Mauricio Stycer

Jornalista e crítico de TV, autor de "Topa Tudo por Dinheiro". É mestre em sociologia pela USP.

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Lutando contra realidade, governo reclama do noticiário negativo na TV

O ministro das Comunicações, Fábio Faria, ainda há pouco tempo no cargo, terá de se habituar com o noticiário

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O ministro das Comunicações, Fábio Faria, fixou no alto de seu perfil no Twitter um vídeo anônimo que faz propaganda apologética do governo Bolsonaro junto com a mensagem “acredite no Brasil”.

Em tom heroico, a peça faz um paralelo entre o governo e atletas que superaram dificuldades na carreira. “Nos tornamos especialistas em não desistir”, diz o narrador.

A certa altura do lero-lero ufanista, surge uma crítica aos meios de comunicação. Diante de uma imagem borrada dos rostos de William Bonner e Renata Vasconcellos, na bancada do Jornal Nacional, o narrador diz “mas sabemos que notícia boa nunca será divulgada”.

Bolsonaro, seus ministros e apoiadores não são os primeiros a reclamar que a mídia não divulga notícias positivas, tendo preferência pelas ruins. Todo político que já ocupou cargo no Poder Executivo, em qualquer instância, padeceu de igual sofrimento em algum momento.

Nos dias de hoje, em plena pandemia, agravada com a crise econômica e o desemprego, ninguém em boa-fé deveria se surpreender com a ausência quase total de boas notícias no noticiário. Elas simplesmente são raras mesmo.

Uma “notícia boa” que o atual governo insiste em ver divulgada é o número de pessoas curadas da Covid-19. Num exagero que pareceu negacionismo, chegou a criar, em maio, um certo “placar da vida” para dar destaque aos recuperados da doença. Os telejornais das emissoras mais governistas, claro, atenderam à recomendação de valorizar o número.

Hoje já superior a 2,5 milhões, este número de curados, segundo muitos especialistas, não indica sucesso no combate à pandemia. Os motivos são vários —busca minimizar gravidade da doença; não é realista diante da subnotificação de casos e do baixo número de testes.

Há, ainda, uma questão ligada à natureza do ofício dos jornalistas. O que define notícia e interesse jornalístico, de uma maneira geral, é o novo, o inesperado, o surpreendente. E, com muita frequência, os fatos que atendem a esses critérios são negativos, tristes, trágicos.

Lutando contra essa tradição, em 1991, a Folha criou a seção Boa Notícia, que destacava diariamente uma notícia positiva na primeira página. Eu era editor do caderno Cotidiano nessa época e lembro a dificuldade que tínhamos para preencher essa cota diária. A iniciativa durou até 2006, foi retomada brevemente em 2010 e ressurgiu em 2017, rebatizada como Dias Melhores.

Em 2001, o portal iG criou o “Dia da Boa Notícia”. Seria um dia em que a homepage destacaria apenas notícias positivas, edificantes, para fazer o leitor sorrir. A data escolhida para implantar o projeto foi 11 de setembro de 2001.

Quando o primeiro avião se chocou com uma das torres gêmeas, em Nova York, um editor escondeu a informação num bloco de “más noticias”. Quando o segundo avião explodiu na segunda torre, a editora da homepage tomou a iniciativa de abandonar o “Dia da Boa Notícia” e pôr a informação no topo da página.

Contra a realidade, não há o que fazer. O ministro das Comunicações, ainda há pouco tempo no cargo, terá de se habituar com o noticiário.

*

Quando chamei “I May Destroy You” de a série do ano havia assistido aos primeiros cinco episódios. Após a publicação da coluna, cheguei a ficar receoso pensando se teria me precipitado.

Nesta segunda-feira, a HBO exibiu o décimo capítulo. Minha empolgação é ainda maior. Michaela Coel surpreende o espectador a todo momento, quebrando expectativas e contando uma
história visceral.

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