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Descrição de chapéu Coronavírus

Estados vão ao STF contra fila única para UTIs de Covid-19

As 27 unidades da federação pedem que tribunal rejeite pedido do PSOL para que o SUS administre leitos públicos e privados

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Os 26 estados brasileiros e o Distrito Federal apresentaram ao STF (Supremo Tribunal Federal) um pedido de impugnação à ação em que o PSOL pede a adoção de uma fila única de leitos de UTI, administrada pelo SUS, para atendimento de pacientes da Covid-19.

O avanço da pandemia no Brasil intensificou a pressão sobre o sistema público de saúde, chegando à lotação máxima em alguns estados. Já em hospitais privados, muitas vezes sobram leitos.

A discussão sobre a fila única, que já existe no caso de transplantes, surgiu nesse contexto.

Os estados pedem ao ministro Ricardo Lewandowski, que relata a ação do PSOL, que rejeite os argumentos do partido. Ele já havia negado o pedido da legenda, que recorreu.

Os procuradores gerais, que assinam o documento enviado ao STF, dizem que "cada estado verificar a melhor saída para o combate da crise de saúde, considerada a realidade local", diz o pedido dos estados. Eles afirmam ainda que, "caso a solução passe pelas requisições administrativas", não é necessária uma nova regra pois já há "expressa previsão legal" para isso.

"Enfim, é notório o quadro de ação efetiva dos Estados no combate da pandemia, não havendo se falar em omissão. Não pode o PSOL pretender que a única solução possível para a resolução dessa grave crise da saúde pública se limite à requisição administrativa compulsória, geral e abrangente de leitos de UTI. Mais uma vez, há que se respeitar a autonomia política dos Estados e sua habilidade para tomada das ações que melhor reflitam cada realidade respectiva", diz o texto.

Os estados afirmam ainda que a ação do PSOL "é realmente inviável do ponto de vista processual ou material, por não haver omissão inconstitucional e, muito menos, por sugerir uma solução genérica que não necessariamente se aplica indistintamente à União, Estados e Municípios brasileiros".

"Novamente, veja-se os dados oficiais para se ter conta da disparidade das realidades vivenciadas por cada Estado: enquanto Amazonas, Maranhão e Rio de Janeiro possuem situação crítica de ocupação de leitos de UTI (taxa acima de 90%), há Estados como Mato Grosso do Sul, Tocantins e Santa Catarina em patamar abaixo dos 20% de ocupação. Outra grande quantidade de Estados, como Paraná, Sergipe e Alagoas ainda têm mais da metade da capacide de leitos disponíveis", seguem os procuradores.

Leia a íntegra do pedido de impugnação:

EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI DO COLENDO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

ADPF 671

OS ESTADOS DA FEDERAÇÃO EO DISTRITO FEDERAL, por seus Procuradores ao final assinados, nos autos do Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental em destaque, vêm, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência para, em atenção ao despacho publicado em 06.05.2020 e com fulcro no art. 1.021, § 2o do Código de Processo Civil, apresentar impugnação ao agravo interno interposto pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), assim o fazendo pelas razões a seguir expostas:

I. DA LIDE

O PSOL ajuizou a presente arguição com a finalidade de ver declarada, segundo suas próprias palavras, a “omissão inconstitucional dos Poderes Públicos Federal, Estaduais, Municipais e Distrital, na medida em que, no atual contexto de pandemia ocasionada pelo novo coronavírus – COVID-19 que vem assolando diversos países do globo e que se alastra rapidamente pelo território nacional, não foram adotadas medidas suficientes para a garantia eficaz e plena de acesso universal, igualitário e indiscriminado ao sistema de saúde pelos cidadãos, o que só pode ocorrer se a administração dos leitos de UTI da rede privada e da rede pública for realizada pelo Poder Público.”

No entender do partido político, tal situação teria impacto apto a causar lesão aos preceitos fundamentais correspondentes ao direito à saúde, à vida, à igualdade, bem como à dignidade da pessoa humana e ao propósito de uma sociedade justa e igualitária, abrigados nos arts. 1°, III; 3°; 5°, caput; 6°; 23, II; 24, XII; 194; 196; 197; 198; 199; 200; 227 e 230, todos da Constituição Federal.

Ao examinar o pleito cautelar, Vossa Excelência houve por bem negar seguimento à arguição, por flagrante ausência dos pressupostos que autorizam seu manejo. Em suma, foi acertadamente apontado que (i) a ADPF não é meio hábil para resolução de caso concreto, nem pode substituir os meios ordinários para impugnar supostas ações ou omissões abusivas; (ii) violaria o princípio da separação dos Poderes ordem genérica para tomada de decisão político-administrativa; além do que (iii) não se vislumbra o estado de omissão noticiado na peça inicial.

Em seu agravo, o PSOL insiste nos mesmos argumentos trazidos na exordial, com o reforço de estudos realizados pelas Universidades de São Paulo (USP) e Harvard (EUA). Data vênia, o agravo não merece provimento.

II. DO NÃO PROVIMENTO DO AGRAVO

De início, interessante notar que o próprio partido-agravante concorda que “foram adotadas medidas em diversos âmbitos”, bem como que há “extensa produção legislativa que possibilita a requisição administrativa de bens”. Ocorre que, na sua visão unilateral do problema, essas medidas não seriam suficientes, devendo ser todos os entes da Federação compelidos a adotar a resposta que o PSOL entende ser a mais adequada.

Ora, nem um dos Estados da Federação desconhece a realidade da situação causada pela propagação global de nova modalidade de coronavírus (Sars-CoV-2), que, só no Brasil, já provocou aproximadamente 140.0000 casos de contaminação e causou cerca de 9.300 mortes, segundo os dados passados pelas Secretarias Estaduais de Saúde ao Ministério da Saúde até 08.05.2020.

A Organização Mundial de Saúde – OMS, agência da ONU especializada em saúde, declarou em 30 de janeiro de 2020 que a contaminação pelo novo coronavírus se constitui numa “emergência de saúde pública de interesse internacional". Referida qualificação somente havia sido usada anteriormente em casos raros de epidemias que exigem uma vigorosa resposta internacional, como a gripe suína H1N1 (2009), a pólio (2014), o zika vírus (2016) e a febre ebola, que devastou parte da população da África Ocidental entre 2014 e 2016.

Em seguida, a União Federal, através do Ministério da Saúde, igualmente declarou emergência em saúde pública de importância nacional (ESPIN) em decorrência da infecção humana pelo coronavírus, por meio da Portaria no 188/GM/MS, de 4 de fevereiro de 2020. O referido ato normativo prenunciou a edição da Lei Federal no 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, que dispõe sobre medidas que poderão ser adotadas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional, decorrente do coronavírus, objetivando a proteção da coletividade, impondo, entre outras providências, o isolamento, a quarentena, a realização compulsória de exames, testes, coletas de material, bem como a dispensa de licitação para aquisição de bens, serviços e insumos de saúde destinados ao enfrentamento da emergência.

No âmbito dos Estados, deu-se a mesma preocupação e agilidade da adoção de medidas legislativas, políticas e administrativas para fazer frente à gestão da pandemia, sempre atentos à realidade local e particularidades de cada sistema de saúde. Vale notar que a grande maioria dos Estados declararam, ainda em março de 2020, estado de calamidade pública, passo necessário para o direcionamento de recursos para combate da doença sem amarras previstas em lei, nos termos do artigo 65 da Lei de Responsabilidade Fiscal.

No mesmo contexto, todos os Estados da Federação têm adotado diversas ações concretas, sempre lastreadas em estudos técnicos, para o enfrentamento da crise na saúde pública. Logicamente, em um país de dimensão continental e com imensas particularidades verificadas nas diversas Regiões, as medidas visam adequar as providências em cada Estado, mas sempre visando enfrentar de forma efetiva a evolução da pandemia.

Vale destacar, conforme recente decisão desse C. STF na ADI 6341 que são comuns e concorrentes as competências materiais e legislativas dos entes federados para cuidar da saúde (CF, art. 23, II), e para dispor sobre a proteção e a defesa da saúde (CF, art. 24, XII), com o objetivo de autorizar medidas de prevenção ao contágio e tratamento do coronavírus. Tal decisão referenda e legitima as medidas legislativas, administrativas e sanitárias dos Estados no tocante às regras de isolamento, quarentena, restrição de rodovias, etc.

Enfim, é notório o quadro de ação efetiva dos Estados no combate da pandemia, não havendo se falar em omissão. Não pode o PSOL pretender que a única solução possível para a resolução dessa grave crise da saúde pública se limite à requisição administrativa compulsória, geral e abrangente de leitos de UTI. Mais uma vez, há que se respeitar a autonomia política dos Estados e sua habilidade para tomada das ações que melhor reflitam cada realidade respectiva.

Novamente, veja-se os dados oficiais para se ter conta da disparidade das realidades vivenciadas por cada Estado: enquanto Amazonas, Maranhão e Rio de Janeiro possuem situação crítica de ocupação de leitos de UTI (taxa acima de 90%), há Estados como Mato Grosso do Sul, Tocantins e Santa Catarina em patamar abaixo dos 20% de ocupação. Outra grande quantidade de Estados, como Paraná, Sergipe e Alagoas ainda têm mais da metade da capacidade de leitos disponíveis.

Nesse contexto, deve cada Estado verificar a melhor saída para o combate da crise de saúde, considerada a realidade local. Ademais, caso a solução passe pelas requisições administrativas, há expressa previsão legal (Lei 13.979/2020) para tanto, não sendo a presente arguição veículo próprio para transmudar a competência política do ente federativo, dentro do escopo da conveniência e oportunidade.

Em resumo, a presente ADPF é realmente inviável do ponto de vista processual ou material, por não haver omissão inconstitucional e, muito menos, por sugerir uma solução genérica que não necessariamente se aplica indistintamente à União, Estados e Municípios brasileiros. Daí porque os Estados e o Distrito Federal ora assinados concordam integralmente com a conclusão de Vossa Excelência no sentido de que:

“Por todos os ângulos que se examine a questão, forçoso é concluir que a presente ADPF não constitui meio processual hábil para acolher a pretensão nela veiculada, pois não cabe ao Supremo Tribunal Federal substituir os administradores públicos dos distintos entes federados na tomada de medidas de competência privativa destes, até porque não dispõe de instrumentos hábeis para sopesar os distintos desafios que cada um deles enfrenta no combate à Covid-19.” (grifos nossos)

III - PEDIDO.

Em face do exposto, requerem os Estados o não acolhimento do agravo interno interposto pelo PSOL, mantendo-se a r. decisão agravada por seus próprios fundamentos, ante a inexistência de omissão no combate da COVID-19, além de impossibilidade de criação da obrigação, por decisão judicial, de determinada conduta (requisição administrativa de leitos de UTI) de forma impositiva e genérica, ignorando as competências politico-administrativas dos entes federados.

Termos em que, P. Deferimento

Brasília, 11 de maio de 2020​

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