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Comissão inocenta juíza no caso de advogada negra algemada

Desembargador afirma que versão da advogada 'está em colisão com todo o restante da prova'

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São Paulo

A comissão judiciária que investigou o caso da advogada Valéria Lucia dos Santos, algemada por PMs durante audiência judicial em Duque de Caxias, no Rio de Janeiro, concluiu que ela "se jogou no chão" e começou a se debater, sendo "momentaneamente" algemada para a sua própria segurança.

A juíza leiga Ethel Tavares de Vasconcelos, que teria chamado a polícia para que retirasse Valéria Lucia da sala de audiência, foi inocentada da prática de qualquer abuso. O juiz leigo é um advogado que auxilia a Justiça em alguns juizados especiais, mas a decisão final é de um juiz togado.

Para a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), a investigação é um procedimento interno e administrativo do tribunal, sem valor judicial, em que as partes foram ouvidas separadamente. Em nota, a entidade disse que a conclusão da comissão causa "espécie e estupefação". 

Procurada após a decisão, a advogada disse que a OAB está à frente do caso e que é preciso aguardar. "Estou muito tranquila sobre o que aconteceu naquele dia. Vamos aguardar. Se for preciso, vou recorrer até aos órgãos internacionais, como a ONU. Tive o direito da pessoa humana ferido naquela audiência", disse ao UOL. A advogada afirmou ainda que a sua "imagem foi desgastada". "A intenção é jamais permitir que isso aconteça de novo".

Em depoimento anterior, logo depois do caso, Valéria afirmou à Folha que foi derrubada e arrastada pelos policiais. "Quando chegou do lado de fora da sala, me deram uma rasteira e eu caí sentada. Depois colocaram as algemas", disse. Valéria e a juíza leiga discutiram porque a advogada exigia ter acesso à peça da defesa. 

Com a repercussão do caso, a audiência foi anulada e remarcada para 18 de setembro, com a presença de um juiz togado. A decisão final foi favorável à autora, a cliente de Valéria. 

Na conclusão da comissão judiciária, o desembargador Joaquim Domingos de Almeida Neto, do Tribunal de Justiça do Rio, afirma: "Não vislumbro prática de qualquer desvio funcional dos servidores envolvidos e da advogada juíza leiga Ethel Tavares de Vasconcelos".

Ele afirma também que a "versão da advogada Valéria Lucia dos Santos de que 'levou uma rasteira, uma banda, suas mãos colocadas para trás e algemada' está em colisão com todo o restante da prova que afirma que ela se jogou no chão e se debatia quando veio a ser momentaneamente algemada, até que o representante da OAB chegou e ela se acalmou, havendo pronta retirada das algemas".

O magistrado diz ainda que a "imagem forte" de Valéria no chão algemada "correu o mundo virtual, mas à qual não se pode emprestar maior significado do que o que realmente teve. A própria versão da 'rasteira' não se amolda à imagem registrada em vídeo, e por isso deve ser descartada".

Já para o presidente da Comissão Estadual de Defesa de Prerrogativas da OAB, Luciano Bandeira, a conclusão da comissão "não muda nada, é um processo unilateral". "Nós não sabemos quem são as testemunhas, sequer estávamos presentes quando a juíza leiga e testemunhas apresentaram suas versões”, afirma.

Para ele, não é possível dizer que a juíza leiga foi inocentada. “Não tem isso de inocentar. Pode ser que administrativamente o tribunal não vá fazer nada, mas por parte da OAB isso continuará sendo apurado”.

A Ordem vai prosseguir com a investigação interna no seu Tribunal de Ética e Disciplina e já entrou com representação contra os policiais na corregedoria da corporação. A apuração na OAB está na fase inicial, em que a juíza leiga apresenta a sua manifestação. “Se ficar caracterizado que houve uma infração da juíza leiga, vamos entrar com representação no TJ-RJ, no CNJ, além de processos civis e criminais na Justiça”, disse Bandeira.

Ele reafirmou que a advogada não poderia ser algemada e que seria preciso comunicar o ato a um delegado da OAB. “Mesmo que a Valéria estivesse errada, e eu acho que ela está certa, não justifica. Estão tentando desviar do fato: uma mulher, advogada, negra, foi algemada dentro da sala de audiência”.

Logo depois do episódio, a entidade afirmou que "nem na época da ditadura se prendia, algemava e jogava no chão um advogado dentro da sala de audiência. É um absoluto desrespeito ao Estado democrático de direito e à advocacia. Isso causa muita preocupação".

A comissão dos juizados especiais ouviu a advogada, a juíza, os policiais, estagiários e funcionários do 3º Juizado Especial Cível de Duque de Caxias e defensores que também presenciaram a cena.

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