Mônica Bergamo

Mônica Bergamo é jornalista e colunista.

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Mônica Bergamo

'Sou humanista, de esquerda', diz ator Alexandre Borges

Ali ninguém está fazendo mal a ninguém, disse ele sobre vídeo em que aparece com travesti

Alexandre Borges fuma um cigarro quando é abordado por três mulheres que pedem para tirar uma foto com ele em uma tarde de quarta, no centro de São Paulo. Sorridente, ele deixa-se abraçar, posa para o registro e agradece pelo carinho.

 

“Gosto de estar envolvido com as pessoas”, afirma o ator nascido em Santos e que hoje vive na Bela Vista. “Isso te dá um senso do que é a realidade. E também não deixa uma relação distante, do cara que está na televisão.” 

 

“Às vezes a pessoa tem medo de chegar perto de um artista e não ser bem recebida. Mas aquele pode ser um momento inesquecível para ela. Como foi para mim a primeira vez que eu vi o Tarcísio Meira. É muito gostoso.” 

 

Longe das novelas desde 2016, quando atuou em “Haja Coração”, da Globo, Alexandre estreia na sexta (16) a temporada paulistana do espetáculo “Palhaços”, no Centro Cultural Banco do Brasil. É a sua terceira peça como diretor desde que ele “meteu as caras” na função, em 2014.

 

Com o ex-Trapalhões Dedé Santana no elenco, “Palhaços” conta a história de um bufão que se encontra com um espectador em seu camarim. Os dois começam a refletir sobre a vida. 

 

“Ele [Dedé] faz quase  um anti-palhaço. Ele está no camarim, com todas as suas angústias, solidão...”, explica Alexandre. “Da peça, o que mais me interessa é essa desmistificação do artista. Essa coisa de que o palhaço também tem dor de dente, dor de barriga, problemas com a mulher, contas para pagar... Sair do glamour e da fantasia e ir para uma vida que é trabalho, que é luta. Um ofício, como um outro qualquer.”

 

“Dirigir está sendo uma coisa que me dá muito prazer”, conta Alexandre ao repórter Bruno B. Soraggi. “Como ator você faz mais perguntas. Como diretor você tem que saber algumas respostas [risos]”, diz.

 

“Mas se eu tenho algum valor como diretor, vem muito por eu ser ator”, diz. “As coisas são paralelas, mas atuar é o que eu curto. O que eu amo fazer. É a minha vida.”

 

Filho único de um diretor de teatro e de uma bailarina, Alexandre Borges Corrêa quis ser ator desde criança, quando acompanhava o pai a peças e, já na casa em que vivia com a mãe, separada, assistia à TV se “amarrando nas coisas dos atores”. 

 

Aos 18, ele se mudou para São Paulo, onde trabalhou com os diretores Antunes Filho, Ulysses Cruz e Zé Celso. “Foram polos muito importantes. A disciplina do Antunes e do Ulysses, esse gosto pela pesquisa, e a espontaneidade do Zé, essa coisa dele do aqui e agora”, lembra. “Com o Zé eu aprendi a ter cara de pau [risos].” 

 

Com 20 anos, Alexandre foi pela primeira vez a Portugal com a companhia teatral Boi Voador. Voltou para lá aos 23, quando ganhou de um amigo a obra “Poesia Completa de Álvaro de Campos”, de Fernando Pessoa. 

 

“Foi um livro muito importante na minha vida. Eu li em um ônibus indo para Lisboa. Ele fala muito da inconstância, da morte, da solidão, do inusitado das coisas, o efêmero. E fui entendendo coisas da minha vida. Foi uma coisa terapêutica”, conta. 

 

Hoje, ele lê alguns daqueles textos no espetáculo “Poema Bar”, sarau em que o ator recita poesias de Fernando Pessoa e de Vinicius de Moraes. “Não é uma coisa que eu faço para ganhar dinheiro. Foi um presente que eu quis me dar”, diz sobre o espetáculo, que estreou em Lisboa em 2011.

 

Alexandre é casado com a fotógrafa portuguesa Tatiana Coelho e é pai de Miguel, 18, fruto da união de 22 anos com a atriz Julia Lemmertz, encerrada em 2015.

 

Discreto sobre sua vida pessoal, o ator não possui redes sociais. “Já troco muito no meu dia a dia. Acordo, vou tomar um café na padaria, alguém me vê e tira uma foto, vou ao cinema, alguém vem falar comigo... Já tenho essa interação real, não virtual.” 

 

“Se eu ainda tivesse alguma coisa para alimentar com fotos, opiniões, seria demais. Nada contra. Só acho que para mim seria excessivo.”

 

Sobre política, ele afirma não fazer questão de se posicionar. “Tenho as minhas opiniões, mas não necessariamente eu preciso ser uma coisa para seguidores, que me tenham como referência.”

 

“Sou um cara humanista, de esquerda, vamos dizer assim, que acredita que cada um tem o direito de fazer o que quiser da vida. Respeito o espaço de cada um como quero que respeitem o meu.” 

 

“Não vejo porque ter essa obrigação de o artista ter uma opinião sobre a vida, sobre política, sobre faça isso, não faça aquilo. Nunca tive isso, não declaro voto... Sou um ser humano, um cidadão. Como outro qualquer”, diz. “No fundo, sou apenas um ator.”

 

Ele respira fundo e reflete quando o assunto é o vídeo que vazou na internet em 2016, no qual aparece acompanhado de um travesti. “Não entendi muito bem uma coisa assim ser um escândalo, vamos dizer assim. Era uma coisa de pessoas tomando uma cerveja. Eu estava me divertindo, me descontraindo, uma coisa supernatural. Nada pesado.” 

 

“Ali ninguém está fazendo mal a ninguém. Não tem desrespeito. Foi chegando gente, de repente tocou uma música, uma menina começou a dançar e gravaram”, diz. “Não me preocupei em saber que gênero era, que raça era, que partido era... Não tem isso”, emenda. 

 

“Lido com pessoas de todos os tipos. O que me interessa é o bem estar. É eu não criar um conflito, uma coisa que me deixe arrogante.” 

 

“Não me privo de nada. Vivo a minha vida normalmente”, afirma o ator, que diz se inspirar em muitas pessoas, mas não querer ser nenhuma delas. “Quero descobrir o que eu tenho de autêntico, o que é meu. Para o bem e para o mal.”

 

“Vou me esforçar, ensaiar. E estar pronto para essa comunhão com o público. O que vai vir disso, a gente não sabe. Então, que seja sempre estimulante essa curiosidade. Esse fracasso, esse sucesso”, diz. “É um mistério. Quero participar desse mistério.”

 

“O tempo não passa. A gente que passa, né? [risos] Li isso em algum lugar e achei interessante. É isso, acho que tem que aproveitar ao máximo cada momento.”

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.