Mauricio Stycer

Jornalista e crítico de TV, autor de "Topa Tudo por Dinheiro". É mestre em sociologia pela USP.

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Bolsonaro e pandemia fecham 2021 deixando marcas graves na televisão

Com agressões a jornalistas e vozes negacionistas nos telejornais, é possível antever dias ainda piores em 2022

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"Esgrimindo com loucos e mentirosos", como bem caracterizou ainda em janeiro o apresentador do Jornal Nacional, William Bonner, o jornalismo de televisão enfrentou um 2021 especialmente
difícil, e saiu arranhado.

A pandemia de coronavírus, que já causou mais de 600 mil mortes no país, pôs profissionais e canais alinhados com o governo diante de um dilema: acatar o negacionismo oficial ou salvar a vida dos seus próprios espectadores?

Detalhe de ferimentos na mão de jornalistas dos veículos em imprensa cearenses O POVO e Sistema Verdes Mares, que sofreram agressões físicas e verbais enquanto trabalhavam na cobertura da festa de militantes do presidente Bolsonaro - Divulgação

A solução exigiu malabarismo.

A Record, mais aguerrido defensor de Jair Bolsonaro na TV, se pôs sempre em defesa da vacinação, ainda que frequentemente omitindo-se sobre os problemas causados pelos questionamentos do presidente sobre o assunto. Comportamento semelhante teve o SBT, sempre submisso em relação ao Palácio do Planalto, mas com cobertura correta sobre o enfrentamento da pandemia.

O mesmo não se pode dizer da RedeTV!. Em março, o canal exibiu uma longa reportagem exaltando o uso de um remédio contra piolhos, a ivermectina, como uma arma no combate da pandemia.

Em sua defesa, a emissora diz que há duas frases, perdidas em meio aos sete minutos da reportagem, que mencionam a falta de eficácia do medicamento contra a Covid-19.

Assim como a Jovem Pan, a RedeTV! abriu espaço para discussões sobre a eficácia de vacinas, dando microfone para negacionistas de diferentes matizes tratarem temas de caráter científico como questão de opinião.

O caso mais notório de propagação de fake news na televisão ocorreu na CNN Brasil. Em busca de polêmica, o canal de notícias manteve no ar, por mais de um ano, o comentarista Alexandre Garcia, um defensor de tratamentos ineficazes contra a Covid-19.

Em mais de uma ocasião, âncoras do canal foram convocados a desmentir Garcia após os seus comentários. No final de setembro, a CNN rescindiu o contrato com ele. Tratando mentiras como se fossem fatos, Bolsonaro criticou: "Um famoso jornalista foi demitido por sua opinião. Não tem coisa mais absurda do que isso?".

Em novembro, Garcia foi contratado pela Jovem Pan e, no seu primeiro dia, voltou a questionar a eficácia das vacinas: "Todo mundo sabe que a vacina está numa fase de início. A gente não sabe ainda os resultados quanto à eficácia e quanto à segurança".

Ofensas, ameaças e até agressões a jornalistas foram comuns em 2021. Mesmo o aliado SBT viu, em duas ocasiões, profissionais de uma afiliada serem alvo de hostilidades. "Você não tem o que perguntar, não? Deixa de ser idiota, pô", disse o presidente a uma repórter da TV Aratu, em abril.

Em dezembro, outra profissional do canal foi agredida por seguranças e apoiadores do presidente. O SBT não condenou nenhum dos dois ataques.

Exausto com a postura do presidente, o Jornal Nacional, em outubro, acusou Bolsonaro de buscar "desacreditar vacinas e de desestimular a vacinação" no Brasil e, dando nomes às coisas, classificou a fala em que ele associou vacinas contra Covid a Aids como "falsa e absurda". No fim deste mesmo mês a Globo criticou a "postura beligerante" do presidente e, em dezembro, após o caso na Bahia, disse que a Presidência deveria ser responsabilizada ou "por omissão" ou por "fomentar a violência contra jornalistas".

Esta breve retrospectiva de 2021 permite antever dias ainda mais complicados em 2022, ano de eleições presidenciais. Um exemplo do que vem pela frente foi a demora para dar tratamento jornalístico digno à viagem do ex-presidente Lula à Europa, em novembro. O assunto só entrou na pauta após protestos de espectadores nas redes sociais.

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