Mônica Bergamo

Mônica Bergamo é jornalista e colunista.

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Se concordo ou não com a minha mãe, não importa, diz Gabriela Duarte

Atriz diz querer se arriscar em outras funções no meio artístico, afirma que sempre apoiará a mãe, Regina Duarte, mas que não se responsabiliza por suas atitudes --e considera que a passagem dela pelo governo Bolsonaro ficou para trás

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Gabriela Duarte

A atriz Gabriela Duarte Arthur Germano

A atriz Gabriela Duarte afirma que o período em que sua mãe, Regina Duarte, atuou como secretária da Cultura no governo de Jair Bolsonaro já ficou para trás. “É como se tivesse fechado um ciclo nas nossas vidas”, diz ela. “Agora é bola para frente. Tocar a vida daqui para frente e não ficar vivendo uma coisa que já passou.”

“É como eu tento viver a vida. Não dá para voltar, não dá para avaliar ou ficar sofrendo nem pelo passado nem pelo futuro”, continua.

Regina rompeu contrato de mais de 50 anos com a TV Globo para fazer parte da gestão de Bolsonaro e ficou à frente da pasta por menos de três meses, entre março e maio de 2020. Gabriela conta que a família não influenciou nas decisões da mãe —e que soube pela imprensa tanto quando ela aceitou o cargo como quando deixou o governo.

Ela afirma que conseguiu fazer uma “separação real” de sua relação familiar com Regina e da figura pública da atriz. “Foi um modo de sobrevivência também, não deixa de ser.”

Gabriela Duarte
A atriz Gabriela Duarte - Arthur Germano

A atriz não esteve na posse de Regina e diz que não precisaria estar lá para que a mãe soubesse que tinha a sua aprovação. “Ela tem o meu apoio para o que ela quiser fazer na vida. Se eu concordo ou se eu não concordo, isso realmente não importa”, segue.

Mas conta que acabou se distanciando da mãe naquele período. “Em função do próprio momento, né? Ela trabalhando envolvida lá [em Brasíl​ia] e eu aqui [em São Paulo], vivendo a minha vida. Tudo o que a gente tinha que discutir, fizemos da porta para dentro de casa. Nunca tive nenhuma necessidade de levar isso para uma esfera pública e nunca me senti cobrada a fazer isso.”

Em sua passagem turbulenta pela secretaria, Regina foi duramente criticada pela classe artística —e muitas dessas críticas respingaram em Gabriela.

“É muito desconfortável fazer uma análise sobre determinadas atitudes que não são suas e que são de uma pessoa que você tem muito afeto, que é sua mãe. Todo mundo tem mãe. Minha família está acima de qualquer discussão na esfera pública”, segue.

Ela conta que não foi fácil lidar com as críticas, mas que não perdia o sono por isso também. “Que pena que as pessoas não conseguiram fazer essa separação. Estava sendo criticada por coisas que eu não fiz, decisões que eu não tomei. E daí que somos mãe e filha?”

“Me responsabilizo pelos meus filhos. Tenho uma de 14 [anos] e um de 9 [anos]. Agora vou me responsabilizar pelos meus pais também? Vou cuidar, vou amar, vou respeitar. Fora isso? Não. Não tenho nada a ver com isso”, segue. “Só me responsabilizo pelas minhas próprias decisões.”

E diz que chegou a receber algumas ameaças nas redes sociais naquele momento. “Foram mensagens bem desagradáveis, muito feias. O desejo do outro de que você morra, de que sua família morra. É muito duro esse nível de ódio, que é totalmente cego e infundado.”

Gabriela tem mais de 730 mil seguidores no Instagram, única rede social da qual participa. Ela diz que não se sente pressionada para publicar nenhum tipo de conteúdo e que não tem medo de ser cancelada. “Zero [risos]! Não devo nada a ninguém. Me coloco de uma forma que realmente tem muito a ver comigo, são coisas em que eu acredito.”

Gabriela diz que se emocionou bastante ao ser vacinada no fim de junho. “Vacinação é um ato de amor ao próximo e a você mesmo. É um ato coletivo que, de certa forma, preenche um pouco o coração e te dá mesmo uma luz no fim do túnel”, diz.

A atriz conta que até hoje não consegue acreditar na morte do humorista Paulo Gustavo, de quem era próxima. “Paulo era uma unanimidade. Essa ficha ainda não caiu. Ele e tantos outros da cultura. Eram pessoas que eu não só amava, como respeitava, admirava”, segue. “E quando a gente pensa nas famílias das mais de 530 mil [vítimas da Covid-19 no Brasil]... É uma tragédia.”

E critica a atuação do governo Bolsonaro. “É trágico. Não temos uma liderança honesta, clara, que se preocupe com a vida.”

A atriz diz que não se arrepende de ter anulado o seu voto no segundo turno das eleições presidenciais em 2018 —no primeiro, votou em Ciro Gomes (PDT). “Fiz o que achava que tinha que ser feito naquele momento. Aí podem dizer que ‘o Bolsonaro ganhou por sua causa’. Por minha causa, não! Ele foi eleito com mais de 50% dos votos”, diz.

“É óbvio que a gente já sabia muitas coisas da forma como ele pensava, mas a forma como esse cara conduziu o governo é um desastre, realmente. Um desastre humanitário.”

Gabriela conversou com a coluna por videochamada de seu apartamento, nos Jardins, em São Paulo. Ela mora com o marido, o fotógrafo Jairo Goldflus, e os dois filhos do casal, Manuela e Frederico.

Aos 47 anos, ela não vê problemas em envelhecer —mas diz que é vaidosa. “Todo mundo envelhece, ninguém vai escapar disso. Quem precisa aceitar o próprio envelhecimento é a pessoa. Cada um tem que saber a dor e a delícia de ser o que é”, completa, entre risos, parafraseando verso da canção “Dom de Iludir”, de Caetano Veloso.

“Tenho uma certa reserva do que a fama pode trazer [para uma pessoa]. Fama a qualquer custo não conversa comigo. Algumas vezes, ser famoso é chato, é complicado, é um lugar muito espinhoso. E de muita responsabilidade ao mesmo tempo.”

Ao longo dos mais de 30 anos de carreira, Gabriela chegou a atuar ao lado da mãe algumas vezes. O papel mais famoso dessa parceria foi na novela “Por Amor”, da TV Globo, que foi ao ar no fim da década de 1990, em que protagonizaram mãe e filha. Ela conta que já passou por um momento na profissão em que sentia que precisava se provar mais por ser filha da “namoradinha do Brasil”, como foi apelidada Regina.

“De repente, veio a maturidade. Isso simplesmente deixou de acontecer na minha vida. Claro, acabei impondo limites, falei que não queria mais ficar fazendo [o papel da] filha, a mesma personagem. Queria entender quem era a Gabriela, independentemente dos laços consanguíneos e artísticos.”

E diz que tem vontade de voltar a trabalhar com a mãe. “É uma pessoa que adoro trabalhar, admiro e aprendo muito. Artisticamente a gente tem muita cumplicidade, muita troca bacana.”

Gabriela conta que a epidemia da Covid-19 também foi um momento em que pôde avaliar quais os próximos passos de sua carreira. Antes do coronavírus, ela estava escalada para uma novela de época da TV Globo, mas acabou saindo do elenco —ela é contratada da emissora. Sem nenhum projeto no horizonte, mas com muitas ideias, ela diz que tem vontade de arriscar artisticamente .

“Quero descobrir coisas novas a meu respeito. A arte me interessa e me move muito. Tenho vontade de usar tudo o que aprendi nesses 30 anos e tentar ajudar essa nova geração que está aí. Tentar guiar, de certa forma”, diz.

Para ela, é necessário um resgate da formação de um ator, que acredita ter sido deixado de lado nos últimos anos. “Quando comecei [na profissão], a única certeza que eu tinha era que eu precisava de uma formação. E fui atrás dela. Bia Lessa, Gerald Thomas, Antunes Filho... Tudo o que estava disponível, eu fui atrás. E hoje sinto que isso não está mais sendo levado em conta”, segue.

“As pessoas ficaram midiáticas, estão mais preocupadas com a quantidade de seguidores que elas têm. E quem comanda essa cadeia também sucumbiu a isso. Acredito numa volta de se aprofundar mais no ser humano. E isso você consegue fazer por meio dos clássicos e da leitura.”

Ela conta que se voltou muito à leitura durante a quarentena, e que os livros “a salvaram”. “Me senti muito imobilizada, tiveram momentos em que eu não sabia para onde ir. E também não tive grandes arroubos criativos”, segue. Foi quando resolveu criar um perfil no Instagram com uma amiga para incentivar a leitura. “Queria estender essa sensação para outras pessoas. Ler é autocuidado.”

Gabriela afirma que se preocupa muito com o setor cultural, um dos mais afetados pela epidemia da Covid-19. Mas acredita em uma volta por cima. “Tenho muita fé na arte e nesse ofício de se reinventar. A arte e a cultura estão acima do tempo e elas irão se reerguer. Isso está acima de qualquer coisa, de qualquer ideologia.”

“Quando puder voltar, as pessoas vão querer ir e prestigiar [espetáculos culturais]. Vão entender o quanto a gente precisa desses encontros. Sonho muito com eles. Ninguém segura a arte, ela não vai acabar.”

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