Michael França

Ciclista, doutor em teoria econômica pela Universidade de São Paulo; foi pesquisador visitante na Universidade Columbia e é pesquisador do Insper.

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Descrição de chapéu enem Fies universidade

Filho do porteiro termina universidade, mas não alcança o filho do rico

Educação não é suficiente para equalizar as oportunidades

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Até o início dos anos 2000, cursar universidade no Brasil era algo distante da realidade da maioria da população. Contudo, apesar da reação negativa de alguns setores da sociedade brasileira, esse quadro mudou com a escolha pela democratização do acesso ao ensino superior.

Milhares de jovens, que estavam abandonados à própria sorte e sem perspectivas em relação ao futuro, começaram a enxergar na educação um meio de ascender socialmente.

Atualmente, é comum ouvirmos diversos relatos daqueles que nasceram em ambientes desestruturados e enfrentaram as mais variadas adversidades para se tornarem os primeiros representantes de suas famílias que conseguiram ir além do ensino básico ou médio.

Muitos tinham a crença de que terminar a graduação seria suficiente para conseguir vencer na vida. Entretanto, essa ilusão rapidamente se dissolve quando eles começam a encarar os primeiros desafios no mercado de trabalho.

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Estudantes chegam para o primeiro dia da prova do Enem em campus em São Paulo - Adriano Vizoni/Folhapress

Um engano comum é cursar universidades privadas de baixa qualidade ou cursos com pouca demanda do mercado. Com o diploma na mão, muitos jovens de baixa renda se sentem frustrados de terem dado tudo de si e, no final, estarem desempregados ou em ocupações mal remuneradas.

Mesmo aqueles que saem das melhores universidades e de cursos mais requisitados no país tendem a ter algumas dificuldades. Diferentemente de seus colegas de alta renda, os desfavorecidos costumam trilhar seus caminhos por conta própria.

A ausência de modelos sociais não afeta só a construção de suas trajetórias, mas uma boa rede de contatos pode representar uma fonte de apoio e aprendizado para lidar com as mais variadas demandas e como suporte para enfrentar os desafios que surgem na carreira.

Os contatos também tendem a ser um relevante meio pelo qual jovens de alta renda conseguem se inserir mais bem posicionados no mercado de trabalho. Além disso, em muitos casos, esses jovens conseguem assumir maiores riscos.

Na procura por emprego, eles têm a oportunidade de esperar mais tempo e, assim, aceitar as melhores ofertas. No caso dos desfavorecidos, as dificuldades financeiras geram uma pressão para aceitar qualquer emprego e a ausência de referências pode contribuir para que eles aceitem salários mais baixos.

A origem social também possui o potencial de afetar a dinâmica das interações humanas dentro das empresas. Jovens de alta renda tendem a possuir uma base cultural relativamente mais próxima da dos seus diretores e gestores, e isso pode facilitar a criação de conexões mais profundas e, consequentemente, se refletir no crescimento posterior na organização.

Adicionalmente, ter boa formação em todas as etapas escolares, algo que deveria ser uma possibilidade real para toda população em qualquer país que deseja um dia se desenvolver, ainda é algo reservado somente para uma pequena parcela da sociedade brasileira.

Nesse contexto, ainda se tem o agravante de que o ensino superior não é suficiente para fechar toda a lacuna nas competências adquiridas no decorrer da vida entre as diferentes classes sociais. Aqueles que têm pais com maior nível de escolaridade e renda tenderão a desenvolver um conjunto de habilidades mais amplo ao longo da vida e isso se refletirá em oportunidades distintas na carreira.

Mesmo que o filho de um porteiro consiga deixar muitos filhos da elite para trás no mercado de trabalho, deve-se lembrar que os últimos herdaram um patrimônio que, em diversos casos, os descendentes do porteiro levarão gerações para atingir.

O texto é uma homenagem à música "Keep Movin’On", composta e interpretada por Sam Cooke.

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