Mauricio Stycer

Jornalista e crítico de TV, autor de "Topa Tudo por Dinheiro". É mestre em sociologia pela USP.

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'Succession' fica mais cômica e escrachada em nova temporada

Enquanto série da HBO se tornou só um bom entretenimento, 'The Morning Show' melhora ao criticar hipocrisia da mídia

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Não revelo nenhum segredo dizendo que a razão maior que leva o espectador a se deliciar com "Succession", na HBO, é a oportunidade de acompanhar o cotidiano improvável de uma família de bilionários e o seu entorno de cônjuges e assessores. São todos detestáveis, cada um à sua maneira.

Exibidos cinco dos nove episódios da terceira temporada, o espectador mais fiel já entendeu que não resta esperança de redenção. Não fará nenhum sentido a virada positiva de algum deles até o fim da história.

Tragédias individuais ainda podem e devem ocorrer, mas sabemos que esta é uma história que sempre termina bem para o lado mais forte.

Caso você não faça ideia sobre o assunto, "Succession" se passa nos Estados Unidos e gira em torno do poderoso e influente Logan Roy, um empresário de 80 anos, dono de um conglomerado que inclui empresas de mídia, parques de diversões e cruzeiros marítimos. Os quatro filhos ambicionam ocupar o seu lugar ou ficar com nacos do império.

O sucesso da série de Jesse Armstrong reside muito neste pacto estabelecido com o espectador desde a primeira temporada: o criador oferece uma espécie de reality show sobre o dia a dia de seres desprezíveis e nós acreditamos que eles são assim mesmo. O efeito, no final das contas, é reconfortante. Não somos tão ricos, mas não somos tão ruins quanto eles.

Com um pé na tragédia ("Rei Lear") e outro no espírito de deboche da cultura pop, a série oferece diálogos da melhor qualidade, além de um elenco que entrega desempenhos de primeira, do patriarca Logan, vivido pelo escocês Brian Cox, aos filhos Kendall, interpretado por Jeremy Strong, Roman, papel de Kieran Culkin, e Siobhan, ou Shiv, vivida por Sarah Snook.

Muitos espectadores enxergaram na série a representação da família Murdoch, dona da Fox News. Também houve quem fizesse um paralelo com os Trump. Mas, a esta altura, está claro que a sátira de "Succession" foi em outra direção. Mais cômica, escrachada e fantasiosa a cada episódio, aparentemente abandonando a pretensão realista inicial, ela se tornou apenas um ótimo entretenimento.

Já "The Morning Show" se tornou mais interessante nesta segunda temporada —o último episódio vai ao ar nesta sexta-feira (19), no Apple TV+. Antes muito centrada num enredo inspirado no Me Too, o movimento de denúncia e combate ao assédio sexual em ambientes de trabalho, a série ampliou o seu campo de assuntos e críticas.

A história se passa num programa matinal, que mistura informação e entretenimento, numa grande rede de televisão. Disputas de poder em todas as instâncias, da bancada de apresentadoras à direção da emissora, são o recheio da história.

Mas o tema principal é o contraste entre a realidade de problemas estruturais (racismo, homofobia, assédio moral, preconceitos de toda ordem) e o esforço do canal para transmitir ao público uma imagem politicamente correta e de harmonia interna. Um mundo comandado por marketing e hipocrisia. Numa cena que simboliza este contraste, duas apresentadoras que se odeiam, vividas por Jennifer

Aniston e Julianna Margulies, dão uma aula prática, ao vivo, sobre como lavar as mãos (é o início da pandemia de Covid). De repente, elas começam a cantar uma música infantil. Parece um divertido improviso, mas a câmera mostra que elas estão seguindo um roteiro detalhado no teleprompter. Quando é que a televisão brasileira vai produzir uma série contundente sobre si mesma?

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