Mônica Bergamo

Mônica Bergamo é jornalista e colunista.

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Descrição de chapéu Folhajus

Justiça rejeita queixa-crime de Aras contra Conrado Hübner Mendes

Juíza cita direito à liberdade de expressão de pensamentos e ideias; professor foi alvo de ofensiva após chamar PGR de Poste Geral da República

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A Justiça Federal da 1ª Região rejeitou a queixa-crime apresentada pelo procurador-geral da República, Augusto Aras, contra o professor da USP e colunista da Folha Conrado Hübner Mendes. O PGR pedia que Mendes fosse condenado pelos crimes de calúnia, injúria e difamação.

Em sua decisão, a juíza federal Pollyanna Kelly Maciel Medeiros Martins Alves afirma que não houve ofensa à honra de Aras e que a liberdade de expressão e a imprensa livre são pilares de uma sociedade democrática, aberta e plural.

"O direito de liberdade de expressão dos pensamentos e ideias consiste em amparo àquele que emite críticas, ainda que inconvenientes e injustas. Em uma democracia, todo indivíduo deve ter assegurado o direito de emitir suas opiniões sem receios ou medos, sobretudo aquelas causadoras de desconforto ao criticado", diz Alves.

O professor de direito da USP e colunista da Folha Conrado Hübner Mendes - Zo Guimaraes - 19.nov.2019/Folhapress

A magistrada ainda destaca que aqueles que exercem função pública estão expostos a publicações que citem seu nome —sejam elas positivas ou negativas. A queixa-crime, agora, será arquivada.

A decisão da Justiça é celebrada pelo professor da USP, que a define como "simples, objetiva e correta". "Autoridades não podem nos privar do direito à crítica, que não se confunde com ataque, ameaça e incitação. Não podem nos privar do direito às palavras e adjetivos contundentes, nem do direito ao sarcasmo e à galhofa", afirma à coluna.

"Eles são autoridades e nós somos cidadãos. Se nem isso nos sobra, acabou a última película da democracia", segue Mendes.

Na petição, o procurador-geral citou publicações de Mendes nas redes sociais e coluna dele publicada na Folha intitulada “Aras é a antessala de Bolsonaro no Tribunal Penal Internacional”.

“Aras não economiza no engavetamento de investigações criminais: contra Damares por agressão a governadores; contra Heleno por ameaça ao STF; contra Zambelli por tráfico de influência; contra Eduardo Bolsonaro por subversão da ordem política ao sugerir golpe”, diz o texto assinado pelo colunista.

Nas postagens publicadas nas redes, o professor chamou Aras de “Poste Geral da República” e “servo do presidente”. E afirmou que ele é o “grande fiador” da crise sanitária vivida no Brasil.

No mês passado, o professor também foi alvo de ofensiva do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Kassio Nunes Marques. O ministro acionou a Procuradoria-Geral da República afirmando que Mendes fez afirmações “falsas e/ou lesivas” à sua honra em artigo publicado na Folha. O órgão deu andamento ao caso e repassou a representação à Polícia Federal.

O magistrado anexou no ofício à PGR o texto “O STF come o pão que o STF amassou”, publicado em abril e no qual colunista abordou a decisão do ministro que liberava a realização de cultos, missas e demais celebrações religiosas no país em meio à crise da Covid-19.

“O episódio não se resume a juiz mal-intencionado e chicaneiro que, num gesto calculado para consumar efeitos irreversíveis, driblou o plenário e encomendou milhares de mortes", afirmou Conrado Hübner Mendes na ocasião.

As iniciativas de Aras e do ministro do Supremo contra o professor mobilizaram a comunidade acadêmica. Um manifesto em apoio a Mendes reuniu mais de 280 professores de universidades brasileiras e nomes como Miguel Reale Jr., José Rogério Cruz e Tucci, Debora Diniz e Gisele Cittadino.

No início do mês, um grupo de intelectuais de universidades da Alemanha enviou uma carta ao presidente STF, Luiz Fux, em sua defesa.

O Observatório Pesquisa, Ciência e Liberdade da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), endossado pelo Cebrap (Centro Brasileiro de Análise e Planejamento), pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública e pelo grupo Ciências Sociais Articuladas, também fez uma nota em defesa do professor de direito da USP.

"Se tal prática tem se tornado, infelizmente, lugar comum no Brasil, ela atinge agora novo patamar em um cenário no qual um ministro do Supremo Tribunal Federal e o representante máximo do Ministério Público envidam esforços para judicializar críticas a suas decisões, constrangendo, assim, a opinião pública brasileira", disse a articulação.

Conrado Hübner Mendes também é citado em representação feita por Augusto Aras junto ao Conselho da Ética da USP em maio deste ano. Passados três meses, o colegiado ainda não se manifestou sobre o tema.

Em nota divulgada no dia 29 de julho, o reitor da USP, Vahan Agopyan, afirmou que a instituição "prima pela pluralidade de opiniões científicas e acadêmicas" e que um de seus pilares "assenta-se na liberdade de expressão e na livre manifestação". A manifestação, no entanto, não faz menção a Mendes.

A Congregação da Escola de Comunicações e Artes da USP também criticou a queixa-crime apresentada por Aras contra Conrado.

"Esta Congregação repudia veementemente estas ações do poder público, que ferem princípios fundamentais para a boa prática do ensino, da pesquisa e da extensão na Universidade: o direito de liberdade de expressão do pensamento e a liberdade de cátedra. Com seus textos na imprensa, Conrado Hübner Mendes tem somado, à sua respeitável atuação como pesquisador e professor universitário, o importante papel de observador atento e crítico do judiciário brasileiro, contribuindo para que milhares de cidadãos possam ter uma melhor compreensão acerca dos processos e decisões do poder público e, dessa maneira, estimulando o amplo debate e a troca livre de ideias em nossa sociedade", afirmou, em nota.

Leia, abaixo, a decisão da Justiça Federal da 1ª Região:

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