Nelson Barbosa

Professor da FGV e da UnB, ex-ministro da Fazenda e do Planejamento (2015-2016). É doutor em economia pela New School for Social Research.

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Nelson Barbosa

A reforma revolucionária de Biden

Se proposta tiver sucesso, acabará o festival de planejamento tributário nos EUA

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O governo Biden mais uma vez mostrou o caminho para sair da crise, confirmando o que vários economistas heterodoxos vêm dizendo, há décadas, nos EUA e por aqui. Aos números.

Depois de aprovar um “programa de resgate” de US$ 1,9 trilhão, focado em transferência de renda aos mais pobres e mais recursos para saúde e educação, Biden lançou um “programa de emprego” de US$ 2,3 trilhões nesta semana.

O valor da segunda iniciativa se divide em: US$ 621 bilhões em infraestrutura de transporte (incluindo rede de energia para veículos elétricos), US$ 689 bilhões em habitação e serviços públicos (como saúde, educação e creches), US$ 578 bilhões em inovação e geração de empregos (política industrial e tecnológica) e US$ 400 bilhões para expandir e melhorar o cuidado de idosos e pessoas portadoras de necessidade especiais.

O presidente americano, Joe Biden, em entrevista coletiva, no fim do mês passado - Jim Watson/AFP

Somando os planos de resgate e emprego, o “Pacote Biden” está em US$ 4,2 trilhões. O valor parece alto, mas como o programa de emprego será distribuído em oito anos, seu impacto imediato na economia não é grande. Por esse motivo Biden já recebeu críticas da extrema-esquerda dos EUA, que desejava um valor maior.

Biden foi “comedido” no programa de emprego porque foi ousado no programa de resgate. O US$ 1,9 trilhão já aprovados pelo Congresso terá impacto maior em 2021-22, ajudando os EUA a sair rapidamente da crise.

A ideia do plano de emprego é suceder as ações de resgate, de modo crescente a partir de 2022, gerando sustentação econômica, social e política para um novo ciclo de desenvolvimento dos EUA. Por este motivo, o pacote Biden já seria revolucionário, mas tem mais.

Para pagar o aumento do gasto, Biden também propõe ampla revisão tributária, cobrando mais do “andar de cima”. Rompendo a lógica de desoneração do capital que domina a política econômica desde 1980, Biden quer aumentar a tributação sobre o lucro das empresas e das famílias mais ricas, desfazendo parte da desoneração regressiva adotada por Trump.

Mais importante, o novo governo dos EUA discute que, acima de um valor anual mínimo, toda renda pessoal do capital seja taxada pela mesma alíquota de imposto de renda aplicada à renda do trabalho. E como se isso não fosse suficientemente progressista, Biden também quer alíquota mínima de imposto de renda sobre empresas, tanto sobre lucros domésticos (de 15%) quanto sobre lucros no exterior (de 21%).

Se a proposta tributária de Biden tiver sucesso (tomara que tenha), acabará o festival de planejamento tributário nos EUA, com efeito altamente positivo sobre todo o mundo ocidental.

Há 40 anos, o movimento Thatcher-Reagan gerou grande desoneração do capital, com aumento da desigualdade e volatilidade econômica, culminando na crise financeira de 2008 e estagnação econômica da década seguinte.

Agora, seja por demanda popular, seja por pressão da competição com a China, os EUA finalmente parecem se mover na direção contrária do neoliberalismo, adotando tributação mais progressiva e aumento do investimento público, com “pegada” ambiental e social.

Não sei se Biden terá sucesso. O plano de resgate já foi aprovado pelo Congresso, mas haverá oposição ferrenha de Wall Street e do Vale do Silício às iniciativas tributárias anunciadas nesta semana.

Torço e até rezo para que Biden prevaleça sobre a Faria Lima deles, pois isso melhorará a situação da maioria da população norte-americana e abrirá possibilidade de que outros países sigam o mesmo caminho.

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