Nelson Barbosa

Professor da FGV e da UnB, ex-ministro da Fazenda e do Planejamento (2015-2016). É doutor em economia pela New School for Social Research.

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Nelson Barbosa

Muito barulho por quase nada

É preciso ser muito papalvo para achar que R$ 30 bi do Pró-Brasil quebrarão o país

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O governo lançou intenção de plano de investimento nesta semana. Falo do plano Pró-Brasil, que tem por objetivo aumentar o investimento e gerar empregos, acelerando a recuperação da economia no pós-crise, seja lá quando isso começar.

Para alguns, a imagem de um general anunciando mais investimento público relembrou o segundo Plano Nacional de Desenvolvimento (PND 2), do governo Geisel. Já outros fizeram paralelo com o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), lançado por Lula em 2007.

Nos dois casos, nossos neoliberais de jardim de infância entraram em pânico e atacaram o chefe da Casa Civil de Bolsonaro, pela suposta incongruência de suas intenções com a estabilidade fiscal. Isso é um exagero por pelo menos três motivos.

Primeiro, no formato atual, o plano Pró-Brasil é uma carta de intenções, inclusive com slides a serem preenchidos. O governo não detalhou várias das ações anunciadas. A iniciativa parece ter sido gestada fora do Ministério de Ideologia Econômica e, por causa disso, sem dados e equipe necessária para fazer uma proposta mais consistente.

Segundo, o valor anunciado de investimento público, de R$ 30 bilhões em três anos, é baixíssimo. Caso a distribuição seja linear, teremos estímulo fiscal de 0,1% do PIB ao ano, por três anos, via investimento com emissão de dívida.

É preciso ser muito papalvo para achar que cifra tão pequena quebrará o país. No formato atual, o Pró-Brasil é uma tentativa de evitar queda maior do investimento do governo.

Terceiro e mais importante, após o pior desta crise, o setor privado estará mais endividado, com elevado desemprego e capacidade ociosa, em um contexto doméstico ainda instável (família Bolsonaro versus impeachment) e situação externa provavelmente incerta (efeitos estruturais da Covid-19 na economia mundial, eleições nos EUA, discordâncias entre europeus e evolução da China pós crise).

É possível, mas altamente improvável, que o setor privado lidere uma rápida recuperação da economia em 2021. Na verdade, é mais provável que ocorra o inverso, caso o governo retome a agenda de forte ajuste fiscal no próximo ano, revertendo as medidas de auxílio financeiro a empresas, família, prefeitos e governadores planejadas para este ano, sem colocar nada no seu lugar.

Nossa história recente indica que consolidação fiscal prematura tende a piorar em vez de melhor a economia. Foi isso que aconteceu em 2011, 2015 e 2017. Sugiro tentar algo diferente agora.

Sim, devemos continuar a agenda de reformas, sobretudo da tributação direta e indireta, bem como da remuneração e da estrutura de carreira de servidores públicos. Porém, essas duas iniciativas não impedem o papel mais ativo do Estado na reconstrução da economia pós Covid-19, via investimento. O programa Pró-Brasil ainda não chegou e talvez nunca chegue a esse estágio.

E, independentemente da opinião de nós, economistas, sobre o Pró-Brasil, parafraseando Churchill, ainda não chegamos ao “fim do começo” da crise atual.

O contágio continua crescendo, a capacidade dos hospitais já se esgotou em várias cidades e a maioria das medidas anunciadas pelo governo (executivo e legislativo) ainda não foi posta em prática.

Há perigo claro e imediato de mais e mais mortes por falta de atendimento médico adequado. Também há risco iminente de quebradeira em massa de famílias e empresas por falta de auxílio financeiro do governo. Nessa situação, é um luxo debater o que o paciente fará quando sair do hospital. Antes disso, precisamos mover o paciente da UTI para o quarto.

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