Nelson Barbosa

Professor da FGV e da UnB, ex-ministro da Fazenda e do Planejamento (2015-2016). É doutor em economia pela New School for Social Research.

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Nelson Barbosa

A democracia corre risco no Brasil

Todos os candidatos deveriam cobrar a investigação da escalada de assassinatos de líderes sociais

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Mulher chora ao lado de banner com a imagem da vereadora Marielle Franco (PSOL) , assassinada no Rio na quarta (14)
Mulher chora ao lado de banner com a imagem da vereadora Marielle Franco (PSOL) , assassinada no Rio na quarta (14) - Leo Correa/Associated Press

Hoje não vou escrever sobre economia, pois a democracia corre risco no Brasil. Economia e política estão obviamente ligadas e, com todos os seus defeitos, a democracia ainda é o melhor regime de governo em relação às alternativas, inclusive do ponto de vista econômico. Por isso esta coluna é sobre política e civilidade.

Na quarta-feira (14), Marielle Franco e Anderson Gomes foram assassinados no Rio de Janeiro, com características de execução. Marielle era vereadora pelo PSOL e nos últimos meses vinha denunciando a violência nas favelas do Rio. Anderson era seu motorista e dirigia o carro durante o crime.

Tudo indica que os assassinatos de Marielle e Anderson são mais um episódio de violência crescente contra lideranças de movimentos sociais nos últimos meses. Há apenas quatro dias, Paulo Sérgio Almeida Nascimento, líder da Associação dos Caboclos, Indígenas e Quilombolas da Amazônia, foi assassinado em Barcarena, Pará. O crime ainda está sendo investigado, mas também há suspeita de execução.

Manifesto meu apoio e solidariedade às famílias e aos amigos de Marielle, Anderson e Paulo neste momento difícil.

Sei que a violência é um problema crônico do Brasil, com várias causas históricas, econômicas e políticas. Apesar disso, não é possível ignorar que o clima piorou nos últimos anos, com aumento da polarização ideológica, promoção da intolerância e defesa aberta de repressão e violência por parte de algumas lideranças de extrema direita.

O caso é grave contra movimentos e lideranças sociais de esquerda, que têm sido alvo de ameaças e violência crescentes. O que começou como problema econômico, a Grande Recessão de 2014-16, já virou problema político e social. A espiral de intolerância, radicalização e violência precisa ser interrompida, e todos os que prezam pela democracia devem cobrar isso de nossas autoridades.

Por exemplo, todos os candidatos, pré-candidatos e seja-lá-o-que-for à Presidência da República deveriam se posicionar claramente em defesa da democracia e cobrar a investigação da escalada de assassinatos de líderes sociais nos últimos meses. Quem não fizer isso demonstrará não ter compromisso com a liberdade de opinião e não merecerá voto nas eleições.

Sei que alguns de meus colegas economistas tendem a relevar questões políticas em prol da adoção de reformas econômicas que consideram corretas. Isso é um erro, pois nesse caso os fins não justificam os meios e, mais do que o “rouba mas faz”, o “mata mas reforma” é o caminho do desastre.

Em momentos como o atual, é preciso defender a democracia antes de qualquer coisa. Nesse sentido, lembro uma das lições do livro “Sobre a Tirania”, do professor Timothy Snyder, da Universidade Yale, inspirada em uma frase famosa de John Kennedy: quando liberdades individuais estão sob ameaça, não pergunte o que as instituições podem fazer por você, pergunte o que você pode fazer pelas instituições.

As democracias ocidentais estão em crise devido ao aumento da desigualdade e da polarização política dos últimos anos. Instituições democráticas não sobrevivem sozinhas, sobretudo no mundo atual de proliferação de pós-verdades e intolerância via redes sociais.

Nesse contexto, a defesa de julgamentos isentos, civilidade e liberdade de opinião deve ser ponto comum entre todos os que se dizem progressistas, independentemente do modelo econômico preferido.
 

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