custo de vida gerado pela introdução do euro para radicalizar o debate sobre a União Europeia. A vitória do "não" no referendo sobre o Tratado Constitucional Europeu organizado na França em 2005 marcou o começo de uma era de incertezas.

A partir desse momento, o debate técnico sobre os méritos do novo sistema monetário, tão instigante nos anos 1990, deu lugar a uma campanha de fortes tons populistas reunindo libertários adeptos das teses de Milton Friedman, anticapitalistas e nacionalistas.

Depois da crise de 2008 e da imposição de medidas de austeridade brutais nos países do sul do continente, o euro passou a ser caricaturado como peça final de um projeto de colonização dos outros europeus pelos alemães mancomunados com os tecnocratas da UE. Uma retórica delirante, mas tremendamente eficiente, que mais tarde serviu de inspiração para as campanhas a favor do brexit no Reino Unido e contra a OMS ou as Nações Unidas nas Américas.

O episódio do grexit, quando os gregos votaram massivamente contra um novo plano de ajuste fiscal num ato de rebelião contra a União Europeia, foi um divisor de águas na história do euro.

Mesmo no paroxismo da crise, quando o desmantelamento do sistema monetário parecia ser a única solução possível, o apoio à moeda nunca desceu abaixo de 60%, inclusive nos países mais castigados pela austeridade.

A pandemia só reforçou as convicções pró-euro dos europeus. Hoje, gregos, portugueses e tantos outros estão plenamente conscientes de que seus respectivos governos jamais conseguiriam navegar os mares da pandemia munidos de suas moedas de outrora.

Os dracmas, os escudos de nada serviriam para combater a inflação e estabilizar cadeias de abastecimento. O pesadelo da lira, a moeda turca que acabou de viver seu pior ano em duas décadas, provavelmente se repetiria em outros países europeus.

As evidências a favor do euro são tão fortes que os populistas foram obrigados a dar a revolta por encerrada. Prestes a iniciar sua terceira campanha presidencial, Marine Le Pen se posicionará pela primeira vez a favor da manutenção da França na zona do euro. Seu rival na extrema direita Eric Zemmour, que defendeu publicamente o frexit durante toda a carreira de jornalista, também aposentou a bandeira.

Tema estruturante do debate econômico europeu das duas últimas décadas, o euro simplesmente deixou de ser um assunto de campanha.

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