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Mônica Bergamo é jornalista e colunista.

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Relator propõe seis meses de suspensão para deputado que assediou Isa Penna

Deputado Emidio de Souza diz que comportamento de parlamentar é 'inaceitável' e 'inadequado'

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O deputado estadual Emidio de Souza (PT), relator do processo na Comissão de Ética da Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) no julgamento do deputado Fernando Cury (Cidadania), propôs em seu parecer a suspensão do mandato parlamentar de Cury pelo prazo de seis meses.

No parecer, ele afirma que o comportamento de Cury "é inaceitável" e "inadequado". Emidio também propõe que durante esse período seja "suspensa a percepção de qualquer subsídio pelo parlamentar e vantagens dele decorrentes."​

No fim de 2020, em sessão na Alesp, Cury se aproximou da deputada Isa Penna (PSOL) por trás e apalpou os seios dela. A deputada o acusa de importunação sexual, enquanto a defesa do deputado nega ter havido toque, má-fé e ato libidinoso. O caso é investigado também pelo Ministério Público.

Dianta da mesa da Assembleia, deputado abraça deputada por trás com uma das mãos na região dos seios dela
Vídeo mostra deputado Fernando Cury passando a mão no seio da deputada Isa Penna durante sessão da Assembleia de São Paulo - Reprodução - 17.Dez.2020

A denúncia de Isa por quebra de decoro parlamentar foi aceita em 10 de fevereiro, e o regimento prevê 30 dias para a conclusão.

"O comportamento do denunciado, deputado Fernando Cury em relação à denunciante, deputada Isa Penna, na sessão extraordinária do dia 16/12/2020, é inaceitável por ofender de maneira grave seu inviolável direito de não ter o seu corpo tocado por quem não foi, expressamente, por ela autorizado", diz Emidio.

Nas últimas duas sessões, o Conselho de Ética se dedicou a ouvir testemunhas de Cury e deputados convidados por Isa. Os advogados que representam os deputados também se manifestaram.

No documento, o relator também afirma que os "esforços da defesa não lograram superar a nitidez das imagens" que foram transmitidas pela TV Alesp. "Nem mesmo a contratação de notório perito para examinar as referidas imagens conseguiu tal proeza", diz Emidio.

Ele também rebate a ideia de que a reação de Isa Penna não teria sido ao toque de Cury. "Ora, mais uma vez aqui, as imagens não corroboram a tese do douto perito, visto que na sequência do toque ao lado direito do corpo da deputada, o representado se deslocou para o lado esquerdo para onde a Isa Penna se dirigiu ao repeli-lo. Derrete-se assim o argumento de que Isa Penna não teria reagido ao toque, fato incontroverso de resto presenciado por todos quantos viram a gravação", diz.

​Emidio diz ainda que tampouco as testemunhas arroladas pela defesa ("todas mulheres com quem Fernando Cury mantém ou manteve graus de relacionamento pessoal ou profissional") puderam alterar o curso das investigações, uma vez que nenhuma delas presenciou "in loco" os fatos.

"Ao abraçar pelas costas a deputada Isa Penna e lhe tocar os seios sem seu consentimento, o deputado Fernando Cury, teve um comportamento inadequado que atentou contra a Ética e o decoro parlamentar entendido como o conjunto de regras e comportamentos a que estão submetidos os membros desta casa que visam a convivência respeitosa, harmoniosa e civilizada entre os deputados e deputadas que a compõe", finaliza Emidio.

O relator também indica que a mesa diretora da Alesp coloque em votação proposições de parlamentares que visem "ampliar a proteção as mulheres contra todo o tipo de violência".

Leia a íntegra do parecer do relator:

"PARECER Nº , DE 2020

DO CONSELHO DE ÉTICA E DECORO PARLAMENTAR, SOBRE O PROCESSO RGL Nº 7862/2020

Na qualidade de Relator, designado pela Deputada Maria Lúcia Amary, presidente do Conselho de Ética e Defesa Parlamentar da Assembleia Legislativa, que nos incumbiu de elaborar esse parecer para apreciação dos nobres deputados membros do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar, as nobres Deputadas Maria Lúci Amary e Erica Malunguinho os nobres Deputados Adalberto Freitas, Alex de Madureira, Barroz Munhoz, Campos Machado, Delegado Olim e Welligton Moura. Todo o processo contou com o acompanhamento e participação do nobre deputado Estevão Galvão, Corregedor Parlamentar.

No desempenho desse mister, foi assegurada a mais ampla defesa ao Deputado Fernando Cury, diretamente e por meio de seu advogado, que acompanhou e fez uso da palavra em todas reuniões e atos.
O Processo RGL 7862, de 2020, trata de representação de iniciativa da Deputada Isa Penna contra o Deputado Fernando Cury, por quebra de decoro parlamentar. A representação deu entrada no dia 17 de dezembro de 2020, sendo regularmente autuada e processada na forma regimental com distribuição aos membros do Conselho, bem como ao Corregedor Parlamentar deputado Estevão Galvão.

Na sequência do processo, a matéria foi encaminhada ao Deputado Fernando Cury, por meio do Ofício CEDP nº 52/2020, a fim de que o parlamentar tomasse ciência e apresentasse manifestação acerca do teor da denúncia, nos termos da Instrução Normativa nº 01, de 2019.

Notificado, o representado apresentou tempestivamente sua defesa prévia ao Conselho para fins do juízo de admissibilidade. Paralelamente chegaram a esse colegiado duas representações pugnando pela suspeição da deputada Érica Malunguinho e Alex de Madureira.

Aos 08 de fevereiro de 2020 foi encaminhada a manifestação prévia do Deputado Fernando Cury (fls. 93-249) à Secretaria do CEDP e indexada aos autos do Processo RGL 07862/2020.

Em 10 de fevereiro de 2021, o Conselho de Ética e Decoro Parlamentar, após profundo debate, inclusive com a participação do defensor do representado, advogado Roberto Delmanto Júnior, inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil- São Paulo sob o n.º 118.848, aprovou pela unanimidade dos seus membros a admissibilidade da representação em desfavor do Deputado Fernando Cury, publicada a decisão n.º 12, de 2021, aos 12 de fevereiro de 2021 e pelo prosseguimento das apurações nos termos dos parágrafos 2º e 3º do artigo17 e demais disposições do Código de Ética e Decoro Parlamentar (Resolução 766, de 16/12/1994).

Na mesma reunião, o conselho rejeitou os requerimentos de declaração de suspeição do Deputado Alex da Madureira e da Deputada Erica Malunguinho.

Aos 18 de fevereiro de 2020, foi juntada a defesa no mérito, apresentada pela Deputado Fernando Cury (fls. 259-376).

Dos Fatos

Cuidam esses autos de fato ocorrido no plenário da Assembleia Legislativa, na noite de 16/12/2020 já adentrando para a madrugada do dia 17/12 durante a última sessão legislativa do ano, a 64.ª sessão extraordinária. A sessão e os fatos foram documentados em vídeo pela TV Alesp e obtiveram ampla repercussão em todas as mídias. Consta que o Deputado Fernando Cury teria apalpado os seios da deputada Isa Penna, o que caracterizaria crime de importunação sexual, o que a defesa técnica do deputado nega peremptoriamente tanto na defesa prévia , como na defesa de mérito , tendo inclusive apresentado perícia nesse sentido com o fito de provar a inexistência do crime de importunação sexual de que é acusado.

O representado arrolou 8 testemunhas, todas mulheres cujos depoimentos foram tomados por esse Conselho na forma regimental. Dessas oitivas extrai-se a defesa da vida pregressa do Deputado Fernando Cury por pessoas que conviveram ou convivem com ele, afim de ressaltar sua idoneidade e respeito no trato com as mulheres. Sobre os fatos em si, objeto do trabalho desse conselho, nenhuma delas viu presencialmente mas tão somente por vídeo como de resto, milhões de pessoas o fizeram.

Na sequência prestou depoimento nesse Conselho, o representado deputado Fernando Cury que negou ter cometido assédio ou importunação sexual contra a deputada Isa Penna sustentando que tratou-se de um simples abraço como estaria acostumado a fazer com outras pessoas.

Após as testemunhas, o perito e a defesa, para melhor elucidar os fatos, o conselho decidiu ouvir os senhores deputados que estavam próximo ao local dos fatos, Teonilio Barba, Coronel Telhada, Gilmaci Santos e Alex de Madureira. Os dois últimos não compareceram nem justificaram a ausência. O Sr deputado Coronel Telhada declarou não ter nada a acrescentar porque estava de costas para o local onde os fatos ocorreram e só soube da gravidade no dia seguinte.

O Sr deputado Teonilio Barba declarou que estava a poucos metros e presenciou os fatos, que não se tratou de um simples abraço visto que foi feito por trás, de surpresa e sem consentimento algum da deputada Isa Penna que prontamente repeliu o gesto.

Finalmente ouvimos a defesa da deputada Isa Penna e logo após, a defesa do deputado Fernando Cury. O defensor da deputada representante reafirmou que ela teve seus seios apalpados pelo representado, ato que repeliu prontamente que se sentiu ofendida enquanto mulher, figura pública, esposa e deputada. Que seu mandato é dedicado à luta pela emancipação das mulheres e contra a violência de gênero.

O defensor do deputado representado reafirmou que não teve a intenção de ofender a colega e que tratou se de um simples abraço sem qualquer conotação sexual. Que o toque, apesar de inadequado, não foi nos seios e sim nas costelas na região sub-axilar.

É o relato. Passo a opinar.

De tudo que se apurou na fase de instrução, assegurada a ampla defesa do representado e participação do seu defensor, esse Conselho pode constatar que trata-se de um fato de elevada gravidade com potencial de atingir a imagem da Assembleia Legislativa do Estafo de São Paulo, maior parlamento da América Latina.

O comportamento do denunciado, deputado Fernando Cury em relação a denunciante, deputada Isa Penna na sessão extraordinária do dia 16/12/2020 é inaceitável por ofender de maneira grave seu inviolável direito de não ter o seu corpo tocado por quem não foi, expressamente, por ela autorizado.
O Regimento interno e o Código de Ética e Decoro Parlamentar (Resolução n.º 766, de 16 de dezembro de 1994, no CAPÍTULO III

Dos Atos Contrários à Ética e ao Decoro Parlamentar, artigo 2.º estabelece que:

Artigo 2º - São deveres fundamentais do Deputado:

III - Exercer o mandato com dignidade e com respeito à coisa pública e à vontade popular.

Nele estão explícitos o respeito e urbanidade com que os integrantes da casa devem se tratar. Com efeito, tal artigo não visa apenas proteger a imagem do parlamento e de todos os membros, mas principalmente o bem maior que é a dignidade da pessoa humana que não pode ser vilipendiada em hipótese alguma.
Se tal valor se apresenta como tão fundamental à sociedade, muito mais deve ser para o parlamento que a representa.

A sociedade tem o direito de ver espelhado no seu parlamento, os valores em que ela se funda e de onde sobressai a dignidade humana e o direito e a inviolabilidade do corpo de cada um e cada uma.
Nosso ordenamento jurídico consagrou a liberdade como um bem inafastável para a vida social, mas estabeleceu sobre esse direito os limites que os nossos costumes há muito consolidaram como o respeito à liberdade do outro e sua inviolabilidade.

Nossa ordem constitucional não abrigou nem poderia fazê-lo qualquer diferença entre mulheres e homens quanto os seus direitos da sua liberdade. Muito ao contrário, elevou ao mais alto patamar a igualdade de direitos entre ambos os gêneros .

Na esteira dessa nova ordem e impulsionadas pelo desejo de superar a sua secular segregação e inferiorização, as mulheres brasileiras foram à luta e lograram conquistar novos e significativos avanços na vida social e na legislação infra constitucional nacional e regional. O corpo da mulher não pode mais ser objeto da lascívia masculina, somente a ela pertence.

Desses avanços, se destaca a ocupação de espaços políticos de poder por um crescente número de mulheres das mais diversas camadas sociais, nos parlamentos, nos governos e nos grandes centros de decisão e poder.

Os parlamentos e governos tiveram que se adaptar a essa nova e boa realidade que está mudando para melhor o perfil dos nossos legislativos e executivos e do próprio judiciário. Por isso mesmo os fatos que são objetos dessa denúncia causaram tanta comoção social e exigem pronta resposta dessa casa de leis.
Ressalte -se por oportuno, que a investigação criminal do fato e seus eventuais desdobramentos é de competência do Ministério Público Estadual e já está em andamento por ordem da egrégia Procuradoria Geral de Justiça do Estado de São Paulo.

A esse Conselho de Ética e Decoro Parlamentar e a própria Assembleia Legislativa cabem a investigação e eventual punição no âmbito parlamentar, cingindo-se sua atuação à possível falta de ética e quebra de decoro parlamentar a que todos os seus membros estão sujeitos.

Os esforços da defesa não lograram superar a nitidez das imagens transmitidas ao vivo pela TV Alesp. Nem mesmo a contratação de notório perito para examinar as referidas imagens conseguiu tal proeza. Buscou o profissional contratado pela defesa demonstrar que não teria havido tal toque ou que quando muito, teria sido algo superficial mais localizado nas costelas do que nos seios , que o representado apenas buscava um ângulo para falar com o presidente da casa com quem Isa Penna já dialogava.
Também tentou demonstrar o perito que a reação indignada da representada não teria sido ao toque havido, mas tão somente à presença de Fernando Cury ao seu lado esquerdo próximo ao seu rosto visto que ao reagir, a deputada não se virou para a direita, lado onde houve o toque mas sim para o lado esquerdo onde estava o rosto do deputado. Ora, mais uma vez aqui, as imagens não corroboram a tese do douto perito, visto que na sequência do toque ao lado direito do corpo da deputada, o representado se deslocou para o lado esquerdo para onde a Isa Penna se dirigiu ao repeli-lo. Derrete-se assim o argumento de que Isa Penna não teria reagido ao toque, fato incontroverso de resto presenciado por todos quantos viram a gravação.

Tampouco as testemunhas arroladas pela defesa, todas mulheres com quem Fernando Cury mantém ou manteve graus de relacionamento pessoal ou profissional, puderam alterar o curso das investigações visto que nenhuma delas presenciou, in loco, os fatos, mas tão somente teceram comentários elogiosos à vida pregressa do representado, ao seu costume de abraçar pessoas e seu respeito às mulheres, o que, ressalte-se, não é objeto do trabalho desse Conselho cujo objetivo não é outro senão elucidar os fatos ocorridos no plenário desta egrégia casa em 16/12 /2020.

Não nos é dado Sra presidente, Srs membros do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar e Srs deputados e Sras deputadas passar ao largo da objetividade dos fatos e da clareza cristalina das imagens que desfilam sob nossos olhos. Nossa responsabilidade com a sociedade que representamos e nossa obediência à verdade, impõe que estejamos acima da nossas relações pessoais inclusive com os pares que por vezes julgamos. Estamos todos sujeitos ao império da lei.

Assim, nada nos resta a não ser interpretar objetivamente as condutas que nos chegaram nesses autos e confronta-las com o nosso Código de Ética e Decoro Parlamentar que nada mais é do que o que proponho a esse Conselho fazer.

Após esta ampla e detalhada fase de instrução onde as partes puderam livremente sem qualquer sombra de cerceamento, apresentar suas razões, testemunhas, perícia, opiniões tanto documental quanto oralmente nas sessões do Conselho e o próprio Conselho pode diligenciar diretamente no interesse da apuração, este relator e os demais membros do colegiado, tem sua convicção formada .

Ao abraçar pelas costas a deputada Isa Penna e lhe tocar os seios sem seu consentimento, o deputado Fernando Cury, teve um comportamento inadequado que atentou contra a Ética e o decoro parlamentar entendido como o conjunto de regras e comportamentos a que estão submetidos os membros desta casa que visam a convivência respeitosa, harmoniosa e civilizada entre os deputados e deputadas que a compõe.

O desrespeito e os atos atentatórios a esses códigos devem ser punidos na gradação proporcional a gravidade e ao dano que causaram a vítima.

Como já dito anteriormente, o fato em análise causou imensos danos à imagem, a vida e a dignidade da representante, deputada Isa Penna razão pela qual proponho a esse egrégio Conselho que seja aplicada ao representado, deputado Fernando Cury a pena de suspensão do seu mandato parlamentar pelo prazo de 6 (seis) meses na forma do inciso III do artigo 7.º do Código de Ética. Proponho ainda que nesse período seja suspensa a percepção de qualquer subsídio pelo parlamentar e vantagens dele decorrentes. Indico ainda, que a Mesa Diretora da Assembleia e seu Colégio de líderes coloquem em votação as proposições parlamentares que visem ampliar a proteção as mulheres contra todo tipo de violência.

Na expectativa de acolhida desse relatório, agradeço a colaboração de todos os membros desse egrégio Conselho de Ética e Decoro Parlamentar.

São Paulo, 03 de Março de 2021

Deputado Emidio de Souza
Relator"

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