Mônica Bergamo

Mônica Bergamo é jornalista e colunista.

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Mônica Bergamo
Descrição de chapéu Coronavírus

Tatá Werneck diz que não quer mais errar nem rir da dor dos outros

De volta à TV, humorista conta que chegou a pensar em desistir de gravar o 'Lady Night' após a morte de Paulo Gustavo e diz não achar mais que o humor pode tudo --inclusive ser criminoso

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

"Vou colocar no viva-voz um minuto para fazer o teste aqui", avisa Tatá Werneck, 38, antes de se submeter a um exame de PCR para Covid. "Mas vamos falando. Tô acostumadíssima, o cara aqui do laboratório vai até passar o Natal aqui em casa."

Por causa da pandemia, a atriz, humorista e apresentadora transformou sua casa no Rio em estúdio para fazer suas campanhas publicitárias. Ela diz que só saiu de casa nesses quase dois anos para ir ao médico e gravar seu programa de entrevistas, "Lady Night", do Multishow.

Uma mulher branca de cabelos compridos loiros, vestindo saia preta e camisa branca,  está em pé ccom a mão direita em cima de uma bancada de madeira. A mão esquerda está apoiada na cintura. Ela faz um biquinho com os lábios pintados de vermelho
A atriz e humorista Tatá Werneck no cenário da sexta temporada de seu late show, 'Lady Night', no Multishow - Juliana Coutinho/Divulgação

A sexta temporada do late show que ela apresenta, escreve e edita, foi gravada em julho, tendo entre os convidados os atores Ary Fontoura e Lilia Cabral, Marcos Mion e a ex-BBB Juliette Freire.

No Twitter, algumas pessoas que assistiram à estreia do programa na segunda (15), perguntaram a Tatá se era piada ela aparecer várias vezes passando álcool em gel nas mãos. "Não, eu tava desesperada mesmo", diz a atriz em entrevista por telefone na manhã de terça (16).

"Tô neurótica. A galera ali tinha que fazer uns três testes de Covid antes de gravar. Os convidados chegavam com as narinas danificadas", brinca.

Um homem branco careca segura no colo uma mulher branca morena com o cabelo preso dentro do mar de água verde transparente
Tatá Werneck e Paulo Gustavo em viagem às ilhas Maldivas em 2017 - @tatawerneck Instagram

Ela conta que chegou a pensar em não fazer o "Lady Night" neste ano, por causa da pandemia. "Quando tava sem vagas em hospitais, falei: para quê vou gravar?", lembra a atriz, que soma 61 milhões de seguidores nas redes sociais. "E teve o que aconteceu com o Paulo, fiquei na merda."

Paulo Gustavo, humorista que morreu de Covid em maio, aos 42 anos, era o melhor amigo de Tatá. A atriz chorou ao falar dele durante a conversa com a coluna, interrompida no meio por causa da publicidade que iria fazer.

Tatá diz que foi às lágrimas por causa do amigo em algumas gravações do "Lady Night". Na entrevista com Leandro Hassum, ao ouvir o colega dizer que ela e Paulo são estrelas da comédia, caiu aos prantos. "É muito difícil estar gravando depois do que aconteceu com o Paulo. Fico pensando: ‘O Paulo, tão genial, generoso, incrível, foi embora’. Cheguei a pensar ‘Por que eu mereço alguma coisa?’. Fiquei um tempo com a síndrome de impostora", disse.

Tatá Werneck com máscara, face shield, macacão e luvas
Em 2020, Tatá Werneck gravou a 5ª temporada do programa 'Lady Night' em plena pandemia; humorista postou foto em que aparece vestida com todos os itens de proteção individual - @tatawerneck Instagram

Essa insegurança, parece, o tempo está ajudando a amenizar. Tatá já trabalha em novos projetos: em janeiro, filma um longa com Ingrid Guimarães e, em março, grava outra vez o "Lady Night".
Mas nenhum trabalho, afirma, é mais importante do que estar com sua filha, Clara Maria, 2, do casamento com o ator Rafael Vitti, 26.

Leia a seguir os principais trechos da entrevista.

VOLTA AO TRABALHO

Quando saí para gravar o ‘Lady Night’ eu ainda estava com muito medo [da Covid], muito triste. E aquele programa é o lugar em que realmente consigo rir, em que aproveito aquele encontro com o entrevistado. E quando você tem um encontro na TV, você não pode deixar passar nenhum minuto, não pode esmorecer porque as pessoas estão vendo.

QUASE DESISTI

Passou pela minha cabeça não gravar o programa. Primeiro, quando tava sem vagas em hospitais. Eu falei: para quê vou gravar agora? E depois do Paulo não preciso nem falar [voz embarga].

Quando entrevistei o Leandro Hassum, eu tinha visto ele só duas vezes na vida. Não posso nem falar [pausa, voz embargada]... E ele me fez chorar tanto. E também rir tanto. Foi um momento de catarse. Acho que consegui rir e chorar tudo que estava guardado, consegui me divertir depois do maior tempão. Foi especial.

PAULO GUSTAVO

Chorei várias vezes [lembrando do Paulo Gustavo] nas gravações [do ‘Lady Night’]. Quando entrevistei a Juliette, não tinha como [não lembrar dele]. O dia em que ela ganhou [o ‘Big Brother Brasil’, 4 de maio] foi o dia que o Paulo morreu [começa a chorar]. Ainda tô muito sensível com isso [pausa]. Quando ela tava ali, eu pensei ‘Poxa, aquele foi um dia tão feliz pra tanta gente, eu tava ali torcendo por ela’, e aí [Paulo morreu].

Não queria aparecer chorando no programa, queria que fosse um momento de alegria, porque já tá tudo tão pesado.

NINGUÉM TÁ BEM

A pandemia está difícil para todo mundo, mas desconfiava de quem dizia que tava bem. Eu achava esquisito, pensava ‘Alguém tá conseguindo estar bem nesse momento?’. Sabe aquela pessoa que fala ‘Consegui tirar um tempo para mim’. Eu falo: ‘Tá, mas você relaxou nesse tempo?’. Porque assim, o mundo tá sofrendo. Fora depois tudo o que aconteceu, perdi o Paulo [Gustavo], perdi outros amigos.

COMÉDIA COMO MISSÃO

Já passei por momentos em que estava muito mal e precisava trabalhar, e fazer comédia é o meu ofício. Eu preciso aprender a tentar fazer com que as pessoas riam sendo um dia bom ou não pra mim, esse é o meu trabalho.

Sou super religiosa [é católica] e lembro de eu criança falando que queria ser um instrumento, sabe assim? De falar ‘Quero chegar num lugar desanimado e animar, fazer uma pessoa que tá triste ficar feliz’. Sei que é cafona falar isso. Ver uma pessoa rindo me dá muita alegria.

A CULTURA SALVA

A gente viu a importância da cultura nesse momento de pandemia. É a música que você escutou quando tava sozinho [na quarentena], a série que viu, a piada da qual riu. A comédia ainda é colocada de lado, como se fosse o primo pobre da interpretação. E eu levo muito a sério. Tentar fazer uma pessoa rir é meu maior prazer. Tentar, tá?

VIVER O MOMENTO

Com a história da pandemia a gente percebeu que os encontros eram muito rasos. A gente encontrava alguém e ficava o tempo todo no celular. Fazia um passeio e ficava mais tempo fazendo foto do que aproveitando o passeio. No ‘Lady Night’ eu aproveito o passeio, vejo a paisagem, tô presente naquele momento. Ali é onde eu realmente consigo me divertir, me emocionar. Só vou parar para pensar depois. Aí falo: ‘Putz grila, perdi a linha, viajei’.

O casal de atores Tatá Werneck e Rafael Vitti com a filha, Clara Maria, 2
O casal de atores Tatá Werneck e Rafael Vitti com a filha, Clara Maria, 2 - @tatawerneck Instagram

CHEGA DE ERRAR

Não quero usar o meu trabalho para nenhum desserviço. Contratei a Ana Flor, uma pessoa que entende muito sobre muitas coisas, mestranda em educação e mulher trans. Ela vê os episódios do ‘Lady Night’ antes [de irem ao ar] e fala: ‘Tatá, isso aqui não dá’. E aí fica uma hora me explicando. Tem coisas que jamais imaginei que poderiam ser ofensivas. E não quero mais errar.

Não quero que esse programa desinforme. Quero que divirta, mas não que seja essa parada descompromissada com tudo, [ser] essa coisa de ‘Ah, isso aqui é humor’.

CARAPUÇA DO HUMOR

De repente você tá lá e faz uma piada e quando vê tá sendo gordofóbica. Não quero essa coisa [da desculpa] ‘O humor acima de tudo’. Não penso assim...mais. Porque não é [falar] ‘Ah, mas o mundo mudou’. O mundo mudou pra gente que tava viajando, porque já era errado. Sempre foi doloroso para quem estava sendo discriminado com essa carapuça do humor.

SE REINVENTAR

Um médico vai a congresso todo ano, tá se aperfeiçoando sempre, não pode estagnar. E eu também não. O comediante não pode ficar parado no tempo, tem que ficar se reinventando. Não é assim ‘A verdade é isso, é engraçado e todo mundo que se exploda’.

0
Tatá Werneck caracterizada como a personagem Lucrécia, da novela 'Deus Salve o Rei, da Globo, em 2018; ela diz que não pensa em voltar a fazer novelas - Divulgação

É CRIME

O politicamente correto vem com uma embalagem que parece que [interrompe].Eu faço piadas muito escrotas comigo, com os outros. Mas tem coisas que são criminosas. Não posso mais falar ‘é engraçado’. É criminoso e ponto. Não posso ser transfóbica e falar ‘Peraí, galera’.

COM A DOR NÃO SE BRINCA

Não brinco jamais com pandemia. Eu não quero mais brincar com a dor dos outros, que é a nossa também, é uma dor generalizada. Mas posso estar aqui te falando isso e deixar [alguma piada errada] na edição [do ‘Lady Night’].

Sou muito religiosa, e acho que todas as religiões têm seu valor [pausa]...Tenho medo quando alguém pega qualquer pessoa e enaltece, dessa coisa de [falar] ‘Uhu, maravilhoso’. Todo ser humano tem falhas, é contraditório. Não existe essa pessoa ‘Uhu’, perfeita.

TOCANDO EM FRENTE

Em janeiro vou fazer um filme com a Ingrid Guimarães e direção da Suzana Garcia, o nome provisório é ‘Minha Irmã e Eu’. E em março gravo outra vez o ‘Lady Night’.

Queria muito fazer o programa ao vivo, com seus erros e acertos ali na hora. Espero que com essa matéria consiga convencê-los [o Multishow]. Agora novela, não [quero mais fazer], obrigada. Sou fã e grata a todas [que fiz], mas não dá mais.

MINHA FILHA, MINHA VIDA

Antigamente eu era focada 100% no trabalho. Depois que a minha filha nasceu nada é mais importante do que ficar com ela. Se você me perguntar agora o que eu faria se tivesse uma folga, seria ficar deitada agarrada com ela.

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.