Mirian Goldenberg

Antropóloga e professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro, é autora de "A Invenção de uma Bela Velhice"

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Mirian Goldenberg

Fadiga de ser brasileiro

Como tantos brasileiros podem ignorar as recomendações da ciência, sabendo que as mortes estão crescendo?

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Não é de hoje que os brasileiros estão exaustos em função da violência brutal, do ódio, do desgoverno, da corrupção, do desemprego, da miséria e das sucessivas crises do país. Não é à toa que somos os maiores consumidores, em todo o mundo, de ansiolíticos, antidepressivos e remédios para dormir.

Há muitos anos tenho escutado mulheres que estão doentes por não ter tempo para cuidar de si, como uma professora de 45 anos:

“Às vezes me tranco no banheiro por cinco minutos para respirar e não ter um ataque de pânico. Mas logo alguém grita: ‘Amor, lavou minha cueca?’; ‘Mãe, fez batata frita?’. Quando digo 'não' sou agredida: ‘Nossa, o que custa? Não faz mais do que sua obrigação de mãe e esposa’. A vida das brasileiras é um inferno. Cuidamos de todo mundo e ninguém cuida de nós. Trabalhamos 24 horas por dia e não temos o mínimo reconhecimento pelo sacrifício que fazemos. Somos invisíveis”.

Essa cruel realidade ficou ainda pior na pandemia. Por isso, quando li sobre a chamada “fadiga da quarentena” logo pensei em milhões de brasileiras que não conseguem dormir nem comer direito, que estão deprimidas, desesperadas e exaustas.

Usando como desculpa a “fadiga da quarentena” muitos brasileiros ignoram os protocolos de segurança: vão a festas, bares, restaurantes, praias, eventos lotados, aglomerações sem usar máscara.

Eles dizem que não aguentam mais o distanciamento social, que têm o direito de levar uma vida normal já que não são do grupo de risco, que se sentem prisioneiros dentro de casa apesar de terem celular e internet para se conectar com o mundo.

Não consigo compreender como tantos brasileiros podem ser tão egoístas, perversos e irresponsáveis, e ainda se vangloriarem de contrariar as recomendações científicas. “E daí? Todos vão morrer, mais cedo ou mais tarde. Enche o saco usar máscara. Eu não sou maricas nem cagão, tá ok?”.

Que tipo de ser humano está se divertindo em vez de ajudar, cuidar e proteger a vida da sua mãe, do seu pai, irmãos e avós? Como pode se preocupar apenas com o próprio umbigo e dar risadas no meio dessa tragédia? Não se envergonha de atrapalhar tanto, prejudicar a saúde da família e tornar esse pesadelo ainda pior? Não se sente culpado por colocar em risco a vida de amigos e amores? Não se comove com o sofrimento e extermínio de milhões de brasileiros?

LINK PRESENTE: Gostou desta coluna? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.