Mauricio Stycer

Jornalista e crítico de TV, autor de "Topa Tudo por Dinheiro". É mestre em sociologia pela USP.

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Acidente em câmera lenta

Conflito entre canais e operadoras de TV paga afeta diretamente o consumidor

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A Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) proibiu na semana passada, por meio de medida cautelar, que o canal Fox venda conteúdo de seus canais diretamente ao consumidor, sem intermediação das operadoras de TV paga. A decisão está causando grande balbúrdia, para usar uma palavra na moda, no mercado.

Em nota divulgada na última terça-feira (18), a Abert (Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão) e a Abratel (Associação Brasileira de Rádio e Televisão) consideraram “inadmissível” a concessão da medida cautelar da Anatel. “A decisão representa um claro retrocesso no direito do consumidor à oferta de conteúdos e pacotes variados a preços competitivos."


A agência governamental agiu em resposta a uma denúncia do grupo Claro-Net, dono de cerca de 50% do mercado de TV por assinatura no Brasil. A empresa vem se manifestando publicamente contra iniciativas do tipo que a Fox faz desde o ano passado.

“Pode gostar ou não (da lei), pode trabalhar para revogá-la, mas é a que existe e está sendo descaradamente infringida e ninguém fala nada”, disse José Félix, CEO do grupo em novembro de 2018.
Sancionada em 2011, a chamada lei do Seac (Serviço de Acesso Condicionado), que regula o setor de TV por assinatura, estabelece que a tarefa de comercializar conteúdos audiovisuais cabe a distribuidoras (as operadoras) e não a produtoras (os canais).

Tigres na Tailândia em 2016 - AFP

Esta disputa deve ser entendida no contexto da retração lenta, mas contínua, do mercado de TV por assinatura nos últimos quatro anos. Em novembro de 2014, no seu ápice, o Brasil contava com 19,8 milhões de assinantes. De acordo com o dado mais recente, referente a abril de 2019, há hoje 17,07 milhões de domicílios com TV paga no país.

Em paralelo, vem crescendo, ao menos nos grandes centros urbanos, o acesso à banda larga, o que facilita o consumo de conteúdos audiovisuais pela internet. A Netflix, principal empresa atuando nesse setor, já teria entre 7 e 8 milhões de assinantes no Brasil, segundo diferentes estimativas (a empresa não divulga números específicos).

O conflito entre a Fox e a Claro interessa de perto ao consumidor e mostra que a legislação do setor precisa, de fato, passar por atualização. Mas não apenas em relação a esta questão específica.

Uma reportagem recente da The Hollywood Reporter mostrou como diferentes produtores de conteúdo europeus estão se movimentando e, em alguns casos, se unindo para enfrentar as empresas americanas.

Além de Netflix e Amazon, já em atividade, aguarda-se para o início do próximo ano a entrada no mercado europeu dos serviços de streaming Disney +, Apple TV+ e WarnerMedia.

Ouvido pela publicação, um pesquisador da empresa Enders Analysis, François Godard, disse: “As emissoras europeias não têm recursos para competir sozinhas contra players globais como a Netflix. Se não ficarem juntas, a Netflix vai jantá-las, uma a uma”.

Descrevendo um quadro que lembra a situação no Brasil, Godard compara o mercado europeu a um acidente de carro em câmera lenta. O negócio tradicional (TV aberta mais TV por assinatura) ainda supera o mercado de streaming, mas não cresce.

Em outro flanco, em outubro de 2018, o Parlamento Europeu aprovou uma norma estabelecendo que 30% dos catálogos dos serviços de vídeo por demanda oferecidos nos países-membros terão de ser formados por obras europeias.

São questões sérias, por envolver negócios bilionários e interesses estratégicos, e que precisam ser discutidas por aqui também.

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