Mônica Bergamo

Mônica Bergamo é jornalista e colunista.

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'A vida vai ter que continuar, e temos que estar preparados', diz o ator Marcelo Serrado

Ator diz que seus filhos acham engraçado vê-lo de Crô na TV e que tem feito videoconferências para falar sobre a vida

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Todas as quartas-feiras desde o início da quarentena o ator Marcelo Serrado tem se reunido com amigos em videoconferências para conversar sobre a vida.

“É um momento de pensar e poder melhorar”, afirma o carioca de 53 anos sobre o período em que o mundo passa pela pandemia de Covid-19.

“Eu vejo [a situação contemporânea] e penso: ‘Cara, isso é um filme que tá passando. Não pode ser [realidade].”

Ele compara o momento atual ao livro “Admirável Mundo Novo”, de Aldous Huxley. “Fala de um mundo apocalíptico. Estamos vivendo essas coisas”, diz Serrado.

“A gente vai passar por isso. Mas acho que tem que evoluir. Algumas pessoas vão continuar a ser egoístas. Mas outras vão repensar alguns valores. A humanidade já teve outras grandes crises. Temos que aproveitar isso para melhorar como espécie.”

O ator adotou o isolamento social desde que autoridades passaram a recomendar a prática como prevenção contra o novo coronavírus. “Estou deixando de ver a minha mãe, que fez 84 anos [no fim de abril]. Não estive com ela, respeitando [a quarentena].”

“É tão absurdo as pessoas que podem ficar em casa e não respeitam isso. Porque você não está respeitando só você, mas [também] as pessoas que estão ao seu lado. Quando a gente vê essas coisas, essas festas, esses movimentos, você pensa: ‘Em que mundo que essas pessoas vivem?’”

“Eu estou fazendo o meu papel como cidadão. Cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é, mas acho que é o momento de a gente pensar em uma união maior”, defende.

A pandemia fez com que Serrado visse adiados trabalhos para os quais estava se preparando, como o musical “O Jovem Frankenstein” e uma novela da Globo sobre a qual ele mantém sigilo. “No ano passado eu fiz três filmes. Esse ano, nada. Tudo o que eu estava me programando pra fazer, de trabalho, cinema, novela, teatro, está parado.”

No início do isolamento social, Serrado diz ter se proposto a manter a rotina rigorosa de malhação e alimentação que vinha adotando para o novo papel no futuro folhetim. “Falei: ‘Vou continuar fazendo isso em casa’.”

“Na primeira semana, ok. Na segunda semana, ok. Já na terceira você começa a... São dias de altos e baixos. Oscila muito, né? É bem difícil”, conta ele, que atualmente está recluso em sua casa no Rio com a sua mulher, Roberta Fernandes, e os filhos gêmeos de sete anos de idade.

Serrado está no ar pela TV Globo na reprise da novela “Fina Estampa”, de 2011, na qual ele interpreta o mordomo Crô. “Ele é o elemento de leveza [da trama]. Tenho tido grandes alegrias [ao assistir novamente ao personagem], estou muito impressionado com essa volta dele e como as pessoas amam ele até hoje”, diz.

“Meus filhos não viram a novela. Não tinham nem nascido. Agora eles veem e ficam ‘olha o papai!’. Acham engraçado”, conta. “Eu talvez hoje fizesse diferente algumas coisas [do Crô]. Não sei como, no contexto atual, faria ele. É um outro tempo, né? Outra realidade. Mas ele é meio atemporal. Desperta alegria nas pessoas, nas crianças também.”

“Lembro que eu estava fazendo uma novela [‘Velho Chico’], dois anos depois [de ‘Fina Estampa’], gravando no sertão. Passou um senhor de charrete, e eu suado, de bigode [por causa do personagem], saindo de cena. Ele: ‘Olha quem tá ali! O Crô de bigode! [risos].”

Serrado tem buscado otimizar o uso do seu tempo em isolamento para manter a boa saúde mental (“tenho feito ioga”) e se manter afiado. “Estou fazendo a minha aula de voz, canto, por Skype. E faço o meu espanhol toda semana”, diz ele, que quer investir em produções audiovisuais na língua. “Tem que aproveitar o tempo.”

“Mas são as famosas bolhas”, segue ele, mudando o raciocínio. “Outro dia a gente estava num debate [com os amigos, por meio do aplicativo Zoom] falando sobre isso”, lembra.

“A gente vive numa bolha, né? Somos privilegiados. Como você chega para um cara que mora numa favela, numa kitnet com 12 pessoas, e pede pra ficar em casa? Então a gente tem que saber o limite de cada um. Com tudo o que está acontecendo agora, me vem à cabeça, como cidadão, que essa desigualdade social tem que ser diminuída.”

Lidar com a convivência intensa e diária com as mesmas pessoas em um ambiente restrito também tem sido uma descoberta para o ator. “É difícil. Normalmente você sai de casa, vai trabalhar e não está com aquela pessoa o tempo inteiro, com os seus filhos.”

“[Agora] às vezes o menino está estressado, você também está, a sua mulher também está…”, segue. “Vai para outro lugar, respira, calma”, diz. “A gente acha outras maneiras de conviver e de se relacionar, de usar o espaço.”

Mas o confinamento também traz “momentos que eu não teria”, reconhece ele. “Outro dia eu estava olhando o pôr do sol com o meu filho, comentando sobre as cores que ele tem”, lembra o carioca, que também tem buscado “melhorar como pai”.

Paternidade, inclusive, é o tema de uma peça que ele começou a escrever no início da pandemia. “Não vou falar o título porque vai que alguém rouba”, brinca. “[O trabalho] fala um pouco sobre mim, pai de gêmeos e de uma menina de 15 anos [que vive em São Paulo]. Eu falo da pandemia, mas não tem nada relacionado a isso. É mais no passado.”

Marcelo atualmente prefere não falar publicamente sobre política. “Há artistas que não se posicionam e os que se posicionam. Quem se posiciona vai tomar pau. Eu me posicionei lá atrás, de uma maneira, e no final das eleições [de 2018] eu fiz aquela campanha linda de vira-voto pelo [petista Fernando] Haddad”, lembra.

Segundo o ator, Haddad se tornou próximo dele. “É uma figura muito emblemática. Eu estava fazendo um filme em São Paulo e ele foi lá me visitar. Tenho grandes divergências em relação ao partido dele, mas viramos grandes amigos.”

Em 2014, Serrado apoiou Aécio Neves (PSDB). Em 2016, o ator foi a uma manifestação pelo impeachment da também petista Dilma Rousseff. Ao lado de outros globais como Márcio Garcia e Suzana Vieira, ele trajava uma camiseta com a estampa “#Morobloco”, celebrando o então juiz Sergio Moro —a quem o ator deu vida depois, no filme “Polícia Federal - A Lei É para Todos”. Ele até hoje se vê atacado pelo seu posicionamento na época.

“Imagina quantas pessoas que estiveram naquela passeata já mudaram de opinião? Mas que não são famosas e não têm uma voz pública? De certa maneira, eu mudei de opinião lá atrás”, argumenta ele, que afirma sempre ter votado em Marina Silva.

“Esse fla-flu de você é de esquerda ou de direita, esse radicalismo, para mim, beira o fascismo, que é tanto de um lado quanto do outro. Não é um assunto que me interessa mais. Procuro tocar a minha vida e ser político no meu trabalho”, diz Serrado.

Ele critica a gestão da atriz Regina Duarte frente à Secretaria Especial da Cultura do governo federal. “Eu tinha esperança de que,​ pela trajetória profissional, como uma atriz consagrada, ela criaria um diálogo com a classe artística. Nesse sentido, nada avançou”, afirma.

Sobre o futuro, Serrado se diz na expectativa do que vai acontecer. “Se você passar o dia vendo Globonews e CNN, enlouquece. É só pandemia. Tá todo mundo esperando alguém falar: ‘Achei a cura’”, afirma.

“[Nós, atores] queremos voltar a ser abraçados e a abraçar as pessoas. Acho que vai ter um momento muito grande de o público querer voltar a ir ao teatro. As pessoas vão querer se divertir quando tudo voltar ao normal”, diz.

"Agora o povo não vai querer ir e ficar todo junto em um teatro. Mas em algum momento, vai.”

“A gente tem que tirar um lado bom disso tudo. Eu também estou fazendo isso”, afirma Serrado. “A vida vai ter que continuar. E a gente tem que estar preparado.”

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