Mathias Alencastro

Pesquisador do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento, ensina relações internacionais na UFABC

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Descrição de chapéu twitter

Bolsonaro quer compensar isolamento com trio Musk-Trump-Telegram

Uma tentativa de golpe não precisa derrubar o regime para cumprir sua missão, como republicano ensinou nos EUA

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O tão propalado encontro de Jair Bolsonaro e Elon Musk poderia ser só mais um episódio de comunicação política rasteira, realizado para inundar os jornais com factoides em plena crise institucional e humanitária no Brasil, mas é muito mais do que isso.

Ele torna irreversível a ruptura de relações do governo brasileiro com o americano. Afinal, Bolsonaro elevou a "mito da liberdade" o indivíduo que pretende comprar a rede social mais influente do mundo para reabilitar Donald Trump às vésperas das chamadas midterm, eleições de meio de mandato.

O presidente Jair Bolsonaro cumprimenta o bilionário Elon Musk, com o ministro Fábio Faria ao fundo, em evento no interior de SP - Kenny Oliveira - 20.mai.22/Divulgação Ministério das Comunicações/AFP

Confirmando a ideia de que o convite a Musk é, antes de tudo, um novo aceno à extrema direita global, o senador Flávio Bolsonaro reiterou a acusação de fraude nas eleições americanas em entrevista bélica no meio da semana. Cabe lembrar que o ataque às instituições é uma linha vermelha para o governo Biden apenas equiparável ao apoio ao terrorismo internacional.

O Brasil, portanto, se encontra em uma situação histórica em que seu presidente se prepara para golpear a democracia sem o respaldo da superpotência. Não há palavras publicáveis para descrever o sentimento de dirigentes europeus em relação a Bolsonaro e seus ministros. A mensagem do Atlântico Norte é cristalina: na era das supersanções, a violação da ordem democrática significaria o banimento de Brasília do sistema financeiro.

Os países do Brics tampouco parecem interessados em abrir uma nova frente de instabilidade. Pequim deixou claro na semana passada que a prioridade do bloco é impedir que se crie um abismo entre o Norte e o Sul.

Isso não significa que uma derrocada democrática está descartada, pelo contrário. Na última década, o golpe de Estado voltou a ser moeda corrente no Sul Global. Cerca de 20% dos regimes dos Estados africanos foram mudados pela força desde 2013. No mesmo período, os militares passaram a ditar os rumos de inúmeros regimes do Sudeste Asiático e do sul do continente. Enquanto isso, nas Américas, uma mão cheia de governos mergulhou no autoritarismo.

O Brasil, no entanto, é considerado nos círculos diplomáticos como grande demais para cair, para usar um jargão financeiro. Um Capitólio tropical seria uma tripla catástrofe global: a queda de uma das maiores democracias do Sul Global, a sentença de morte da Amazônia, e uma vitória política do trumpismo a dois anos das presidenciais americanas.

Mas uma tentativa de golpe não precisa derrubar o regime para cumprir sua missão. Se Bolsonaro aprendeu uma coisa com Trump é que o vandalismo eleitoral é a melhor forma de perpetuar um movimento político depois da derrota.

Além de Musk e Trump, Bolsonaro vem pressionando pela indicação de um servidor do seu governo na embaixada brasileira dos Emirados Árabes Unidos, a capital do Telegram e de outras arapucas tecnológicas e financeiras apreciadas por autocratas. Com a internacional golpista Musk-Trump-Telegram, o presidente vai tentar compensar o isolamento e garantir apoio para antes e depois da eleição.

Impedir o golpe passa por aceitar que ele não será convencional em seu planejamento, instrumentos e objetivos.

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