Mauricio Stycer

Jornalista e crítico de TV, autor de "Topa Tudo por Dinheiro". É mestre em sociologia pela USP.

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Netflix compete com a Globo com estratégia que não é para inglês ver

Em busca de cor local, gigante do streaming quer deixar abordagens superficiais para se comunicar com brasileiros

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Quando a Netflix anuncia algo, é sempre difícil distinguir se o alvo é o assinante ou o acionista. Culpa da pressão da concorrência, cada vez maior. O maior serviço de streaming do mundo luta para continuar na liderança do mercado e se esforça para atenuar as dúvidas sobre até onde é capaz de ir com o seu negócio arrojado.

Nesta semana, a empresa lançou a iniciativa Mais Brasil na Tela, informando que "investirá no desenvolvimento de 40 novas ideias para 2022" no país. O dado, a princípio, impressiona. Porém, como quase toda ação de relações públicas, é preciso olhar com atenção. Não dá para saber quantas dessas ideias vão, de fato, redundar em produções audiovisuais, nem quando serão produzidas.

Em todo caso, este novo projeto sinaliza uma mudança importante na estratégia de produção da empresa no Brasil, iniciada há cinco anos com o lançamento da série de ficção científica "3%". Nesse período, a Netflix apostou em duas dezenas de séries, alguns filmes e reality shows. Diferentemente do que ambicionava, poucos desses programas produziram impacto no Brasil ou em outros países.

A produção fora da matriz obedece a, pelo menos, quatro motivos. É uma sinalização de simpatia e respeito ao público dos mercados onde esses investimentos têm sido feitos. É também uma forma de a empresa se antecipar às discussões sobre regulamentação do streaming e cotas de produção nacional em vários centros.

De um modo geral, é mais barato produzir fora dos Estados Unidos, sobretudo em mercados emergentes. Ampliando os centros de produção, a Netflix, presente em 190 países, eleva numericamente as ofertas do seu catálogo também.

A questão essencial nesse processo é conseguir que uma série ou filme produzido num mercado consiga gerar interesse em outros países. Foi o caso, recentemente, de "Round 6", uma série sul-coreana que se tornou fenômeno de audiência em diferentes mercados onde a Netflix atua. "La Casa de Papel" (Espanha) e "The Crown" (Reino Unido) são outros dois exemplos de sucesso dessa estratégia.

Ao comunicar o que está por trás do projeto de Mais Brasil na Tela, a Netflix sugeriu um novo olhar sobre o mercado nacional. Não falou mais, como vinha fazendo, em levar uma visão do Brasil para o mundo, mas em "encontrar personagens e tramas com as quais (os brasileiros) consigam se identificar e ver a pluralidade do Brasil na tela".

Como afirmou Elisabetta Zenatti, vice-presidente de conteúdo da empresa para o Brasil, "os brasileiros querem mais histórias contadas por diferentes vozes, que reflitam suas vidas, suas raízes e sua ancestralidade". Ela disse ainda: "Por isso, nossa ambição será fazer cada vez mais histórias da gente para a gente, cujo sucesso estará em produzir a melhor versão, de forma que se conectem com mais audiências ao redor do Brasil".

"Coisa Mais Linda" e "Cidade Invisível" são bons exemplos da estratégia anterior da Netflix. Ambas tratam de temas brasileiros, muito interessantes, mas com abordagens superficiais e artificias, para inglês ver.

O novo discurso ("fazer cada vez mais histórias da gente para a gente") sugere que o alvo da empresa mudou. Agora interessa produzir conteúdo brasileiro para competir com os seus concorrentes dentro do Brasil, em especial, o Globoplay. O maior trunfo do serviço da Globo, justamente, é a sua facilidade de produção com cor local.

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