Mauricio Stycer

Jornalista e crítico de TV, autor de "Topa Tudo por Dinheiro". É mestre em sociologia pela USP.

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Delicada, 'Bom Sucesso' diverte sem tratar o público como idiota

É possível escrever uma novela boa e alcançar audiência elevada

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Um leitor escreveu para reclamar que sentiu falta de uma conclusão minha na coluna do último domingo (“O jogo do conteúdo”). De fato, encerrei o texto com as palavras de Silvio de Abreu, diretor de teledramaturgia da Globo, dizendo que o público de novelas de sucesso, como “A Dona do Pedaço”, não quer pensar.

“É emoção, não é razão. Toda vez que a novela é muito racional, ela não chega ao grande público, não tem uma audiência muito grande”, disse ele.

Respondi ao leitor que terminei a coluna dessa forma, com a fala de Abreu, porque achei que ali estava a chave para explicar a ruindade da novela. Mas reconheço que poderia ter sido mais explícito.

É uma trama que abomina a lógica, com personagens que agem sem motivação coerente, escrita da maneira mais simples possível, buscando manipular o espectador de forma elementar, provocando indignação e, em seguida, catarses.

A regra enunciada por Abreu, felizmente, ainda não é obrigatória na Globo. É possível escrever uma novela boa e alcançar audiência elevada com um texto bem escrito, que emociona sem apelar e, até, faz algumas concessões à razão. “Bom Sucesso”, exibida às 19h, está demonstrando isso.

Primeiro, os números. Dados compilados pelo site Notícias da TV mostram que, nas suas três primeiras semanas de exibição, “Bom Sucesso” registrou média de audiência em São Paulo superior às últimas 21 novelas do horário. Ou seja, desde “Sete Pecados”, em 2007.

Inúmeras variáveis influenciam esse resultado, desde o clima invernal na cidade até a boa audiência da novela que a antecedeu no horário, além da falta de apelo dos programas da concorrência. Mas é inegável que o principal fator é a qualidade da história de Rosane Svartman e Paulo Halm.

Não faltam, claro, motivos para se emocionar com a trama. Mas o resultado encantador que tem alcançado, até o momento, é fruto de uma combinação mais eclética e ambiciosa de fatores.

A trama gira em torno do dono de uma editora de livros, Alberto (Antonio Fagundes, ótimo), que sofre de leucemia e tem alguns meses de vida, e Paloma (Grazi Massafera, luminosa no papel), uma costureira humilde, que por obra de uma série de coincidências se tornou sua cuidadora.

Ranzinza e elitista, Alberto enxergava a sua editora como um oásis em meio ao caos. “Num país de analfabetos, os poucos que têm cultura são os que me interessam”, disse no primeiro capítulo. 

Paloma é o oposto. Mãe afetuosa de três filhos, que cria sozinha, apaixonada pela escola de samba do bairro, amiga de todos, adquiriu sabedoria na vida, longe dos livros.

Com extrema delicadeza, capítulo a capítulo, os autores estão construindo essa relação entre os dois. Enquanto Alberto lê trechos de obras-primas da literatura para Paloma, ela o alerta sobre aspectos da vida que ele sempre ignorou.

Várias outras histórias, claro, correm ao redor. De um lado, há a atribulada vida amorosa de Paloma, dividida entre um ex-namorado, que no passado a largou para tentar a vida nos Estados Unidos, e um bon vivant rico e irresponsável. De outro, o cotidiano tragicômico da editora de Alberto, assolada por dívidas e que enxerga uma tábua de salvação na publicação da biografia de uma atriz popular.

A história também tem seus vilões, situações rocambolescas, núcleos acessórios, suspenses e tudo o mais que um folhetim exige. Mas, embalada por uma magnífica canção de Cartola e Elton Medeiros, “Bom Sucesso” mostra que nem tudo é idiotice em matéria de novela, além de acreditar, talvez com ingenuidade, que “finda a tempestade, o sol nascerá”.

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