Mauricio Stycer

Jornalista e crítico de TV, autor de "Topa Tudo por Dinheiro". É mestre em sociologia pela USP.

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Nem 'Anatomia de um Escândalo' ou 'A Idade Dourada' valem a pena

Americanos ricos do século 19 e elite inglesa atual são retratadas em séries pouco originais no streaming

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Não é todo dia que o espectador tem à disposição, ao mesmo tempo, em dois dos maiores streamings, uma superprodução sobre americanos desenvolvida por um inglês e outra sobre ingleses produzida por um americano.

"A Idade Dourada", disponível no HBO Max, e "Anatomia de um Escândalo", na Netflix, são programas que falam não apenas sobre as criaturas que ocupam a tela, mas também, e bastante, sobre seus criadores.
A mais interessante é a primeira. Leva a assinatura de Julian Fellowes, autor do roteiro do filme "Assassinato em Gosford Park" (2001), de Robert Altman, e criador da muito bem-sucedida "Downton Abbey", série exibida entre 2010 e 2015.

Cena da primeira temporada da série 'A Idade Dourada' da HBO - Divulgação/HBO

Ambientada entre as décadas de 1910 e 1920, "Downton Abbey" gira em torno do cotidiano de uma família da nobreza britânica, impactada pela realidade política da Grã-Bretanha durante a Primeira Guerra e a permanência de uma série de ritos sociais que começam a soar anacrônicos.

A série explora, com muito jeito, os contrastes entre a realidade dos patrões e a de dezenas de empregados. Fisicamente separados entre o andar de cima e o andar de baixo, eles vivem uma luta de classes peculiar, que oscila entre momentos dramáticos e de humor.

"A Idade Dourada" repete esta mesma estrutura, mas para falar do conflito entre famílias tradicionais e novos ricos em Nova York, na década de 1880.

Os nove episódios da primeira temporada são centrados na luta dos Russell, obcecados em serem aceitos no ambiente da alta sociedade regida por famílias como os Astor, que menosprezam o dinheiro novo.
O olhar generoso e até carinhoso que Fellowes dedica aos nobre britânicos em "Downton Abbey" não encontra correspondente no retrato dos americanos de "A Idade Dourada".

Tanto os velhos ricos quanto os arrivistas são gente horrorosa, arrogante e má. Há pouca ou nenhuma camaradagem entre os empregados. Quase não há humor na série, salvo no retrato exagerado de uma rica rabugenta, Agnes van Rhijn, vivida por Christine Baranski, e sua bondosa irmã, Ada Brook, papel de Cynthia Nixon.

Mas o pior mesmo é a sensação de que Fellowes, sem inspiração, só pegou a forma que serve de base a "Downton Abbey", colocou novos ingredientes e criou "A Idade Dourada".

A distância entre intenção e resultado é ainda maior em "Anatomia de um Escândalo". Como outras duas criações recentes de David E. Kelley, as elogiadas "The Undoing" e "Big Little Lies", a nova série também trata de abuso e violência sexual, agora não entre milionários americanos, mas entre figuras da elite inglesa.

James Whitehouse, um parlamentar britânico, muito próximo ao primeiro-ministro, é acusado de estuprar uma funcionária do seu gabinete, ao término de um relacionamento extraconjugal.

Ao longo de seis episódios seguimos o julgamento do caso e o impacto que tem sobre a mulher de Whitehouse, Sophie, vivida por Sienna Miller, e a implacável promotora, Kate Woodcroft, papel de Michelle Dockery —uma das atrizes principais de "Downton Abbey".

É uma série com interpretações exageradas, recursos visuais de extremo mau gosto e diálogos caricaturais, tudo involuntariamente engraçadíssimo, como muito bem apontou uma crítica da BBC. "São pessoas muito inglesas fazendo coisas que as pessoas americanas pensam que pessoas muito inglesas fazem —homens andando por aí com chapéus-coco e gravatas-borboleta, bebendo enormes quantidades de uísque nos escritórios e desejando aos colegas um fim de semana 'glorioso'."

Minha sugestão é: mantenha distância. Aproveito para avisar que faço uma pausa em maio e retorno com a coluna em junho.

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