Mauricio Stycer

Jornalista e crítico de TV, autor de "Topa Tudo por Dinheiro". É mestre em sociologia pela USP.

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'Vendetta, A Guerra Antimáfia' mostra que ninguém é o que parece ser

Em série documental sobre combate ao crime organizado na Sicília, jornalista e juíza são antagonistas fascinantes

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"A Sicília é uma terra solar, mas também de trevas, de sombras", diz o advogado do jornalista Pino Maniaci em uma cena de "Vendetta, A Guerra Antimáfia", da Netflix. A imagem não é original, mas ilumina a maior qualidade desta série documental: ninguém é exatamente o que parece ser no embate contra o crime organizado.

O autodidata Maniaci é dono da Telejato, um minúsculo canal de notícias, instalado dentro da sua própria casa, na cidadezinha de Partinico. Baixo, magro e elétrico, com um bigode que atrai todas as atenções, o jornalista lembra um pouco o irredutível Asterix.

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O jornalista Pino Maniaci em imagem de divulgação da série documental 'Vendetta, a Guerra Antimáfia' - Divulgação

Paladino da justiça, a voz da verdade, ele denuncia as ligações de um prefeito com a máfia e aponta o dedo na cara de supostos criminosos. Quando os seus dois cães são mortos brutalmente, supostamente em represália ao trabalho de investigação jornalística que faz, ele se torna um herói em toda a Itália, atraindo solidariedade até do primeiro-ministro.

Maniaci é um tipo obviamente fascinante e complexo, se dão conta os diretores Ruggero Di Maggio e Davide Gambino, que não conseguem parar de focalizá-lo, tentando entendê-lo, ao longo de seis episódios.
A única pausa que fazem é quando deslocam a câmera para acompanhar Silvana Saguto, juíza em Palermo, que atua no setor de "medidas preventivas", aplicando uma legislação antimáfia rigorosa. Diante de suspeitas de atividade mafiosa, magistrados como ela podem determinar o confisco de bens e nomear interventores para os negócios.

Assim como o jornalista, a juíza é uma figura autocentrada e confiante. Ambos juram estar combatendo o bom combate. Mas o caminho é de pedras (e aqui vai um spoiler), fazendo com que Maniaci e Saguto se tornem antagonistas e enfrentem diferentes e graves acusações.

É quando a série ganha ares de "filme de tribunal" e passa a acompanhar em detalhes as ações judiciais. Os diretores não conseguem estabelecer uma relação de causa e efeito entre os dois dramas, mas sugere haver um fio entre eles.

A segurança que ambos demonstram ter talvez explique por que deram tanto acesso à equipe de filmagem. Maniaci e Saguto permitiram o registro de inúmeras situações de suas vidas privadas e, mais importante, os bastidores de seus julgamentos, incluindo as sessões em que os vereditos foram anunciados.

Como quase toda série sobre casos reais de crimes, "Vendetta" é mais longa do que o necessário. A história poderia muito bem ser contada em três ou quatro episódios, mas os serviços de streaming, de uma maneira geral, parecem estimular o oposto dos realizadores. Em busca de retenção e engajamento, as empresas utilizam o número de horas vistas como um indicador de sucesso. Adeus, concisão.

Uma outra novidade nesse gênero de "true crime" são os filmes de Mauricio Eça sobre o assassinato de Manfred e Marisia von Richthofen recém-lançados pelo Prime Video. O cineasta optou por registrar duas versões da história, uma com base no depoimento da filha Suzane e outra com a visão do seu então namorado, Daniel Cravinhos. Ambos foram condenados à mesma pena de 39 anos e seis meses de prisão.

Reproduzindo visões unilaterais, "A Menina que Matou os Pais" e "O Menino que Matou Meus Pais" não formam um conjunto, se somados. Ao optar por esse formato, Eça abriu mão de outras versões da história, bem como de detalhes que escapam aos depoimentos de Suzane e Daniel, além de não contemplar a investigação policial que concluiu pela autoria dos crimes. Para o fã do gênero, neste caso, menos não resultou em mais.

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