Mauricio Stycer

Jornalista e crítico de TV, autor de "Topa Tudo por Dinheiro". É mestre em sociologia pela USP.

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BBB amplia o seu alcance ao confinar participantes machistas

Não se deve descartar que esse conflito tenha sido sonhado pela direção do reality

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Entre críticas a diferentes ações do governo Bolsonaro nas áreas da cultura e dos direitos da mulher, a economista Laura Carvalho também informou no seu Twitter na última terça (4): "Vocês conseguiram. Me rendi ao 'Big Brother' só pra ver o tal Petrix sair". Ela não foi a única.

 

Após duas semanas no ar, o ginasta Petrix Barbosa, medalha de ouro nos Jogos Pan-Americanos de 2011, foi eliminado com 80% dos votos numa disputa com outros três participantes. Sua alta rejeição foi causada por atitudes grosseiras, quando não abusivas, com mulheres que estão participando do reality show.

A Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher intimou Petrix a depor quando ele ainda estava confinado, notícia que chegou ao Jornal Nacional de segunda (3).

Na primeira semana, o eliminado foi o surfista Lucas Chumbo, também criticado por comentários machistas dentro da casa. A atriz Bruna Marquezine, seguida por 38 milhões de pessoas no Instagram e 7 milhões no Twitter, havia classificado Chumbo como "tóxico" na véspera da votação que o tirou do BBB 20.

O questionadíssimo programa da Globo alcançou um novo patamar neste ano ao estabelecer, logo de cara, um confronto entre homens orgulhosamente machistas e mulheres conscientes da necessidade de enfrentar esse tipo de comportamento tóxico.

Como isso ocorreu? Não é simples a resposta, uma vez que se trata de um programa cuja essência reside no fato justamente de não seguir um roteiro.

O maior ou menor sucesso de cada edição do BBB costuma estar relacionado à habilidade da direção de montar elencos capazes de produzir de forma espontânea narrativas polêmicas que digam respeito ao espectador. Não basta que existam conflitos; eles precisam provocar engajamento.

O consumo de bebida alcoólica, francamente estimulado nas inúmeras festas semanais, tem papel decisivo também em muitas brigas e confusões. Mas não explica tudo.

Normalmente formado por anônimos, o elenco deste ano contou, pela primeira vez, com nove participantes famosos, que se juntaram a outros nove desconhecidos. Ainda que tenha se esboçado um conflito entre os dois grupos, foi a união dos machistas, famosos e anônimos, que criou a primeira narrativa do programa.

Não se deve descartar que esse conflito tenha sido sonhado pela direção do BBB. No longo processo de seleção, os candidatos são exaustivamente sabatinados e precisam convencer que dispõem de "talentos" e "armas" para causarem confusão.

Nem sempre, porém, o que é planejado funciona. Em 2019, por exemplo, o elenco foi dividido em dois grupos muito distintos, um chamado de "cabeça", como definiu o apresentador Tiago Leifert, e outro que "prefere curtir a casa". No primeiro, havia quatro participantes negros, algo inédito, entre os quais um militante contra o racismo e uma lésbica.

Frustrando as expectativas, esse grupo "cabeça" adotou uma postura de não enfrentamento, buscando amortecer todos os potenciais conflitos. A vencedora foi justamente uma mulher questionada por comentários vistos como de cunho racista e de intolerância religiosa, contra a umbanda. Foi a mais baixa audiência da história do reality.

O BBB é um caso de enorme sucesso comercial. Apesar do fracasso da edição anterior, o programa começou neste ano com cinco patrocinadores de peso e inúmeras ações de merchandising. Contra todos os prognósticos, segue como um dos pilares da programação da Globo, ocupando um espaço nobre ao longo de três meses.

Ao aliar entretenimento de gosto duvidoso com questões em sintonia com o tempo, como o combate ao machismo, acaba dando um nó na cabeça de muita gente. É um fenômeno que merece atenção.

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