Matias Spektor

Professor de relações internacionais na FGV.

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Matias Spektor
Descrição de chapéu

Sem paciência

Pedido de fechamento temporário da fronteira com a Venezuela é estratégia eleitoreira

O governo de Roraima pediu ao Supremo Tribunal Federal o fechamento da fronteira com a Venezuela. Como o pleito viola a Constituição e nossos compromissos internacionais, não passará, e os proponentes já sabem disso. Mas eles não se comovem. Afinal, trata-se de estratégia eleitoreira.

Na tentativa de ganhar votos, parte da classe política de Roraima está copiando tendência global: acusar migrantes e refugiados de abocanhar os recursos públicos escassos dos nacionais.

O mote de fechar a fronteira tem como expoentes a governadora Suely Campos (PP) e o senador Romero Jucá (MDB). Se a proposta trará votos, ninguém sabe. Mas a turma está desesperada. 

Juntos, eles respondem por denúncias, investigações ou inquéritos por crime de responsabilidade, organização criminosa, corrupção passiva, lavagem de dinheiro, desvio de verba pública e improbidade administrativa. Sem foro privilegiado, essa gente corre risco de perder a liberdade.

Por esse motivo, a questão da fronteira entrará em cheio no calendário eleitoral. E isso é um problema.
Quando a proposta do governo de Roraima chegou ao STF, Michel Temer soltou: “incogitável”. Ainda mais irritado, o chanceler Aloysio Nunes fustigou: “Tenha santa paciência”.

A reação é compreensível. Nos últimos tempos, o governo federal montou um gabinete de crise, liberou recursos, concedeu aos migrantes o direito de trabalhar e liberdade de movimento. 

Há novos controles de fronteira e uma Operação Acolhida em andamento. Embora tais medidas cheguem com atraso —e em que pesem os problemas embutidos em militarizar a resposta, como tem ocorrido—, elas vão na direção correta.

Por isso, a indignação com o pedido da governadora ao STF não é uma boa resposta. Como a política brasileira é cada vez mais tolerante à xenofobia, é necessário partir para cima com contra-argumentos e com o exemplo do que já vem sendo feito.

O problema não se limita a Roraima. A ideia de selar a fronteira já aparece no discurso de campanha do governador do Mato Grosso do Sul, Reinaldo Azambuja (PSDB), e encontra eco entre alguns assessores do ex-governador Geraldo Alckmin (PSDB). Jair Bolsonaro (PSL) sugere criar um “campo de refugiados”.

Os países que tentaram fechar as fronteiras aos fluxos de imigrantes terminaram pagando uma conta altíssima ao incentivar o tráfico de pessoas, o mercado negro de vistos e a proliferação da criminalidade.

A única maneira decente de gerir uma crise migratória é oferecer oportunidades de recomeçar a vida até o dia em que voltar para seu país em segurança seja uma opção. É isso que tem de ser defendido.

Erramos: o texto foi alterado

A prefeita de Boa Vista, Teresa Surita, não é a favor do fechamento temporário da fronteira de Roraima com a Venezuela, como foi informado em versão anterior deste texto.
 

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