Mauricio Stycer

Jornalista e crítico de TV, autor de "Topa Tudo por Dinheiro". É mestre em sociologia pela USP.

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Enfrentando o racismo

Especial de Natal e novela da Globo ampliam a representação racial na tela

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Num momento como o atual, em que problemas graves do país, como a existência de racismo, não apenas são questionados, mas até negados pelo governo, a televisão pode ter um papel importante.

E, como já ocorreu em outros estágios da nossa história recente, a área do entretenimento, sem as limitações impostas ao jornalismo, pode tratar com mais liberdade desses assuntos.

Foi o caso, na noite de 25 de dezembro, do programa especial de Natal exibido pela Globo.

“Juntos a Magia Acontece” apresentou, como seria de se esperar, uma história dramática com final edificante, temperada com algum sentimentalismo. Resumidamente, o Natal de uma família de baixa renda em Madureira, no Rio de Janeiro, marcada pela morte recente da matriarca e pelo desemprego do principal provedor.

O programa trouxe três novidades importantes. Primeiro, todos os seis protagonistas da história foram vividos por atores negros. Segundo, foi escrito por uma autora negra, Cleissa Regina Martins, de 24 anos. Ela foi revelada pela primeira turma do Laboratório de Narrativas Negras, uma parceria entre a Globo e a Flup, a Festa Literária das Periferias, iniciada em 2017.

O racismo, naturalmente, foi tratado sem filtros. Aposentado e viúvo, Orlando (Milton Gonçalves) tenta arrumar um bico como Papai Noel para ajudar nas contas da família, mas é considerado “moreno” demais.

Nem mesmo um comerciante negro, vivido por Tony Tornado, dá emprego para ele: “Presidente até vai, mas Papai Noel preto, não”, diz, referindo-se a Barack Obama.

O ator Milton Gonçalves está no elenco do especial de Natal da Globo, “Juntos a Magia Acontece”, que vai ao ar no dia 25 de dezembro; no programa, ele será Orlando, que tem o sonho de ser um Papai Noel
O ator Milton Gonçalves está no elenco do especial de Natal da Globo, 'Juntos a Magia Acontece', que vai ao ar no dia 25 de dezembro; no programa, ele será Orlando, que tem o sonho de ser um Papai Noel - Estevam Avellar/Globo
 

A terceira novidade é que o especial foi resultado de uma parceria comercial da Globo com a Coca-Cola, 
intermediada pela WMcCann. Ela foi uma das 15 agências de propaganda que firmaram no ano passado um pacto com o Ministério Público do Trabalho se comprometendo a ampliar o espaço para profissionais negros no mercado publicitário nacional.

“Lindo, inédito e importante trabalho”, festejou a procuradora Valdirene Assis, no dia da estreia do especial de Natal da Globo. Desde o final de 2017, ela integra um grupo de trabalho formado por procuradores do MPT de diferentes regiões do país dedicado especificamente à questão da representação racial na mídia.

A ação deste grupo ganhou visibilidade em maio de 2018. O pretexto foi oferecido pela própria Globo com a estreia de “Segundo Sol”, uma novela ambientada em Salvador, cidade com população, em sua maioria, formada por negros e pardos. Além de todos os protagonistas serem brancos, havia apenas três atores negros entre os 26 principais.

A situação incomodou até mesmo o elenco da novela, que procurou a direção da emissora. Em nota, na ocasião, a Globo reconheceu o problema: “Foi colocado que, de fato, ainda temos uma representatividade menor do que gostaríamos e vamos trabalhar para evoluir com essa questão”.

Lançada no final de julho do ano passado, “Bom Sucesso” expressa uma situação diferente, não apenas em termos numéricos (dos 51 personagens da trama, 17 são vividos por atores negros ou pardos), mas na forma de apresentação.

Há negros em diferentes posições na trama: um dos protagonistas, a diretora comercial de uma editora de livros, um médico, a diretora de uma escola, além, claro, dos vários moradores que formam o núcleo do bairro de Bonsucesso, na zona norte carioca.

Diferentemente de quem nega o racismo, os autores da novela, Paulo Halm e Rosane Svartman, têm dado seguidas mostras de que reconhecem a existência do problema. 

Fazem isso, porém, sem condescendência, o que, para mim, parece um aspecto positivo, mas é visto criticamente por militantes da causa. Em todo caso, é um debate aberto propiciado pela novela.

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